TEMPO COMUM. DÉCIMO NONO DOMINGO. ANO A

– Ele nunca abandona os seus amigos.
– Cristo é apoio firme a que devemos agarrar‑nos.
– Confiança em Deus. Ele nunca chega tarde em nosso auxílio, se procuramos a sua ajuda com fé e empregamos em cada caso os meios oportunos.

I. A PRIMEIRA LEITURA da Missa1 relata‑nos o episódio em que o profeta Elias, cansado e afligido por muitas tribulações, se refugiou numa gruta do Horeb, o monte santo, onde outrora Deus se manifestara a Moisés. Ali recebeu esta indicação: Sai e espera o Senhor. Naquele momento, desencadeou‑se um furacão que gretou os montes e fendeu as rochas, e depois eclodiu um terremoto e alastrou‑se o fogo. Mas Deus não estava nem no vento, nem no terremoto, nem no fogo. Soprou a seguir um vento suave, como um sussurro, e o Senhor manifestou‑se dessa forma, dando a conhecer assim o seu misterioso modo de ser e a sua delicada bondade para com o homem fraco. Elias sentiu‑se reconfortado para a nova missão que o Senhor queria que realizasse.

O Evangelho2 relata‑nos uma tempestade que apanhou os Apóstolos no lago de Genesaré, numa ocasião em que Jesus não estava com eles na barca. Foi depois da multiplicação dos pães e dos peixes. Como nos lembramos, o Senhor mandara que os Apóstolos embarcassem e se dirigissem à outra margem do lago, enquanto Ele despedia a multidão. Depois, retirara‑se ao alto de um monte para orar, mas entretanto levantou‑se um vento forte e contrário que ameaçava a barca. Terminada a sua oração, o Senhor, que vira tudo do lugar em que se encontrava, dispôs‑se a ir em ajuda dos Apóstolos.

Na quarta vigília da noite, aproximou‑se da barca, andando sobre as ondas, e os discípulos amedrontaram‑se pensando que fosse um fantasma. Todos começaram a gritar. Então Jesus aproximou‑se um pouco mais e disse‑lhes: Tende confiança, sou eu, não temais. Eram palavras consoladoras, que nós também ouvimos muitas vezes sob formas diferentes, na intimidade do coração, quando nos víamos rodeados de acontecimentos que nos desconcertavam ou nos encontrávamos em situações difíceis.

Se a nossa vida se passar no cumprimento fiel do que Deus quer de nós – como Elias, que se retirou para o monte Horeb por indicação de Deus, ou como os Apóstolos, que embarcaram porque Jesus lhes mandou que o fizessem –, nunca nos faltará a ajuda divina. Na fraqueza, na fadiga, nas situações de maior dificuldade, Jesus aproximar‑se‑á de nós de modo inesperado e nos dirá: Sou Eu, não temais. Ele nunca abandona os seus amigos3, e muito menos quando o vento das tentações, do cansaço ou das dificuldades nos é contrário. “Se tiverdes confiança nEle e ânimos animosos, que Sua Majestade é muito amigo disso, não tenhais medo de que vos falte coisa alguma”4. O que poderá faltar‑nos se somos os seus amigos no mundo, se queremos segui‑lo dia após dia no meio de tantos que lhe viram as costas?

II. QUANDO OS APÓSTOLOS ouviram Jesus, ficaram cheios de paz. Então, Pedro dirigiu a Jesus um pedido cheio de audácia e de coragem: Senhor, se és tu, manda‑me ir até onde estás por sobre as águas. E o Mestre, que se encontrava ainda a uns metros da barca, respondeu‑lhe: Vem. Pedro teve muita fé, e trocou a segurança relativa da barca pela confiança absoluta nas palavras do Senhor: E descendo da barca, caminhava sobre as águas para ir ter com Jesus. Foram uns momentos impressionantes de firmeza e de amor.

Mas Pedro deixou de olhar para Jesus e, ao ver que o vento continuava a soprar com violência, encheu‑se de medo. Esqueceu que a força que o sustentava sobre as águas não dependia das circunstâncias, mas da vontade do Senhor, que domina o céu e a terra, a vida e a morte, a natureza, os ventos e o mar… E começou a afundar, não por causa das ondas, mas por falta de confiança nAquele que tudo pode. E gritou: Senhor, salva‑me! Imediatamente Jesus estendeu‑lhe a mão e, segurando‑o, disse‑lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste?

Por vezes, o cristão deixa de olhar para Jesus e fixa os olhos em coisas que o põem em perigo de “perder o pé” na sua vida de relação com Deus e de afundar‑se, se não reage com rapidez. Quando alguém começa a não enxergar os valores da fé ou a vocação recebida de Deus, “deve examinar‑se com lealdade. Não tardará a descobrir que a sua vida cristã vem sofrendo há algum tempo um relaxamento, que a sua oração tem sido menos freqüente e menos atenta, que tem sido menos severo consigo mesmo. Não terá reincidido porventura nalgum pecado cuja gravidade pretende conscientemente dissimular? Certamente não reprime com a mesma energia as suas paixões ou até cede complacentemente a algumas. Um ressentimento permanente contra outra pessoa, um assunto econômico em que a sua honestidade não é completa, uma amizade excessivamente absorvente, ou simplesmente o despertar dos instintos que não são dominados com rapidez… Um só destes fatores é suficiente para que surjam nuvens entre Deus e nós. Então a fé se obscurece”5. Corre‑se nessa altura o perigo de atribuir essa situação às circunstâncias externas, quando o mal está no nosso coração.

