TEMPO COMUM. DÉCIMA TERCEIRA SEMANA. SÁBADO

– Dispor a alma para receber o dom divino da graça; os odres novos.
– A contrição restaura‑nos e prepara‑nos para receber novas graças.
– A Confissão sacramental, meio para crescer na vida interior.

I. JESUS ENSINAVA, e os que o escutavam entendiam‑no bem. Todos os que ouviram pela primeira vez as suas palavras narradas no Evangelho da Missa de hoje conheciam os remendos nas roupas, e todos também, acostumados aos trabalhos do campo, sabiam o que acontece quando se lança o vinho novo, extraído da vinha recém‑vindimada, em odres velhos. Com essas imagens simples e bem conhecidas, o Senhor ensinava as verdades mais profundas sobre o Reino que Ele viera trazer às almas: Ninguém coloca remendo novo em pano velho; do contrário, o remendo levará consigo parte do tecido, e o rasgão tornar‑se‑á maior. Também não se lança vinho novo em odres velhos; do contrário, os odres arrebentam e todo o vinho se derrama; o vinho novo lança‑se em odres novos e assim as duas coisas se conservam 1.

Jesus declara a necessidade de acolher a sua doutrina com um espírito novo, jovem, com desejos de renovação; pois da mesma maneira que a força da fermentação do vinho novo faz estalar os recipientes já envelhecidos, assim também a mensagem que Cristo trouxe à terra tem que quebrar o conformismo, a rotina e as estruturas arcaicas. Os Apóstolos lembrar‑se‑iam daqueles dias junto de Jesus como o início da sua nova vida: não tinham recebido a pregação do Senhor como mais uma interpretação da Lei, mas como uma vida nova que neles surgia com um ímpeto extraordinário e que lhes reclamava disposições novas.

Sempre que os homens se encontraram com Jesus ao longo destes vinte séculos, alguma coisa de novo surgiu neles, rompendo atitudes velhas e gastas. Já o profeta Ezequiel havia anunciado 2 que Deus concederia outro coração e um espírito novo aos que o seguissem. São Beda, ao comentar esta passagem do Evangelho, explica 3 como os Apóstolos se transformaram no dia de Pentecostes, ao mesmo tempo que se enchiam do fervor do Espírito Santo. O mesmo aconteceria depois na Igreja com cada um dos seus membros, uma vez recebidos o Batismo e a Confirmação. Estes odres novos – a alma limpa e purificada – devem estar sempre cheios; “pois, quando vazios, a traça e a ferrugem os consomem; mas a graça conserva‑os cheios” 4.

O vinho novo da graça necessita de umas disposições na alma constantemente renovadas, em torno do empenho por começar e recomeçar no caminho da santidade, que é um sinal de juventude interior, dessa juventude própria dos santos, das pessoas enamoradas de Deus.

É um empenho que se traduz na disposição habitual de corresponder às moções e insinuações do Espírito Santo, pois desse modo nos preparamos para receber outras novas; como também na disposição de recorrer ao Senhor, pedindo‑lhe que cure a nossa alma, sempre que não tenhamos sido plenamente fiéis. “Limpa, Senhor Jesus – pedimos‑lhe com Santo Ambrósio –, a podridão dos meus pecados. Enquanto me tens atado pelos laços do amor, cura o que está doente […]. Eu encontrei um médico que vive no céu e derrama o seu remédio sobre a terra. Só Ele pode curar as minhas feridas, pois não tem nenhuma; só Ele pode tirar do coração a sua dor e da alma a sua palidez, pois Ele conhece os segredos mais escondidos” 5.

Só o teu amor, Senhor, pode preparar a minha alma para receber mais amor.

II. O VINHO NOVO, que o Espírito Santo traz constantemente à alma, “não envelhece, mas os odres podem envelhecer. Quando se quebram, são atirados ao lixo e o vinho perde‑se” 6. Por isso é necessário restaurar continuamente a alma, rejuvenescê‑la, pois são muitas as faltas de amor, os pecados veniais talvez, que a impedem de receber mais graças e a envelhecem. Nesta vida, sempre sentiremos as feridas dos pecados: defeitos do caráter que não se vencem de maneira definitiva, chamadas da graça que não sabemos atender com generosidade, impaciências, rotina na vida de piedade, faltas de compreensão…

O que nos prepara para novas graças é a contrição, que aumenta a esperança, evita a rotina e faz com que o cristão se esqueça de si mesmo e se aproxime novamente de Deus com um ato de amor mais profundo.

A contrição caracteriza‑se pela aversão ao pecado e pela conversão a Cristo. Não se identifica, portanto, com o estado em que uma alma pode encontrar‑se por causa dos efeitos desagradáveis do seu erro (a quebra da paz familiar, a perda de uma amizade…); nem mesmo consiste no desejo de não se ter feito o que se fez…: é a condenação decidida de uma ação, a conversão para o bom, para a santidade de Deus manifestada em Cristo; é a “irrupção de uma vida nova na alma” 7, cheia de amor ao encontrar‑se novamente com o Senhor. Por isso, não sabe arrepender‑se, não se sente movido à contrição quem não relaciona os seus pecados, tanto os grandes como as pequenas faltas, com o Senhor.

Diante de Jesus, todas as ações adquirem a sua verdadeira dimensão. Se ficássemos a sós com as nossas culpas, sem essa referência à Pessoa ofendida, provavelmente justificaríamos e tiraríamos importância às nossas faltas e pecados, ou então nos encheríamos de desalento e desesperança diante de tanto erro ou omissão. O Senhor ensina‑nos a conhecer a verdade sobre a nossa vida e, apesar de tantos defeitos e misérias, cumula‑nos de paz e de desejos de ser melhores, de recomeçar novamente.

A alma humilde sente a necessidade de pedir perdão a Deus muitas vezes ao dia. Cada vez que se afasta do que o Senhor esperava dela, compreende a necessidade de regressar como o filho pródigo, com verdadeira dor: Pai, pequei contra o céu e contra ti; já não sou digno de ser chamado teu filho: trata‑me como a um dos teus jornaleiros 8. E o Senhor, “que está perto dos que têm um coração contrito” 9, escutará a nossa oração. Com essa contrição, a alma prepara‑se continuamente para receber o vinho novo da graça.

III. O SENHOR, sabendo que somos frágeis, deixou‑nos o sacramento da Penitência, em que a alma não só sai restabelecida, mas também surge com uma nova vida, se porventura tinha perdido a graça. Devemos recorrer a este sacramento com uma sinceridade plena, humilde, contrita, com desejos de reparar.

Uma confissão bem feita implica um exame profundo (profundo não quer dizer necessariamente longo, sobretudo se nos confessamos com freqüência): se for possível, diante do Sacrário, e sempre na presença de Deus. É nesse exame de consciência que o cristão vê o que Deus esperava da sua vida e o que realmente ela foi; a bondade ou malícia das suas ações, as omissões, as ocasiões perdidas…, a intensidade das faltas cometidas, o tempo em que permaneceu nelas antes de pedir perdão 10.

Quem deseje ter uma consciência delicada procurará antes de mais nada confessar‑se com freqüência, e depois “não se contentará com uma confissão simplesmente válida, mas aspirará a fazer uma confissão boa, que ajude eficazmente a alma a elevar‑se até Deus.

“Para que a confissão freqüente consiga esse fim, é necessário seguir com toda a seriedade este princípio: sem arrependimento, não há perdão dos pecados. Daqui nasce esta norma fundamental para quem se confessa com freqüência: não confessar nenhum pecado venial de que não se esteja séria e sinceramente arrependido.

“Há um arrependimento geral. É a dor e a detestação dos pecados cometidos em toda a vida passada. Esse arrependimento geral é de uma importância excepcional para a confissão freqüente” 11, pois ajuda‑nos a cicatrizar as feridas deixadas pelas fraquezas, purifica‑nos a alma e faz‑nos crescer no amor ao Senhor.

A sinceridade há de levar‑nos, sempre que seja necessário, a descer a esses pequenos detalhes que dão a conhecer melhor a nossa fraqueza: como?, quando?, por que motivo? por quanto tempo?; evitando tanto o detalhe insubstancial e prolixo como a generalização. É preciso dizer com simplicidade e delicadeza o que aconteceu, dar a conhecer o verdadeiro estado da alma, fugindo das divagações do tipo “não fui humilde”, “fui preguiçoso”, “faltei à caridade”…, coisas que, por outro lado, são quase sempre aplicáveis a qualquer mortal. Numa palavra, devemos cuidar de que a nossa confissão freqüente seja um ato pessoal, em que pedimos perdão ao Senhor das nossas fraquezas concretas e reais, não de generalidades difusas.

Este sacramento da misericórdia é refúgio seguro: aqui se curam as feridas, se revitaliza o que estava gasto e envelhecido, e se remedeiam todos os extravios, grandes ou pequenos. Porque a confissão não é somente um juízo em que as ofensas são perdoadas, mas também remédio para a alma.

A confissão impessoal esconde, com freqüência, um ponto de soberba e de amor próprio que trata de mascarar ou justificar aquilo que humilha e deixa humanamente em má situação. Para tornarmos mais pessoal este ato de penitência, devemos cuidar até do modo de nos confessarmos: “Acuso‑me de…”, pois este sacramento não é o relato de umas coisas acontecidas, mas uma auto‑acusação humilde e simples dos nossos erros e fraquezas diante do próprio Deus, que nos perdoará através do sacerdote e nos inundará com a sua graça.

“Deus seja louvado!, dizias de ti para ti depois de terminares a tua Confissão sacramental. E pensavas: é como se tivesse voltado a nascer.

“Depois, prosseguiste com serenidade: «Domine, quid me vis facere?» – Senhor, que queres que eu faça?

“– E tu mesmo te deste a resposta: – Com a tua graça, por cima de tudo e de todos, cumprirei a tua Santíssima Vontade: «Serviam!» – eu te servirei sem condições!” 12

(1) Mt 9, 16‑17; (2) Ez 36, 26; (3) São Beda, Comentário ao Evangelho de São Marcos, 2, 21‑22; (4) Santo Ambrósio, Tratado sobre o Evangelho de São Lucas, 5, 26; (5) ib., 5, 27; (6) G. Chevrot, El Evangelio al aire livre, Herder, Barcelona, 1961, pág. 111; (7) cfr. M. Schmaus, Teologia Dogmática, 2ª ed., Rialp, Madrid, 1963, vol. VI, pág. 562; (8) Lc 15, 18‑19; (9) Santo Agostinho, Comentário ao Evangelho de São João, 15, 25; (10) cfr. São Francisco de Sales, Introdução à vida devota, II, 19; (11) B. Baur, La confesión frecuente, Herder, Barcelona, 1957, págs. 37‑38; (12) Josemaría Escrivá, Forja, n. 238.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal