TEMPO COMUM. DÉCIMO OITAVO DOMINGO. CICLO B

– O maná, símbolo e figura da Sagrada Eucaristia, verdadeiro alimento da alma.

I. DIZ O SENHOR: Eu sou o pão da vida; o que vem a mim não terá jamais fome; e o que crê em mim não terá jamais sede1.

Depois do milagre da multiplicação dos pães e dos peixes, a multidão, entusiasmada, procurou novamente Jesus. Quando viram que não o conseguiam encontrar, nem a Ele nem aos seus discípulos, subiram às barcas e foram a Cafarnaum. E seria ali, na sinagoga – indica‑nos São João no Evangelho da Missa2 –, que teria lugar a revelação da Sagrada Eucaristia.

Com o milagre da multiplicação dos pães no dia anterior, Jesus tinha despertado no povo umas esperanças profundamente vivas. Milhares de pessoas saíram de suas casas para vê‑lo e ouvi‑lo, e o entusiasmo que se apossara delas levou‑as a querer proclamá‑lo rei. Mas o Senhor afastou‑se da multidão.

Quando o encontraram novamente, Jesus disse‑lhes: Em verdade, em verdade vos digo: Vós me buscais, não por terdes visto os milagres, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados. “Buscais‑me – comenta Santo Agostinho – por motivos da carne, não do espírito. Quantos há que procuram Jesus, guiados unicamente pelos seus interesses materiais! […]. Só se pode procurar Jesus por Jesus”3.

Com uma valentia admirável, com um amor sem limites, Jesus expõe o dom inefável da Sagrada Eucaristia, em que se dá como alimento. Pouco importa que, ao terminar a revelação, muitos dos que o seguiram com fervor acabem por abandoná‑lo. O Senhor não recua: Trabalhai não pela comida que perece, mas pela que dura até a vida eterna e que o Filho do homem vos dará… Mas eles disseram‑lhe: Que devemos nós fazer para praticar as obras de Deus? Jesus respondeu‑lhes: A obra de Deus é esta: que acrediteis naquele que Ele enviou.

E, apesar de que muitos dos presentes tinham visto com os seus próprios olhos o prodígio do dia anterior, disseram‑lhe: Que milagre fazes tu, pois, para que o vejamos e acreditemos em ti? Os nossos pais comeram o maná no deserto, segundo está escrito: Deu‑lhes a comer o pão do céu.

A primeira Leitura da Missa4 relata como, efetivamente, Deus manifestara a sua Providência em relação àqueles israelitas no deserto, fazendo cair diariamente do céu o maná que os alimentava. Esse pão era símbolo da Sagrada Eucaristia, que o Senhor anunciava agora pela primeira vez naquela pequena cidade junto do lago de Genesaré.

Jesus Cristo é o verdadeiro alimento que nos transforma e nos dá forças para realizarmos a nossa vocação cristã. “Só mediante a Eucaristia é possível viver as virtudes heróicas do cristianismo: a caridade até o perdão dos inimigos, até o amor pelos que nos fazem sofrer, até a doação da própria vida pelo próximo; a castidade em qualquer idade e situação da vida; a paciência, especialmente na dor e quando estranhamos o silêncio de Deus nos dramas da história ou da nossa existência. Por isso – exorta vivamente o Papa João Paulo II –, sede sempre almas eucarísticas para poderdes ser cristãos autênticos”5.

Com palavras do poeta italiano, pedimos ao Senhor: “Dai-nos hoje o maná de cada dia, / sem o qual por este áspero caminho / retrocede quem mais em caminhar se afana”6. Verdadeiramente, a vida sem Cristo converte‑se num áspero deserto, em que se está cada vez mais longe da meta.

– O pão da vida.

II. QUANDO OS JUDEUS dizem a Jesus que Moisés lhes deu o pão do céu, Jesus responde‑lhes que não foi Moisés, mas seu Pai Celestial. E é Ele quem lhes dá o verdadeiro pão do céu. Pois o pão de Deus é o que desceu do céu e dá a vida ao mundo.

“O Senhor apresenta‑se de tal forma, que parece superior a Moisés; jamais Moisés teve a audácia de dizer que dava um alimento que não perece, que permanece até a vida eterna. Jesus promete muito mais do que Moisés. Este prometia um reino, uma terra com rios de leite e mel, uma paz temporal, numerosos filhos, saúde corporal e todos os demais bens temporais […]; prometia saciá‑los aqui na terra, mas de manjares que perecem. Cristo, no entanto, promete um manjar que, efetivamente, não perece, mas permanece eternamente”7.

Os que estavam presentes naquela manhã na sinagoga de Cafarnaum sabiam que o maná – o alimento que os judeus recolhiam diariamente no deserto – era um símbolo dos bens messiânicos, e por isso pedem ao Senhor que realize um portento semelhante. Mas não podiam sequer imaginar que o maná era figura do grande dom messiânico da Sagrada Eucaristia8.

Jesus diz‑lhes que aquele maná não era o pão do céu, porque os que o haviam comido tinham acabado por morrer, e que seu Pai era quem lhes podia dar esse outro pão totalmente excepcional e maravilhoso. Eles disseram‑lhe: Senhor, dá‑nos sempre desse pão. E Jesus respondeu‑lhes: Eu sou o pão da vida; quem vem a mim não terá jamais fome, e quem crê em mim não terá jamais sede.

O Senhor terá o maior cuidado em deixar bem claro que esse pão é uma realidade. Repete a seguir por oito vezes a palavra comer, para que nunca haja a menor dúvida. Ele é realmente o nosso alimento: O pão que eu darei é a minha carne. E, portanto, por meio da Sagrada Eucaristia, fazemo‑nos “concorpóreos e consanguíneos seus”9. A Eucaristia é a suprema realização daquelas palavras da Escritura: As minhas delícias são estar com os filhos dos homens10.

“O maior louco que já houve e haverá é Ele. É possível maior loucura do que entregar‑se como Ele se entrega, e àqueles a quem se entrega?

“Porque, na verdade, já teria sido loucura ficar como um Menino indefeso; mas, nesse caso, até mesmo muitos malvados se enterneceriam, sem atrever‑se a maltratá‑lo. Achou que era pouco: quis aniquilar‑se mais e dar‑se mais. E fez‑se comida, fez‑se Pão.

“– Divino Louco! Como é que te tratam os homens?… E eu mesmo?”11 Examinemo‑nos, pensando na próxima Comunhão que faremos. Não pode ser como as anteriores: deve estar mais cheia de amor.

– O próprio Cristo se nos dá em cada Comunhão. A sua presença na alma.

III. QUANDO COMUNGAMOS, o próprio Cristo, todo inteiro – com o seu Corpo, o seu Sangue, a sua Alma e a sua Divindade –, se dá a cada um de nós numa união inefavelmente íntima que nos configura com Ele de um modo real: a nossa vida transforma‑se na sua, assimila‑se à sua. Cristo, na Comunhão, não somente se acha conosco, mas em nós.

Ele não está em nós como um amigo está no seu amigo: mediante uma presença espiritual ativada por uma recordação mais ou menos constante. Depois da Comunhão, está verdadeira, real e substancialmente presente na nossa alma. “Eu sou o pão dos fortes – disse o Senhor a Santo Agostinho, e podemos aplicar agora essas palavras à Eucaristia –; crê e então me comerás. Mas não me transformarás na tua própria substância, como acontece ao manjar que alimenta o teu corpo, mas, ao contrário, tu te transformarás em Mim”12.

Cristo dá‑nos a sua vida, diviniza‑nos! Derrama sobre a nossa alma necessitada os infinitos méritos da sua Paixão, envia‑nos novas forças e auxílios, e introduz‑nos no seu coração amantíssimo, para nos transformar segundo os seus sentimentos. A alma é elevada ao plano sobrenatural; as virtudes de Jesus vivificam a alma, e esta fica incorporada a Ele, como membro do seu Corpo Místico. Então podemos dizer de modo pleno: Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim13.

Cumprem‑se também em cada Comunhão aquelas palavras do Senhor na Última Ceia: Se alguém me ama – e recebê‑lo com piedade e devoção é o maior sinal de amor –, guardará os meus mandamentos, e meu Pai o amará, e viremos a ele e nele faremos a nossa morada14. A alma converte‑se em templo e sacrário da Santíssima Trindade. E a vida íntima das três divinas Pessoas impregna e transforma o homem, sustentando, fortalecendo e desenvolvendo nele o germe divino recebido no Batismo.

Da Eucaristia brotam todas as graças e todos os frutos de vida eterna – para cada alma e para a humanidade – porque neste sacramento “está contido todo o bem espiritual da Igreja”15.

Quando nos aproximamos da mesa da Comunhão, podemos dizer: “Senhor, espero em Ti; adoro‑te, amo‑te, aumenta‑me a fé. Sê o apoio da minha debilidade, Tu, que ficaste na Eucaristia, inerme, para remediar a fraqueza das criaturas”16.

E recorremos a Santa Maria, pois Ela, que durante trinta e três anos pôde gozar da presença visível do seu Filho e o tratou com o maior respeito e amor possíveis, nos dará os seus mesmos sentimentos de adoração e de amor.

(1) Jo 6, 35; Antífona da Comunhão da Missa do décimo oitavo domingo do TC, ciclo B; (2) Jo 6, 24‑35; (3) Santo Agostinho, Comentário ao Evangelho de São João, 25, 10; (4) Ex 16, 2‑4; 12‑15; (5) João Paulo II, Homilia, 19‑VIII‑1979; (6) Dante Alighieri, A Divina Comédia. Purgatório, XI, 13‑15; (7) Santo Agostinho, Comentário ao Evangelho de São João, 25, 12; (8) cfr. Sagrada Bíblia, Santos Evangelhos; (9) São Cirilo de Jerusalém, Catequese, 22, 1; (10) Prov 8, 31; (11) Josemaría Escrivá, Forja, n. 824; (12) Santo Agostinho, Confissões, 7, 10, 16; 7, 18, 24; (13) Gal 2, 20; (14) Jo 14, 23; (15) Conc. Vat. II, Decr. Presbyterorum ordinis, 5; (16) Josemaría Escrivá, op. cit., n. 832.

Fonte: livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal.