– O primeiro encontro com Jesus.
– Apostolado da amizade.
– A chamada definitiva. Desprendimento e prontidão no seguimento do Senhor.
O Apóstolo Santo André era natural de Betsaida, irmão de Simão e pescador como ele. Foi discípulo de São João Batista e depois um dos primeiros a conhecer Jesus; foi ele que levou Pedro ao encontro do Mestre e que, na multiplicação dos pães, disse ao Senhor que havia um rapaz com uns pães e uns peixes. Conforme a Tradição, pregou o Evangelho na Grécia e morreu na Acaia, numa cruz em forma de xis.
I. FORAM E VIRAM onde habitava, e ficaram com Ele naquele dia. Era cerca da hora décima1. André e João foram os primeiros Apóstolos chamados por Jesus, conforme nos relata o Evangelho. O Mestre iniciou o seu ministério público e já no dia seguinte começou a chamar aqueles que permaneceriam ao seu lado. São João Batista encontrava-se em companhia dos seus discípulos quando, vendo Jesus que ia passando, disse: Eis o Cordeiro de Deus2. E os dois discípulos foram atrás do Senhor. Jesus voltou-se e, vendo que o seguiam, disse-lhes: Que buscais? Eles disseram: Rabi (que quer dizer Mestre), onde moras? Jesus disse-lhes: Vinde e vede. Na realidade, era um amável convite para que o acompanhassem.
Durante aquele dia, Jesus falou-lhes certamente de mil coisas cheias de sabedoria divina e encanto humano; e os dois ficaram para sempre unidos à sua Pessoa. André, irmão de Simão Pedro, era um dos dois que tinham ouvido o que João dissera e tinham seguido Jesus. O Apóstolo São João, passados muitos anos, pôde anotar no seu Evangelho a hora do encontro: Era então cerca da hora décima, das quatro da tarde. Nunca esqueceu aquele momento em que Jesus lhes disse: Que buscais? André também se lembraria sempre daquele encontro definitivo.
Nunca se esquece o encontro decisivo com Jesus. Aceitar a chamada do Senhor, passar a pertencer ao círculo dos mais íntimos, é a maior graça que se pode receber neste mundo.
Constitui esse dia feliz, inesquecível, em que somos invadidos pelo convite claro do Mestre – um dom imerecido, valiosíssimo, porque vem de Deus –, que dá sentido à vida e ilumina o futuro.
Há chamadas de Deus que são um convite doce e silencioso; outras, como a de São Paulo, fulminantes como um raio que rasga as trevas; e outras, enfim, em que o Mestre simplesmente nos põe a mão sobre o ombro e diz: Tu és meu! Segue-me! Então o homem, cheio de alegria, vai, vende tudo quanto tem e compra aquele campo3, pois nele está o seu tesouro. Descobriu, entre os muitos dons da vida – como um especialista que procura pérolas finas4 – a pérola de maior valor5.
Vinde e vede. Foi no relacionamento pessoal com o Senhor que André e João conheceram por experiência direta aquilo que as meras palavras não lhes teriam permitido entender por completo6. É na oração pessoal, na intimidade com Cristo, que chegamos a conhecer os múltiplos convites e apelos do Senhor para que o sigamos mais de perto. Agora, enquanto falamos com Ele, podemos perguntar-nos se temos o ouvido atento à sua voz inconfundível, se estamos respondendo plenamente àquilo que Ele nos pede, porque Cristo passa ao nosso lado e nos chama. Ele continua presente no mundo, tão real como há vinte séculos, e procura colaboradores que o ajudem a salvar almas. Vale a pena dizer “sim” a essa missão divina.
II. DISSE ANDRÉ a seu irmão Simão: Encontramos o Messias! (que significa Cristo). E levou-o a Jesus7.
O encontro com Jesus deixou André com a alma cheia de felicidade e de alegria; uma alegria nova que tinha de comunicar a alguém imediatamente, como se não a conseguisse reter. A primeira pessoa que procurou foi seu irmão Simão, e deve ter-lhe falado da sua descoberta com muito entusiasmo: Encontramos o Messias!, disse-lhe com essa ênfase especial de quem está convencido, pois conseguiu que Pedro, talvez cansado depois de uma jornada de trabalho, fosse até o Mestre, que já o esperava: E levou-o a Jesus.
Esta é a nossa tarefa: levar a Cristo os nossos parentes, amigos e conhecidos, falando-lhes com essa convicção pessoal que arrasta.
Esse anúncio é próprio da alma “que se enche de felicidade com a sua aparição e que se apressa a anunciar aos outros algo tão grande. Essa é a prova do verdadeiro e sincero amor fraternal: o intercâmbio de bens espirituais”8. Verdadeiramente, quem encontra Cristo, encontra-o para todos.
Nós vimos tratando intimamente com Cristo, que um dia – talvez há não poucos anos! – passou perto da nossa vida: “Como André, também nós, pela graça de Deus, descobrimos o Messias e o significado da esperança que devemos transmitir a todos”9. O Senhor serve-se com freqüência dos laços do sangue, da amizade…, para chamar outras almas. Esses vínculos podem abrir a porta do coração dos nossos parentes e amigos, talvez fechados para Cristo devido aos preconceitos, à ignorância, ao medo ou à preguiça. Quando a amizade é verdadeira, não são necessários grandes esforços para falar de Cristo: a confidência surgirá naturalmente. Entre amigos, é fácil trocar pontos de vista, comunicar descobertas… Seria tão pouco natural que não falássemos de Cristo, sendo Ele a descoberta mais importante que fizemos na vida e o motor de todas as nossas ações!
A amizade, com a graça de Deus, pode ser o caminho – natural e divino ao mesmo tempo – para um apostolado profundo, capilar, feito um a um. As palavras cheias de esperança e de alegria farão com que muitos venham a descobrir que Cristo está perto, como o descobriu Pedro, como talvez nós mesmos o tenhamos descoberto. “Um dia – não quero generalizar; abre o teu coração ao Senhor e conta-lhe a tua história –, talvez um amigo, um simples cristão igual a ti, te fez descobrir um panorama profundo e novo, e, ao mesmo tempo, antigo como o Evangelho. Sugeriu-te a possibilidade de te empenhares seriamente em seguir a Cristo, em ser apóstolo de apóstolos. Talvez tenhas perdido então a tranqüilidade e não a tenhas recuperado, convertida em paz, enquanto livremente, porque te apeteceu – que é a razão mais sobrenatural –, não respondeste sim a Deus. E veio a alegria, forte, constante, que só desaparece quando te afastas dEle”10 – essa alegria que só encontramos quando seguimos os passos do Mestre, e da qual desejamos que muitos participem.
III. ALGUM TEMPO mais tarde, caminhando Jesus ao longo do mar da Galiléia, viu dois irmãos, Simão, chamado Pedro, e André, seu irmão, que lançavam a rede ao mar (porque eram pescadores), e disse-lhes: Segui-me, e eu vos farei pescadores de homens. E eles, imediatamente, deixaram as redes e seguiram-no11.
É a chamada definitiva, culminância daquele primeiro encontro com o Mestre. André, como os outros Apóstolos, respondeu imediatamente. São Gregório Magno, ao comentar essa chamada definitiva de Jesus àqueles pescadores e a forma como lhe corresponderam, desfazendo-se de tudo o que possuíam, ensina que o reino dos céus “vale tudo quanto tens”12. Diante de Jesus que passa, não podemos ficar com nada. Pedro e André deixaram muito, “já que ambos deixaram o desejo de possuir”13. O Senhor necessita de corações limpos e desprendidos. E cada cristão deve viver esse espírito de entrega, de acordo com a sua vocação. Não pode haver nada na nossa vida que não seja de Deus. Que havemos de reservar para nós, quando o Mestre está tão perto, quando o vemos e convivemos com Ele todos os dias?
Este desprendimento permitir-nos-á acompanhar Jesus que prossegue o seu caminho com passo rápido; não seria possível acompanhá-lo com demasiados fardos. O passo de Deus pode ser ligeiro, e seria triste que ficássemos para trás por causa de quatro bugigangas que não valem a pena.
Ele passa sempre perto de nós e chama-nos: umas vezes, na juventude, outras na maturidade ou mesmo quando falta pouco para partirmos desta vida, como podemos observar na parábola dos trabalhadores que foram contratados a diversas horas do dia para trabalhar na vinha14. Em qualquer caso, é necessário responder a essa chamada com a alegria estremecida de que os Evangelistas nos dão notícia ao recordarem a chamada que receberam. É o mesmo Jesus quem passa agora e quem nos convida a segui-lo.
Conta a tradição que Santo André morreu louvando a cruz, pois ela o levava definitivamente para junto do seu Mestre. “Ó cruz boa, que foste glorificada pelos membros do Senhor, cruz por tão longo tempo desejada, ardentemente amada, procurada sem descanso e oferecida aos meus ardentes desejos […], devolve-me ao meu Mestre, para que por ti me receba Aquele que por ti me redimiu”15. Se virmos Jesus por trás dela, nada nos importarão os maiores sacrifícios.
(1) Jo 1, 39; (2) Jo 1, 37; (3) Mt 13, 44; (4) Mt 13, 45; (5) J. L. R. Sanchez de Alva, El evangelio de San Juan, 3ª ed., Madrid, 1987, nota a Jo 1, 35-51; (6) São Tomás, Comentário ao Evangelho de São João; (7) Jo 1, 41-42; Antífona da comunhão da Missa do dia 30 de novembro; (8) Liturgia das Horas, Segunda Leitura; São João Crisóstomo, Homilias sobre o Evangelho de São João, 19, 1; (9) João Paulo II, Homilia, 30-XI-1982; (10) Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 1; (11) Mt 4, 18-20; (12) São Gregório Magno, Homilias sobre os Evangelhos, I, 5, 2; (13) ib.; (14) cfr. Mt 20, 1 e segs.; (15) Paixão de Santo André.
Fonte: Livro “Falar com Deus”de Francisco Fernández Carvajal