Para voltar à superfície, Pedro teve que segurar a mão forte do Senhor, seu Amigo e seu Deus. Não era muito, mas era o esforço que Deus lhe pedia; é a colaboração da boa vontade que o Senhor sempre nos pede. “Quando Deus Nosso Senhor concede a sua graça aos homens, quando os chama com uma vocação específica, é como se lhes estendesse a mão, uma mão paternal, cheia de fortaleza, repleta sobretudo de amor, porque nos busca um por um, como a suas filhas e filhos, e porque conhece a nossa debilidade. O Senhor espera que façamos o esforço de agarrar a sua mão, essa mão que nos estende. Deus pede‑nos um esforço, que será prova da nossa liberdade”6.

Esse pequeno esforço que o Senhor pede aos seus discípulos de todos os tempos para tirá‑los de uma má situação pode ser muito diverso: intensificar a oração; cortar decididamente com uma ocasião próxima de pecar; obedecer com prontidão e docilidade de coração aos conselhos recebidos na confissão e na conversa com o diretor espiritual… Não nos esqueçamos nunca da advertência de São João Crisóstomo: “Quando falta a nossa cooperação, cessa também a ajuda divina”7. Ainda que seja o Senhor quem nos tira da água.

III. PEDRO RECUPEROU novamente a fé e a confiança em Jesus. Com Ele subiu à barca. E nesse instante o vento cessou, voltou a calma ao mar e ao coração dos discípulos, e reconheceram‑no como o seu Senhor e o seu Deus: E os que estavam na barca aproximaram‑se dEle e o adoraram dizendo: Verdadeiramente, tu és o Filho de Deus.

As dificuldades através das quais experimentamos a nossa fraqueza devem servir‑nos para encontrar Jesus que nos estende a sua mão e penetra no nosso coração, dando‑nos uma paz imensa no meio de qualquer transe. Temos de aprender a nunca desconfiar de Deus, que não se apresenta apenas nos acontecimentos favoráveis, mas também nas tormentas dos sofrimentos físicos e morais da vida: Tende confiança, sou eu, não temais. Deus nunca chega tarde em nosso auxílio, e sempre nos ajuda nas nossas necessidades. Ele sempre chega no momento oportuno, ainda que por vezes de modo misterioso e oculto. Talvez faça menção de passar ao largo, mas é para que o chamemos. Não tardará a aproximar‑se de nós.

E se alguma vez sentimos que nos falta apoio, que submergimos, repitamos aquela súplica de Pedro: Senhor, salva‑me! Não duvidemos do seu Amor, nem da sua mão misericordiosa, não esqueçamos que “Deus não manda impossíveis, mas ao mandar pede que faças o que possas e peças o que não possas, e ajuda para que possas”8.

Que enorme segurança nos dá o Senhor! “Ele garantiu‑me a sua proteção; não é nas minhas forças que eu me apóio. Tenho nas minhas mãos a sua palavra escrita. Este é o meu báculo. Esta é a minha segurança, este é o meu porto tranqüilo. Ainda que o mundo inteiro se perturbe, eu leio esta palavra escrita que trago comigo, porque ela é o meu muro e a minha defesa. O que é que ela me diz? Eu estarei convosco até o fim do mundo.

Junto de Cristo, ganham‑se todas as batalhas, desde que tenhamos uma confiança sem limites na sua ajuda: “Cristo está comigo, que posso temer? Que venham assaltar‑me as ondas do mar e a ira dos poderosos; tudo isso não pesa mais do que uma teia de aranha”9. Não larguemos a sua mão; Ele não larga a nossa.

“Reza com toda a segurança com o Salmista: «Senhor, Tu és o meu refúgio e a minha fortaleza, confio em Ti!»

“Eu te garanto que Ele te preservará das insídias do «demônio meridiano» – nas tentações e… nas quedas! –, quando a idade e as virtudes teriam que ser maduras, quando deverias saber de cor que somente Ele é a Fortaleza”10.

Terminamos a nossa oração invocando como intercessora a Santíssima Virgem; Ela ajuda‑nos a clamar confiadamente com as preces litúrgicas: Renova, Senhor, as maravilhas do teu amor11; faz que vivamos firmemente ancorados em Ti.

(1) 1 Rs 19, 9; 11‑13; (2) Mt 14, 22‑33; (3) cfr. Santa Teresa, Vida, 11, 4; (4) idem, Fundações, 27, 12; (5) G. Chevrot, Simão Pedro, Quadrante, São Paulo, pág. 38; (6) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 17; (7) São João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 50, 2; (8) Santo Agostinho, Sobre a natureza e a graça, 43; (9) São João Crisóstomo, Homilia antes de partir para o desterro; (10) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 307; (11) Liturgia das horas, Domingo da IIIª semana. Prece das Vésperas.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal