Em Todas as Horas

TEMPO COMUM. VIGÉSIMA SEMANA. QUARTA-FEIRA

– Todos recebem uma chamada do Senhor para tra­balhar na sua vinha, para corredimir com Ele o mundo.
– Qualquer hora e circunstância é boa para o aposto-lado. O exemplo dos primeiros cristãos.
– Todos os que tenham passado perto de nós deve­riam poder dizer que se sentiram movidos a viver mais perto de Cristo.

I. NO EVANGELHO DA MISSA1, o Senhor compara-se a um pai de família que sai a diferentes horas do dia para contra­tar operários para trabalharem na sua vinha: ao amanhecer, à hora terça, sexta, nona... Com os primeiros - os que foram contratados em primeiro lugar - combinou o salário de um denário. Os outros foram contratados pelo preço justo. Quando já estava próximo o final da jornada, à hora undécima, o pai de família saiu novamente e encontrou outros que estavam sem trabalhar e disse-lhes: Por que estais aqui todo o dia ociosos? E eles responderam-lhe: Porque ninguém nos contratou. E enviou-os também para trabalharem na sua vi­nha.

O Senhor quer dar-nos um ensinamento fundamental: to­dos os homens recebem uma chamada da parte de Deus. Uns, no amanhecer das suas vidas, quando são jovens, e so­bre eles recai uma especial predileção divina por terem sido chamados tão cedo. Outros, quando já percorreram uma boa parte do caminho. E todos, em circunstâncias bem diversas: as que se dão no mundo em que vivemos. O denário que todos recebem ao terminar o dia - ao concluírem a jornada da sua vida - é a glória eterna, a participação na própria vida de Deus 2, numa felicidade sem fim, bem como a alegria incomparável, já aqui, de trabalharem para o Mestre, de consumirem a vida por Cristo.

Trabalhar na vinha do Senhor, em qualquer idade em que nos encontremos, é colaborar com Cristo na Redenção do mundo: difundindo a sua doutrina em qualquer ocasião; participando de alguma catequese ou trabalho de formação; animando este ou aquele a cumprir o preceito dominical e a freqüentar os sacramentos; sugerindo a outros a leitura do Evangelho e de algum livro espiritual; contribuindo econo­micamente para criar novos instrumentos apostólicos; pro­pondo a algum amigo, com a prudência necessária e depois de pedir insistentemente luzes na oração, a possibilidade de entregar-se mais plenamente a Deus...

Quem se sente chamado a trabalhar na vinha do Senhor deve, de modos muito diversos, participar no desígnio divi­no da salvação. Deve caminhar para a salvação e ajudar os outros a salvar-se. Ajudando os outros, salva-se a si próprio  3.

Não seria possível caminharmos em seguimento de Cris­to se ao mesmo tempo não transmitíssemos a alegre notícia da sua chamada a todos os homens, "pois quem nesta vida só procura o seu próprio interesse não entrou na vinha do Se­nhor" 4. Trabalham por Cristo os que "se desvivem por con­quistar as almas e se apressam a levar outros à vinha" 5.

II. O SENHOR SAI a diferentes horas para contratar trabalhadores para a sua vinha. Qualquer hora, qualquer momento é bom para o apostolado, para levar trabalhadores à vinha do Senhor, a fim de que sejam úteis e dêem fruto. Deus chama a cada um de acordo com as suas circunstâncias pessoais, com o seu modo de ser peculiar, com os seus defeitos e também com a capacidade de adquirir novas virtudes. Mas são incontáveis os que talvez morram sem saber que Cristo vive e que traz a salvação a todos, porque ninguém lhes transmitiu a chamada do Senhor. Como podemos, portanto, ficar parados sem falar de Deus? "Talvez me digas: E por que havia eu de me esforçar? Não sou eu quem te responde, mas São Paulo: o amor de Cristo nos compele (2 Cor 5, 14). Todo o espaço de uma existência é pouco para dilatares as fronteiras da tua caridade" 6.

Os primeiros cristãos aprenderam bem que o apostolado não tem limites de pessoas, lugares ou situações. Era fre­qüente começarem pela própria família: "Aos servos e ser­vas, bem como aos filhos, se os têm, persuadem-nos a fa­zer-se cristãos pelo amor que têm por eles, e quando se fa­zem tais, chamam-nos irmãos sem distinção"7. Foram inú­meras as famílias que, do mais humilde dos servos até os filhos ou os pais, receberam a fé e viveram no amor a Cris­to. Depois, foi a vez dos vizinhos, dos clientes ou dos com­panheiros de ofício ou de armas... A vida dos acampamen­tos, as próprias virtudes militares e bem cedo o testemunho dos mártires favoreceram a expansão do Evangelho entre os soldados. O exército romano proporcionou incontáveis márti­res na Itália, na África, no Egito e até nas margens do Da­núbio. A última perseguição começou com uma depuração das legiões8.

Todas as situações eram boas para aproximar as almas de Cristo, mesmo as que humanamente poderiam parecer menos adequadas, como a de comparecer perante um tribu­nal. São Paulo, prisioneiro em Cesaréia, fala em defesa pró­pria diante do procurador Festo e do rei Agripa. Descobre-lhes os mistérios da fé de tal forma que, dizendo ele estas coisas em sua defesa (anunciando a ressurreição de Cristo), disse Festo em voz alta: Estás louco, Paulo; o muito saber desorienta o teu juízo. E comenta São Beda: "Considerava loucura que um homem posto a ferros não falasse das calú­nias de que era acusado, mas das convicções que o ilumina­vam por dentro" 9.

Mais tarde, Agripa dirá a Paulo: Por pouco não me persuades a fazer-me cristão. E Paulo respondeu-lhe: Prouvera a Deus que, por pouco ou por muito, não somente tu, mas também todos quantos me ouvem se fizessem hoje como eu, menos estas cadeias 10.

E nós, não saberemos levar, com paciência, com cordia­lidade, os nossos parentes, vizinhos, amigos... até o Senhor? O sentido apostólico da nossa vida será a medida do nosso amor por Cristo. Não desaproveitemos nenhuma ocasião: to­das as horas são boas para levar operários até à vinha do Senhor. Todas as idades são boas para encher as mãos de frutos.

III. CAUSA SURPRESA ver o pai de família sair quase ao cair do dia, quando restava pouco tempo para trabalhar; e sur­preende também ver como se justificaram os que a essa hora tardia vagueavam ociosos: Ninguém nos contratou, ninguém nos trouxe a boa notícia de que o dono do campo procurava operários para que trabalhassem na sua vinha. É a mesma resposta que dariam hoje muitos que foram batizados, mas que vegetam numa fé que vai murchando porque ninguém se preocupou com eles. "Tiveste uma conversa com este, com aquele, com aquele outro, porque te consome o zelo pelas almas [...]. - Persevera: que ninguém possa depois descul­par-se afirmando «quia nemo nos conduxit» - que ninguém nos chamou"11. Nenhum dos nossos parentes, amigos, vizi­nhos..., dos que passaram conosco uma só tarde ou fizeram conosco a mesma viagem, ou trabalharam na mesma empre­sa, ou estudaram na mesma Faculdade... deveria dizer que não se sentiu contagiado pelo nosso amor a Cristo. Quando 0 amor é grande, manifesta-se na menor oportunidade.

Muitos sentir-se-ão atraídos pelas nossas palavras, que falam com vigor e com alegria do Mestre; outros serão aju­dados pelo nosso exemplo de um trabalho bem acabado ou de serenidade perante a dor, ou talvez pelo nosso trato cor­dial, que mergulha as suas raízes na virtude da caridade... E todos notarão o impulso que lhes vem da nossa oração e da nossa profunda alegria, conseqüência de seguirmos o Senhor de perto. Seja como for, ninguém que nos tenha conhecido em qualquer circunstância deverá poder dizer ao concluir os seus dias que não teve quem se preocupasse com ele.

Os contratados no começo do dia protestaram quando chegou o momento de receberem o salário. Sem razão, por­que receberam o que tinha sido combinado: um denário. Não compreenderam que servir o Senhor já é uma honra imerecida. Trabalhar para Cristo é reinar; e é motivo de ação de graças termos sido chamados da praça pública para terras de Deus. Sendo apóstolos no meio do mundo, o próprio serviço a Deus é a nossa recompensa, porque, na realidade, não procuramos nada para nós mesmos: queremos apenas amar mais a Cristo e servi-lo, convidando outros a trabalhar no seu campo. O Senhor nunca nos esquecerá. De­vemos ter em conta que no denário do salário "está gravada a imagem do Rei" 12: o próprio Deus se dá a cada um de nós nesta vida. E, ao entardecer, dar-nos-á uma glória sem fim: Cada um receberá segundo a medida do seu trabalho 13.

"Vamos juntos à presença da Mãe de Cristo. Mãe nossa, tu, que viste crescer Jesus, que o viste aproveitar a sua pas­sagem entre os homens, ensina-me a utilizar os meus dias em serviço da Igreja e das almas. Mãe boa, ensina-me a ou­vir no mais íntimo do coração, como uma censura carinhosa, sempre que for necessário, que o meu tempo não me perten­ce, porque é do Pai Nosso que está nos Céus" 14. Pecamos ajuda a São José para que nos ensine a gastar a vida no ser­viço a Jesus, enquanto realizamos com alegria os nossos afa­zeres no mundo.

(1) Mt 20, 1-16; (2) cfr. F. M. Moschner, Las parábolas dei reino de los cielos, pág. 215; (3) João Paulo II, Sobre a virtude da prudência, 25-10-1978; (4) São Gregório Magno, Homílias sobre os Evangelhos, 19, 2; (5) ib.; (6) São Josemaria Escrivá, Amigos de Deus, n. 43; (7) Aristides, cit. por D. Ramos, El testimonio de los primeros cristianos, pág. 195; (8) A. G. Hamman, La vida cotidiana de los primeros cristianos, 2a ed., Palabra, Madrid, 1986, pág. 81; (9) São Beda, Comentário aos Atos dos Apóstolos', (10) At 26, 24-32; (11) São Josemaria Escrivá, Sulco, n. 205; (12) São Jerônimo, Comentário ao Evangelho de São Mateus, 4, 3; (13) 1 Cor 3, 8; (14) São Josemaria Escrivá, Amigos de Deus, n. 54.

Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal


Santa Helena

18 de Agosto

Santa Helena

Santa Helena é a mãe do imperador romano Constantino Magno. Ela nasceu na Bitínia, uma província do Império Romano. Era de família simples, plebeia. Casou-se com um tribuno militar chamado Constâncio Cloro. Deste casamento nasceu Constantino no ano 285, o futuro imperador romano e primeiro imperador cristão.

O imperador Maximiano, quis unir-se a Constâncio Cloro, marido de Helena, para o governo Romano. Mas, para isso, impôs uma condição: que ele deixasse Helena e casasse com Teodora, parente do imperador. Santa Helena passou para segundo plano, mas pôde cuidar da educação do filho Cons­tantinho e criar grande laço com ele. Ele, por sua vez, crescia no exército romano por causa de sua coragem e inteligência.

Depois da morte de Constâncio Cloro, Constanti­no, filho dele e de Santa Helena, foi aclamado Augusto Imperador Romano. Isso aconteceu no ano 306, na região inglesa de York, através das legiões da Bretanha, pelo fato importantíssimo de Constantino vencido a batalha. Assim, Santa Helena voltou a viver na corte e recebeu do filho o título de “Mulher Nobilíssima”. Depois disso, ainda recebeu a mais alta honra que uma mulher po­deria receber em Roma: o título de “Augusta”.

Estava começando um novo tempo para o cristianismo. Até o ano de 313, Helena e Constantino ainda não eram cristãos. Mas, na batalha de Constantino contra Maxêncio, ocorreu um fato extraordinário. A situação era favorável a Maxêncio. Constantino, porém, con­trário às perseguições contra o cristianismo, teve uma visão: uma cruz brilhante no céu, e as palavras: "Com este sinal vence­rás". Constantino, então, mandou pintar as bandeiras e estandartes de seu exército com esta cruz e venceu. Este acontecimento causou a conversão de Constantino e de Helena. Constantino ordenou o fim das perseguições contra os cristãos, através do famoso documento chamado “Edito de Milão”, no ano 313. Graças ao Édito, o cristianismo passou a ter os mesmos direitos das outras religiões. Anos mais tarde, o imperador Teodósio fez do cristianismo a religião oficial do Império Romano.

Ao contrário do filho Constantino, que só se batizou perto de sua morte, Helena quis ser batizada e assumir a fé cristã desde que seu filho venceu a batalha contra Maxêncio. Santa Helena, ao longo de sua vida mostrou grande fervor. Este fervor aparecia em grandes obras assistenciais e na construção de várias igrejas em lugares santos.

Santa Helena procurou se instruir na fé cristã e mostrou grande piedade ao longo de sua vida. Por isso, o imperador Constantino recompensou seus méritos e lhe deu o título honroso de “Augusta”. Além disso, mandou cunhar moedas com a imagem da rainha sua mãe. Santa Helena, por sua vez, dedicou toda sua influência e ações para proteger a fé cristã, que emergia das catacumbas para o tempo da liberdade. O maior desejo de Santa Helena era visitar a Terra Santa. Apesar da idade e das agruras da viagem, ela conseguiu realizar seu sonho, visitando os luga­res santos, promovendo o culto e mandando construir igrejas na Palestina.

Santa Helena foi acompanhar es­cavações começadas em Jerusalém pelo bispo chamado São Macário. Este en­controu o Santo Sepulcro escavado na rocha, a Cruz de Jesus e as duas cruzes dos ladrões. Santa Helena acompanhou tudo isso cheia de piedade e felicidade. O fato causou grande conforto para todos os cristãos. En­tusiasmada com este acontecimento, ela mandou que procurassem a gruta do nascimento de Jesus e o lugar sobre o Monte das Olivei­ras onde Jesus falou com seus discípulos antes da Ascenção. Depois dessas descobertas, Santa Helena dedicou-se à construção de outras igrejas. Uma delas, que fica no monte das Oliveiras, recebeu mais tarde o nome de Santa Helena.

Após ter algumas visões, Santa Helena viveu a felicidade de proporcionar o reencontro da verdadeira Cruz de Cristo. Este acontecimento levou à instituição da festa litúrgica da Santa Cruz. Essa descoberta de Santa Helena é atestada pelos escritores Sulpicius Severus e Rufinus, no século IV. Pedaços da cruz ficaram em Jerusalém e outros foram levados para Roma. Alguns desses fragmentos foram distribuídos em várias igrejas. O desejo de Santa Helena é que a cruz estivesse em toda a Igreja.

A generosidade de Santa Helena era grande. Ela ajudava os indivíduos e comunidades inteiras. Os pobres eram objetivos especiais deste seu grande amor. Ela visitava igrejas e comunidades fazendo grandes doações. Ela construiu a Basílica da Natividade, em Belém, que dura até hoje, e a Basílica da Ascensão de Jesus, no Monte das Oliveiras. Ajudou na construção de mosteiros e ela própria vivia num convento na Palestina, participando com grande devoção de todos os exercícios de fé e piedade.

Pressentindo sua morte, Santa Helena voltou para perto do filho Constantino, e veio a falecer em 330, aos 80 anos. Seu corpo foi trasladado para Constantinopla e colocado na cripta da Igreja dos Apóstolos. Mais tarde, seus restos mortais foram transferidos para a Abadia de Hautvillers, em Reims, França, em 849. Hoje, os restos mortais de Santa Helena estão em Roma, no Vaticano. Ela passou a ser reverenciada como santa logo após sua morte. Sua veneração se expandiu até nos países do Ocidente.

Uma ilha do Oceano Atlântico chamada “Santa Helena”, tem este nome porque marinheiros espanhóis a encontraram no dia da festa de Santa Helena, no dia 18 de agosto de 1501.

Na arte litúrgica santa Helena ela é apresentada vestida como rainha, segurando a cruz ou indicando o local da Cruz. Ela aparece também com a cruz sendo revelada a ela nos sonhos. Ela também é representada supervisionando a procura da Cruz. Outra representação é como uma senhora medieval, tendo uma cruz e um livro ou segurando a cruz e os cravos. A Igreja sempre a venerou e será grata a ela pela decisiva participação a favor da liberdade da Igreja.

Fonte: https://cruzterrasanta.com.br


O Sentido Cristão dos Bens

 TEMPO COMUM. VIGÉSIMA SEMANA. TERÇA‑FEIRA

– Os bens da terra devem ordenar‑se para o fim sobrenatural do homem.
– A riqueza e os talentos pessoais devem estar a serviço do bem. Como é a pobreza de quem vive no meio do mundo e deve santificar‑se nos afazeres temporais.
– Desenvolver os talentos que o Senhor nos deu para o bem dos outros.

I. OS APÓSTOLOS VIRAM com pena como o jovem que não quis abandonar as suas riquezas para seguir o Mestre se retirava. Viram‑no partir com essa tristeza característica dos que não querem corresponder ao que Deus lhes pede.

Nesse clima, enquanto retomavam a caminhada, o Senhor disse‑lhes: É difícil a um rico entrar no reino dos céus. E acrescentou: Digo‑vos mais: é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus. Os discípulos ficaram muito admirados 1.

Quem põe o seu coração nos bens da terra torna‑se incapaz de encontrar o Senhor, porque o homem pode ter como fim a Deus, a quem alcança através das coisas materiais utilizadas como simples meios que são, ou escolher as riquezas como meta da sua vida, nas suas diversas manifestações de desejo de luxo, de comodidade, de possuir mais... O coração orienta‑se de acordo com um desses fins. Quem o tem repleto de bens materiais não pode amar a Deus: Não se pode servir a Deus e às riquezas 2, ensinou o Senhor em outra ocasião.

O termo arameu original que o Senhor utilizou para referir‑se às riquezas foi Mammon, que “designa com irrisão um ídolo. Por que se trata de um ídolo? Por um duplo motivo. Em primeiro lugar, porque um ídolo é um substitutivo de Deus; trata‑se de escolher um ou outro [...]. Em segundo lugar, pelo seu conteúdo. Além do dinheiro, simples unidade monetária, o ídolo Mammon simboliza um instrumento da vontade de poder, um meio de posse do mundo, uma expressão da avidez de coisas e também uma distorção das relações dos homens entre si. O domínio que o ídolo exerce sobre o homem opõe‑se ao que é próprio da pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus, e portanto à sua relação com o Criador” 3.

Quem concentra os seus desejos nas coisas da terra como se fossem um bem absoluto, comete uma espécie de idolatria 4, corrompendo a sua alma como a corrompe com a impureza 5, e, com freqüência, acaba por unir‑se aos “príncipes deste mundo”, que se levantam contra Deus e contra o seu Cristo 6.

O amor desordenado pelos bens materiais, sejam poucos ou muitos, é um gravíssimo obstáculo para o seguimento de Cristo, como se observa no episódio do jovem rico e nas palavras duras e enérgicas com que o Senhor condena o mau uso das riquezas. Por isso, o cristão deve examinar com freqüência se está realmente desprendido das coisas da terra, se aprecia mais os bens da alma que os do corpo, se utiliza os seus bens para fazer o bem, se eles o aproximam ou antes o separam de Deus, se é austero nas suas necessidades pessoais, fugindo dos gastos supérfluos, dos caprichos, das falsas necessidades. Que pena se alguma vez não víssemos Jesus que passa ao nosso lado por termos o coração posto em coisas que em breve deveremos deixar! Coisas que valem tão pouco em comparação com as riquezas sem limites que Cristo dá aos que o seguem!

II. O CRISTÃO QUE VIVE no meio do mundo não deve esquecer, no entanto, que os bens materiais em si mesmos são bens que ele deve produzir em benefício da sua família e da sociedade, das boas obras que mantém com o seu esforço, e que lhe cabe santificar‑se com eles. Nada mais distante do verdadeiro espírito de pobreza laical que a atitude encolhida de quem vê com medo o mundo e as suas riquezas. O verdadeiro progresso e o desenvolvimento – também material – são bons e queridos por Deus. E o Senhor não pregou nunca nem a sujidade nem a miséria. Todos temos de lutar, na medida das nossas possibilidades, contra a pobreza, a miséria e qualquer situação de indigência que degrade o ser humano.

A pobreza do fiel cristão, que deve santificar‑se no meio das suas tarefas seculares, não depende de uma circunstância meramente exterior: de ter ou não ter bens materiais. É algo mais profundo que afeta o coração, o espírito do homem; consiste em ser humilde diante de Deus, em sentir‑se sempre necessitado diante dEle, em ser piedoso, em ter uma fé rendida que se manifesta nas obras e na vida.

Se se possuem essas virtudes e além disso abundância de bens, a atitude do cristão deve ser a do desprendimento, da caridade generosa. E quanto àquele que não possui bens materiais abundantes, nem por isso está justificado diante de Deus, se não se esforça por adquirir as virtudes que constituem a verdadeira pobreza. Na sua escassez, pode manifestar também a sua generosidade, o seu domínio sobre as coisas, e estar desprendido do pouquíssimo de que dispõe.

Jesus esteve muito perto dos pobres, dos doentes, dos que passavam necessidade, mas entre os mais chegados à sua pessoa não faltaram pessoas de fortuna mais ou menos considerável. As mulheres que o sustentavam com os seus bens eram pessoas de posses. Alguns dos Apóstolos, como Mateus ou os filhos de Zebedeu, tinham alguns meios econômicos. José de Arimatéia, que é mencionado expressamente como discípulo do Senhor, era um homem rico 7; ele e Nicodemos tiveram o privilégio de receber o Corpo morto de Jesus 8, para cujo sepultamento este último trouxe uma grande quantidade de aromas (umas cem libras, mais de trinta quilos!). A família de Betânia, pela qual Jesus nutria uma especial amizade, era, provavelmente, de bom nível social, pois foram muitos os judeus que acudiram à sua casa quando da morte de Lázaro. O Senhor faz‑se convidar por Zaqueu, que o recebe em sua casa, e admite‑o entre os seus seguidores9. As próprias roupas de Jesus eram de bom preço, pois vestia uma túnica inconsútil, orlada...

“Os bens da terra não são maus; pervertem‑se quando o homem os erige como ídolos e se prostra diante deles; enobrecem‑se quando os convertemos em instrumentos a serviço do bem, numa tarefa cristã de justiça e de caridade. Não podemos correr atrás dos bens materiais como quem vai à busca de um tesouro; o nosso tesouro [...] é Cristo, e nEle se devem concentrar todos os nossos amores [...]” 10. Ele é o verdadeiro valor que define toda a nossa vida. Temos de imitá‑lo nas nossas circunstâncias pessoais. E nunca devemos dar por subentendido que já estamos desprendidos dos bens, porque a tendência de todo o homem, de toda a mulher, é fabricar os seus próprios ídolos, criar “necessidades desnecessárias”, sem tomar em consideração que “o homem, ao usá‑las, não deve ter as coisas que possui legitimamente como exclusivamente suas, mas também como comuns, no sentido de que não são proveitosas apenas para ele, mas também para os outros” 11.

Examinemos hoje a retidão com que usamos os bens e se temos o coração posto no Senhor, desapegado do muito ou do pouco que possuímos, tendo em conta que “um sinal claro de desprendimento é não considerar – de verdade – coisa alguma como própria” 12.

III. DEVEMOS DESENVOLVER sem medo, sem falsa modéstia nem timidez, todos os talentos que o Senhor nos deu; pôr em ação todas as nossas energias para que a sociedade progrida e seja cada vez mais humana, e se dêem as condições necessárias para que todos os homens tenham uma vida digna, própria dos filhos de Deus. Temos de aprender a dar do que é nosso, a fomentar e a ajudar instituições e fundações que elevem e redimam o homem da sua falta de cultura ou das suas condições menos humanas. Temos de procurar, na medida das nossas forças e sempre com o nosso exemplo, que deixem de existir essas desigualdades e diferenças sociais que bradam ao céu: por um lado, pessoas que lutam diariamente por sobreviver; por outro, desperdícios e esbanjamentos escandalosos que ofendem a criatura e o Criador.

São muitas as dificuldades que se levantam a quem se dispõe a viver o ideal da pobreza cristã: dificuldades internas – no nosso coração, em que subsistem as raízes do egoísmo, da posse desordenada e da ostentação – e externas – as de um ambiente lançado desenfreadamente na busca dos bens de consumo. Este ambiente externo, que traz às costas uma forte carga de sensualidade, “é o «caldo de cultura» propício para que proliferem os desvios morais de todos os tipos: o erotismo, a exaltação do prazer cultivado por si mesmo, a degradação pelo abuso das bebidas alcoólicas e das drogas, etc. É evidente que tais excessos surgem como conseqüência da profunda insatisfação que o homem experimenta quando se afasta de Deus [...]. O resultado salta à vista: homens e mulheres – incontáveis já – desprovidos de ideais, sem critério nem sentido claro das coisas da vida” 13, que se levantam contra o Senhor e contra o seu Cristo.

O fim do cristão nesta vida não pode ser enriquecer‑se, acumular bens, possuir tanto quanto puder. Isso levaria ao maior empobrecimento da sua pessoa. A temperança na posse e no uso dos bens dá ao cristão uma maturidade humana e sobrenatural que lhe permite seguir Cristo de perto e realizar um grande apostolado neste mundo. É necessário oferecer à sociedade um exemplo firme de austeridade que a tire da cegueira em que pode encontrar‑se e lhe sirva de apoio para arrepiar caminho. Comecemos nós mesmos por ser desses homens heróicos – basta um punhado deles – que “põem em desprezar as riquezas o mesmo empenho que os homens põem em possuí‑las 14.

A Virgem, que soube viver como ninguém esta virtude da pobreza, ajudar‑nos‑á hoje a formular um propósito bem concreto, que talvez consista em corrigir detalhes, ou talvez nos leve generosamente a rever toda a nossa vida, de alto a baixo, para imitarmos verdadeiramente o Senhor, que, sendo rico, se fez pobre15.

(1) Mt 19, 23‑25; (2) Mt 6, 24; (3) J. M. Lustinger, Secularidad y teologia de la Cruz, Madrid, 1987, págs. 155‑156; (4) Col 3, 5; (5) cfr. Ef 4, 19; 5, 3; (6) cfr. Sl 2, 2; (7) Mt 27, 57; (8) Jo 19, 38; (9) Lc 19, 5; (10) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 35; (11) Conc. Vat. II, Const. Gaudium et spes, 69; (12) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 524; (13) A. Fuentes, El sentido cristiano de la riqueza, Rialp, Madrid, 1988, págs. 186‑187; (14) cfr. São Josemaría Escrivá, Caminho, n. 633; (15) 2 Cor 8, 9.

Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal


Alegria e Generosidade

TEMPO COMUM. VIGÉSIMA SEMANA. SEGUNDA‑FEIRA

– O jovem rico. A alegria da entrega.
– O Senhor passa e pede
– A tristeza faz muito mal à alma. Procurar a alegria através da generosidade.

I. DEPOIS DE ABENÇOAR umas crianças, Jesus partiu do lugar, e, enquanto caminhava, aproximou‑se dEle um jovem, prostrou‑se de joelhos 1 e perguntou‑lhe: Bom Mestre, que devo fazer para alcançar a vida eterna? Jesus, de pé, contempla esse jovem com uma grande esperança; os discípulos, que se detiveram, ficam calados e olham. A cena, narrada no Evangelho da Missa 2, é de uma grande beleza. Talvez o jovem tivesse escutado Jesus nalguma outra ocasião, mas só agora se atreve a comunicar‑se diretamente com Ele. Na sua alma há desejos de entrega, de amar mais…; talvez esteja insatisfeito com a sua vida. Por isso, quando o Senhor lhe diz que deve guardar os mandamentos, responde que já os cumpre, e pergunta: Quid adhuc mihi deest? Que me falta ainda? É a pergunta que tantos e tantas fizeram a si próprios ao verificarem que a vida que levavam não os satisfazia.

Jesus, tão atento aos menores movimentos das almas, comoveu‑se ao contemplar os desejos e a pureza daquele coração. Foi nessa altura que dirigiu ao jovem o olhar de que nos fala São Marcos, e o amou 3. O olhar de Jesus, um olhar profundo, inesquecível, é por si só uma chamada. E convidou‑o a segui‑lo abandonando todos os seus tesouros. Foi um convite para que deixasse o coração livre e disponível para Deus. Tratava‑se de trocar o amor aos bens pelo amor a Jesus, de deixar as posses materiais para enriquecer‑se, de uma maneira real e efetiva, com os bens eternos 4.

Mas o jovem não foi generoso: ficou com as suas riquezas, de que desfrutaria por uns anos, e perdeu Jesus, tesouro infinito, a quem temos para sempre neste mundo e na eternidade. No seu egoísmo, esse rapaz não esperava a resposta que o Mestre lhe deu.

Os planos de Deus não coincidem geralmente com os nossos, com os que projetamos na nossa imaginação, com aqueles que a vaidade ou o egoísmo fabricam. Os planos divinos, forjados desde a eternidade para nós, são mais belos do que os que possamos imaginar, ainda que algumas vezes nos desconcertem.

Ao ouvir as palavras de Jesus, o jovem retirou‑se triste porque tinha muitos bens. Todos viram como resistiu àquele amável e amoroso convite do Senhor, como partiu com a marca da tristeza no rosto. Talvez, dias depois, descobrisse falsas justificações para a sua falta de generosidade, uns argumentos que lhe devolveriam a tranqüilidade perdida (nunca a paz, que é fruto da entrega): pensou provavelmente que era muito jovem, ou que mais tarde veria tudo com mais clareza e tornaria a procurar o Mestre… Que fracasso! Que ocasião desperdiçada!, pois ou seguimos Jesus ou perdemo‑lo.

Jesus nunca nos deixa indiferentes quando passa por nós. Quem tenha sentido o olhar de Jesus pousar sobre ele nunca mais o esquece, já não pode viver como antes. E se se abre a esse olhar, a sua vida enche‑se de gozo e de paz, nessa disponibilidade absoluta diante da vontade de Deus que se manifesta em momentos bem precisos da nossa vida; talvez agora.

II. “AQUELE RAPAZ REJEITOU a insinuação, e conta‑nos o Evangelho que abiit tristis (Mt 19, 22), que se retirou entristecido […]: perdeu a alegria porque se negou a entregar a sua liberdade a Deus” 5. Liberdade que, se não lhe serviu para chegar à meta, a Cristo que passava pela sua vida, para bem pouco havia já de servir‑lhe.

A tristeza nasce no coração, como uma erva daninha, quando nos afastamos de Cristo, quando lhe negamos aquilo que nos pede de uma vez ou pouco a pouco, quando nos falta generosidade. Esta doença da alma “é um vício causado pelo amor desordenado de si mesmo” 6. Podemos adoecer, podemos experimentar cansaço e dor, mas a tristeza do coração é diferente. Na sua origem, sempre encontramos a soberba e o egoísmo: por trás dessa falta de vontade, sem causa aparente, à hora de cumprirmos o dever, pode estar a impossibilidade de afirmarmos o nosso critério e a nossa personalidade, a vaidade; por trás dessa dor, pode esconder‑se a rebeldia de não querermos aceitar a vontade de Deus; nesse desalento em face das faltas próprias, pode ocultar‑se mais a humilhação sofrida do que a dor de termos ofendido o Senhor… “Se Deus me perdoou, se o seu amor misericordioso, sempre presente, se derrama sobre mim, como posso estar triste? Se alguém alimenta a sua tristeza na dor dos seus pecados, agarrado à sua culpa, esse homem deve saber que se trata possivelmente de um pretexto e, sempre, de um erro” 7. As nossas faltas e pecados devem levar‑nos à alegria do arrependimento e do amor que renasce com nova vibração.

O Senhor passa perto da nossa vida em inúmeras ocasiões. Umas vezes pede‑nos muito, para nos dar muito mais: a entrega do coração e da vida, como ao jovem rico. Outras, pede‑nos coisas pequenas: o cumprimento amoroso do dever, a prática de umas normas de piedade distribuídas ao longo do dia, a uma hora previamente marcada por nós mesmos; a mortificação da imaginação e da memória… Em todas essas circunstâncias, “é preciso saber entregar‑se, arder diante de Deus, como essa luz que se coloca sobre o candelabro para iluminar os homens que andam em trevas; como essas lamparinas que se queimam junto do altar, e se consomem alumiando até se gastarem” 8.

E não há ninguém a quem o Senhor não chame e peça alguma coisa, seja muito, seja pouco: a cada um no seu lugar e no estado em que é chamado, na peculiar vocação que recebeu de Deus. Esta vocação é o assunto mais importante da nossa vida, e a fidelidade em corresponder‑lhe deve ser o propósito em que nos empenhamos mais tenazmente, com a ajuda da graça, até o último instante dos nossos dias.

III. RETIROU‑SE TRISTE. Nada mais sabemos do jovem rico. A sua história termina envolta num manto de tristeza. Talvez pudesse ter sido um dos Doze; mas não quis. E Jesus respeitou a sua liberdade, uma liberdade de que ele não soube usar.

“O comerciante – comenta São Basílio – não se entristece quando gasta nas feiras aquilo que possui para adquirir as suas mercadorias; mas tu (refere‑se ao jovem rico) entristeces‑te dando pó em troca da vida eterna” 9: preferiu conservar o pó – que é o que são todas as posses e riquezas – a escolher a vida eterna que Cristo lhe oferecia; preferiu ficar com o pó em que os seus bens se converteriam ao cabo de uns anos.

A tristeza faz muito mal à alma. Assim como a traça come o vestido, e o cupim a madeira, assim a tristeza corrói o coração do homem 10. Por isso temos de lutar prontamente, se alguma vez se instala na alma: Afugenta para longe de ti a tristeza, porque a tristeza tem matado a muitos, e não há utilidade nela 11. Desse estado só se podem esperar males.

Se a nossa vida consiste realmente em seguir os passos de Cristo, é lógico que estejamos sempre alegres: é a única alegria verdadeira do mundo, sem limite e sem medida; compatível, por outro lado, com a dor, com a doença, com o fracasso… “A alegria cristã exclui de modo definitivo e combate implacavelmente toda a tristeza enfermiça ou imaginária; a inveja, o desânimo, a preocupação absorvente com o “eu” não podem conviver com ela, e um dos seus benefícios é o de excluir todas essas penas, cheias de veneno e fontes de morte” 12.

Uma alma triste está à mercê de muitas tentações. Quantos pecados tiveram a sua origem na tristeza! Quantos ideais ela destruiu! Se alguma vez sentimos a mordida da tristeza, examinemos sinceramente na oração qual é a causa. Descobriremos muitas vezes que é a falta de generosidade com Deus ou com os outros.

“«Laetetur cor quaerentium Dominum» – Alegre‑se o coração dos que procuram o Senhor.

“– Luz, para que investigues os motivos da tua tristeza” 13.

Perguntemo‑nos, não só quando nos encontrarmos nessa situação, mas agora – porque sempre podemos crescer em alegria –, se estamos procurando seriamente o Senhor em tudo o que nos acontece cada dia, mediante a oração e o empenho por manter‑nos na presença de Deus. Perguntemo‑nos: Em que coisas não estou sendo generoso com Deus? Em que coisas não sou desprendido no trato com os outros? Preocupo‑me excessivamente com as minhas coisas, com a minha saúde, com o meu futuro, com as minhas ninharias?… É possível que, por meio desse exame, não demoremos a encontrar a causa dos nossos abatimentos e o remédio para eles.

Entretanto, procuremos melhorar o nosso trato com o Senhor, tentemos dar‑nos sem cálculo às pessoas com quem nos relacionamos, ainda que seja em pequenos serviços; abramos o coração a quem nos conhece e aprecia, ao sacerdote a quem confiamos a direção espiritual da nossa alma.

Com a alegria que Cristo nos dá, fazemos muito bem à nossa volta. Comunicá‑la aos outros será freqüentemente uma das maiores provas de caridade para com eles. Muitas pessoas podem encontrar a Deus nessa nossa alegria profunda; procuremos não perdê‑la.

Santa Maria, causa da nossa alegria, rogai por nós, concedei‑nos a graça de seguir o vosso Filho de perto, a alegria de nunca virar‑lhe as costas, nem sequer nas pequenas coisas de cada dia.

(1) Cfr. Mt 10, 17; (2) Mt 19, 16‑22; (3) Mc 10, 21; (4) cfr. M. J. Indart, Jesus en su mundo, pág. 251; (5) Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 24; (6) São Tomás, Suma Teológica, II‑II, q. 28, a. 4, ad. 1; (7) C. López Pardo, Sobre la vida y la muerte, Rialp, Madrid, 1973, pág. 157; (8) Josemaría Escrivá, Forja, n. 44; (9) São Basílio, em Catena Aurea, vol. VI, pág. 313; (10) Prov 25, 20; (11) Ecl 30, 24‑25; (12) J. M. Perrin, El evangelio de la alegria, Rialp, Madrid, 1962, págs. 59‑60; (13) Josemaría Escrivá, Caminho, n. 666.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal


São Jacinto

17 de Agosto

São Jacinto 

Batizado com o nome de Jacko, ele nasceu em 1183, na antiga Kramien, atual Cracóvia, na Polônia. Alguns biógrafos dizem que pertencia à piedosa família Odrovaz, da pequena nobreza local. Desde cedo, aprendeu a bondade e a caridade, despertando, assim, sua vocação religiosa. Antes de ingressar na Ordem dos Predicadores de São Domingos, ele era cônego na sua cidade natal.

Foi em Roma que conheceu Domingos de Gusmão, fundador de uma nova Ordem, a dos Padres Predicadores. Pediu seu ingresso e foi aceito na nova congregação. Depois de um breve noviciado, concluído em Bolonha, provavelmente em 1221, vestiu o hábito dominicano e tomou o nome de frei Jacinto. Na ocasião, foi o próprio são Domingos que o enviou de volta à sua pátria com um companheiro, frei Henrique da Morávia.

Assim iniciou sua missão de grande pregador. O trabalho que ele teria de desenvolver na Polônia fora claramente fixado pelo fundador. Jacinto fundou, em Cracóvia, um mosteiro da Ordem de São Domingos. Depois de pregar por toda a diocese, mandou alguns dominicanos missionários para a Prússia, Suécia e Dinamarca, pois esses países pagãos careciam de evangelização.

O grande afluxo de religiosos à nova Ordem permitiu, em 1225, por ocasião do capítulo provincial, que se decidisse pela fundação de cinco novos mosteiros na Polônia e na Boêmia.

Jacinto, então prior do convento de Kiev, preparava-se para celebrar a Eucaristia. É nesse momento que alguém grita que os invasores estão às portas da cidade e destroem tudo. Agarrando no que mais sagrado tinha, Jacinto foge da igreja com a píxide onde se guardava o Santíssimo Sacramento.

Ao sair da igreja, despedindo-se da imagem da Virgem Maria diante da qual tantas vezes tinha rezado, esta pergunta-lhe se a deixa para trás, se a abandona aos bárbaros. Jacinto desculpa-se com o peso da imagem em pedra e é então que a Virgem lhe responde que ele tinha forças para a carregar.

A imagem torna-se leve como o papel, e por isso Jacinto não só a retira da igreja como a transporta até Cracóvia, onde readquire o peso natural da pedra que era depois de entronizada na igreja da Santíssima Trindade.

Por este milagre, São Jacinto da Polónia é iconograficamente representado com o hábito branco e negro dominicano, ou paramentado com estola para celebrar a missa, segurando numa mão a píxide com o Santíssimo Sacramento e carregando no outro braço a imagem da Virgem Maria.

Mas os acontecimentos extraordinários não ficaram por aqui, porque vendo-se nas margens do rio Dnieper sem meios para o atravessar e fugir aos Tártaros, Jacinto ousadamente caminha sobre as águas e consegue chegar à outra margem são e salvo, juntamente com os companheiros e os tesouros santíssimos que tinha salvo da igreja conventual.

Jacinto foi um incansável pregador da Palavra de Cristo e um dos mais pródigos colaboradores do estabelecimento da nova Ordem naquelas regiões tão distantes de Roma. Foram 40 anos de intensa vida missionária.

No ano dia 15 de agosto 1257, morreu no Mosteiro de Cracóvia, Polônia, consumido pelas fadigas, aos 72 anos de idade. Considerado pelos biógrafos uma das glórias da Ordem Dominicana, foi canonizado em 1524 pelo papa Clemente VII.

A festa de são Jacinto, o 'apóstolo da Polônia', era tradicionalmente celebrada um dia depois da sua morte, mas, em razão da veneração da Assunção de Maria, foi transferida para o dia 17 de agosto.

Fonte: http://santossanctorum.blogspot.com


Assunção de Nosa Senhora

18 de Agosto

Assunção de Nossa Senhora

Hoje, solenemente, celebramos o fato ocorrido na vida de Maria de Nazaré, proclamado como dogma de fé, ou seja, uma verdade doutrinal, pois tem tudo a ver com o mistério da nossa salvação. Assim definiu o Papa Pio XII em 1950 através da Constituição Apostólica Munificentissimus Deus: “A Imaculada Mãe de Deus, a sempre Virgem Maria, terminado o curso da vida terrestre foi assunta em corpo e alma à glória celestial”.

Antes, esta celebração, tanto para a Igreja do Oriente como para o Ocidente, chamava-se “Dormição”, porque foi sonho de amor. Até que se chegou ao de “Assunção de Nossa Senhora ao Céu”, isto significa que o Senhor reconheceu e recompensou com antecipada glorificação todos os méritos da Mãe, principalmente alcançados em meio às aceitações e oferecimentos das dores.

Maria contava com 50 anos quando Jesus subiu ao Céu. Tinha sofrido muito: as dúvidas do seu esposo, o abandono e pobreza de Belém, o desterro do Egito, a perda prematura do Filho, a separação no princípio do ministério público de Jesus, o ódio e perseguição das autoridades, a Paixão, o Calvário, a morte do Filho e, embora tanto sofrimento, São Bernardo e São Francisco de Sales é quem nos aponta o amor pelo Filho que havia partido como motivo de sua morte.

É probabilíssima, e hoje bastante comum, a crença de a Santíssima Virgem ter morrido antes que se realizasse a dispersão dos Apóstolos e a perseguição de Herodes Agripa, no ano 42 ou 44. Teria então uns 60 anos de idade. A tradição antiga, tanto escrita como arqueológica, localiza a sua morte no Monte Sião, na mesma casa em que seu Filho celebrara os mistérios da Eucaristia e, em seguida, tinha descido o Espírito Santo sobre os Apóstolos. Esta a fé universal na Igreja desde tempos remotíssimos.

A Virgem Maria ressuscitou, como Jesus Cristo, pois sua alma imortal uniu-se ao corpo antes da corrupção tocar naquela carne virginal, que nunca tinha experimentado o pecado. Ressuscitou, mas não ficou na terra e sim imediatamente foi levantada ou tomada pelos anjos e colocada no palácio real da glória. Não subiu ao Céu, como fez Jesus, com a sua própria virtude e poder, mas foi erguida por graça e privilégio, que Deus lhe concedeu como a Virgem antes do parto, no parto e depois do parto, como a Mãe de Deus. Nossa Senhora da Assunção, rogai por nós!

Fonte: https://cleofas.com.br


Assunção de Nossa Senhora

– Maria, assunta em corpo e alma aos céus. Contemplação do quarto mistério glorioso do Santo Rosário.
– Do Céu, a Santíssima Virgem intercede pelos seus filhos e cuida deles.
– A Assunção de Nossa Senhora, esperança da nossa ressurreição gloriosa.

A Igreja professou unanimemente, desde os primeiros séculos (V-VI), a fé na Assunção de Maria Santíssima em corpo e alma à glória celestial, como se deduz da Liturgia, dos documentos devotos, dos escritos dos Padres e dos Doutores. Esta fé multissecular e universal foi confirmada por todo o Episcopado na Carta Apostólica de 1-V-1946, que ilustra as razões da definição dogmática proclamada por Pio XII no dia 1-XI-1950.

I. POREI INIMIZADE entre ti e a mulher e entre a tua posteridade e a dela 1. A Virgem Santa Maria aparece assim associada a Cristo Redentor na luta e no triunfo sobre Satanás. É o plano divino que a Providência tinha preparado desde a eternidade para nos salvar. Esse é o anúncio do primeiro livro da Sagrada Escritura, e no último voltamos a encontrar esta afirmação portentosa: Apareceu no céu um grande sinal: uma mulher vestida de sol, com a lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas sobre a cabeça2. É a Santíssima Virgem, que entra em corpo e alma no Céu ao terminar a sua vida entre nós. E chega para ser coroada como Rainha do Universo, por ser a Mãe de Deus. O rei está encantado com a tua formosura 3, diz o Salmo responsorial.

O Apóstolo São João, que certamente foi testemunha do trânsito de Maria – o Senhor a confiara ao discípulo, e ele não estaria ausente nesse momento... –, nada nos diz no seu Evangelho acerca dos últimos instantes de Nossa Senhora aqui na terra. Quem nos falou com tanta clareza e força da morte de Jesus no Gólgota cala-se quando se trata dAquela de quem cuidou como sua mãe e como Mãe de Jesus e de todos os homens 4.

Externamente, deve ter sido como um doce sono: “Saiu deste mundo em estado de vigília”, diz um antigo escritor 5; na plenitude do amor. “Terminado o curso da sua vida terrena, foi assunta em corpo e alma à glória celestial” 6. Ali a esperava o seu Filho Jesus, com o seu corpo glorioso, tal como Ela o tinha contemplado depois da Ressurreição.

Com o seu divino poder, Deus manteve a integridade do corpo de Maria e não permitiu nele a menor alteração, conservando-o em perfeita unidade e completa harmonia. Nossa Senhora pôde “como supremo coroamento das suas prerrogativas, ver-se isenta da corrupção do sepulcro e, vencendo a morte – como o seu Filho a tinha vencido antes –, ser elevada em corpo e alma à glória celestial” 7. Quer dizer, a harmonia dos privilégios marianos reclamava a sua Assunção aos céus.

Teremos contemplado muitas vezes este privilégio de Nossa Senhora no quarto mistério glorioso do Santo Rosário: “Adormeceu a Mãe de Deus. [...] Mas Jesus quer ter a sua Mãe, em corpo e alma, na Glória. – E a Corte celestial mobiliza todo o seu esplendor para homenagear a Senhora. – Tu e eu – crianças, afinal – pegamos a cauda do esplêndido manto azul da Virgem, e assim podemos contemplar aquela maravilha.

“A Trindade Beatíssima recebe e cumula de honras a Filha, Mãe e Esposa de Deus... – E é tanta a majestade da Senhora, que os anjos perguntam: Quem é Esta?” 8 Alegramo-nos com os Anjos, cheios também de admiração, e felicitamo-la na sua festa. E sentimo-nos orgulhosos de ser filhos de tão grande Senhora.

Neste mistério, a piedade popular e a arte mariana têm representado com freqüência a Virgem levada pelos Anjos e aureolada de nuvens. São Tomás vê nestas intervenções angélicas, em favor dos que deixaram esta terra e se dirigem para o Céu, a manifestação da reverência que os Anjos e todas as criaturas tributam aos corpos gloriosos 9. No caso de Nossa Senhora, tudo o que possamos imaginar é bem pouco – nada – em comparação com o que deve ter acontecido realmente. Santa Teresa conta que, certa vez, viu a mão – apenas a mão – glorificada de Nosso Senhor, e diz que, perto dela, quinhentos mil sóis refletidos no mais límpido cristal eram como uma noite triste e escura. Como seria o rosto de Cristo, o seu olhar...? Um dia, se formos fiéis, contemplaremos Jesus e Santa Maria, a quem tantas vezes invocamos nesta vida.

II. HOJE A VIRGEM MARIA, Mãe de Deus, foi elevada à glória do céu. Aurora e esplendor da Igreja triunfante, Ela é consolo e esperança do nosso povo ainda peregrino 10.

Fixemos o nosso olhar em Maria, já assunta aos céus. “E assim como um caminhante, pondo a mão sobre a testa como anteparo para contemplar um vasto panorama, procura alguma figura humana que lhe permita fazer uma idéia daqueles lugares, assim nós, que olhamos para Deus com olhos deslumbrados, identificamos e damos as boas-vindas a uma figura humana que está ao lado do seu trono [...]. E ao fitá-la, vemos mais claramente a Deus, através dessa obra-prima das suas relações com a humanidade” 11.

Todos os privilégios de Maria se relacionam com a sua Maternidade e, portanto, com a nossa Redenção. Maria assunta aos céus é imagem e antecipação da Igreja que se encontra ainda a caminho da Pátria. Do céu, Ela “precede com a sua luz o Povo peregrino como sinal de esperança segura e de conforto, até que chegue o dia do Senhor” 12. “Com o mistério da Assunção aos céus, realizaram-se definitivamente em Maria todos os efeitos da única mediação de Cristo Redentor do mundo e Senhor ressuscitado [...]. No mistério da Assunção, exprime-se a fé da Igreja segundo a qual Maria está unida por um vínculo estreito e indissolúvel a Cristo” 13.

Ela é a certeza e a prova de que os seus filhos estarão um dia com o corpo glorificado junto de Cristo glorioso. A nossa aspiração à vida eterna ganha asas ao meditarmos que a nossa Mãe celeste está lá em cima, que nos vê e nos contempla com o seu olhar cheio de ternura 14, com tanto mais amor quanto mais necessitados nos vê. “Realiza a função, própria da mãe, de medianeira de clemência na vinda definitiva15.

Ela é a nossa grande intercessora junto do Altíssimo. É verdade que a vida na terra se apresenta aos nossos olhos como um vale de lágrimas, porque não nos faltam sacrifícios e sofrimentos, e sobretudo falta-nos o Céu; mas, ao mesmo tempo, o Senhor concede-nos muitas alegrias e temos a esperança da Glória para caminharmos com otimismo. Entre esses motivos de contentamento, sobressai Santa Maria. Ela é vida, doçura e esperança nossa. E os seus olhos, como os do seu Filho, são de misericórdia e compaixão: Esses olhos misericordiosos a nós volvei, dizemos-lhe.

Maria nunca deixa de ajudar os que recorrem ao seu amparo: Nunca se ouviu dizer que algum daqueles que tivesse recorrido à vossa proteção [...] fosse por Vós desamparado 16. Procuremos confiar mais na sua intercessão, persuadidos de que Ela é a Rainha dos céus e da terra, o refúgio dos pecadores, e peçamos-lhe com simplicidade: Mostrai-nos Jesus.

E ponhamo-nos delicada e decididamente ao seu serviço, dispostos a atender aos seus menores desejos, a adivinhá-los até. “Como um instrumento dócil nas mãos do Deus excelso – escreve um Padre da Igreja –, assim desejaria eu estar sujeito à Virgem Maria, integralmente dedicado ao seu serviço. Concede-me esse dom, Jesus, Deus e Filho do homem, Senhor de todas as coisas e Filho da tua Escrava [...]. Faz que eu sirva a tua Mãe de modo que Tu me reconheças por teu servidor; que Ela seja a minha soberana na terra de modo que Tu sejas o meu Senhor por toda a eternidade” 17.

Mas devemos examinar como é o nosso trato diário com Ela. “Se estás orgulhoso de ser filho de Santa Maria, pergunta-te: – Quantas manifestações de devoção a Nossa Senhora tenho durante o dia, da manhã até à noite?” 18: é nos momentos em que rezamos o terço, o Angelus ao meio-dia, as três ave-marias antes de nos deitarmos, que a Virgem nos confidencia o que espera de nós e nos inspira obras de serviço.

III. FELIZES AS ENTRANHAS da Virgem Maria que abrigaram o Filho do Pai eterno 19.

A Assunção de Maria é uma preciosa antecipação da nossa ressurreição e baseia-se na ressurreição de Cristo, que transformará o nosso corpo corruptível, fazendo-o semelhante ao seu corpo glorioso 20. Por isso São Paulo recorda-nos também na segunda Leitura da Missa 21: se a morte veio por um homem (pelo pecado de Adão), também por um homem, Cristo, veio a ressurreição. Por Ele, todos retornarão à vida, mas cada um a seu tempo: como primícias, Cristo; em seguida, quando Ele voltar, todos os que são de Cristo; depois, os últimos, quando Cristo devolver a Deus Pai o seu reino... Essa vinda de Cristo, de que fala o Apóstolo, “não devia por acaso cumprir-se, neste único caso (o da Virgem), de modo excepcional, por dizê-lo assim, «imediatamente», quer dizer, no momento da conclusão da sua vida terrena? [...] Esse final da vida que para todos os homens é a morte, a Tradição, no caso de Maria, chama-o com mais propriedade dormição.

Assumpta est Maria in caelum, gaudent Angeli! Et gaudet Ecclesia! Para nós, a solenidade de hoje é como uma continuação da Páscoa, da Ressurreição e da Ascensão do Senhor. E é, ao mesmo tempo, o sinal e a fonte da esperança da vida eterna e da futura ressurreição” 22.

A Solenidade de hoje enche-nos de confiança nas nossas súplicas. “Subiu aos céus a nossa Advogada para, como Mãe do Juiz e Mãe de Misericórdia, tratar dos negócios da nossa salvação” 23. Ela alenta continuamente a nossa esperança. “Somos ainda peregrinos, mas a nossa Mãe precedeu-nos e indica-nos já o termo do caminho: repete-nos que é possível lá chegarmos, e que lá chegaremos, se formos fiéis. Porque a Santíssima Virgem não é apenas nosso exemplo: é auxílio dos cristãos. E ante a nossa súplica – Monstra te esse Matrem, mostra que és Mãe –, não sabe nem quer negar-se a cuidar dos seus filhos com solicitude maternal [...].

Cor Mariae Dulcissimum, iter para tutum, Coração Dulcíssimo de Maria, dá força e segurança ao nosso caminho na terra: sê tu mesma o nosso caminho, porque tu conheces as vias e os atalhos certos que, por meio do teu amor, levam ao amor de Jesus Cristo” 24.

(1) Gên 3, 15; (2) Apoc 12, 1; Antífona de entrada da Missa de 15 de agosto; (3) Sl 44, 12; Salmo responsorial da Missa do dia 15 de agosto; (4) M. D. Philippe, Mistério de Maria, Rialp, Madrid, 1986, pág. 52; (5) São Germano de Constantinopla, Homilias sobre a Virgem, 1; (6) Pio XII, Const. Munificentissimus Deus, 1-XI-1950; (7) ib.; (8) São Josemaría Escrivá, Santo Rosário, Quarto mistério glorioso; (9) cfr. São Tomás, Suma Teológica, supl., q. 84, a. 1, ad 1; (10) Missal Romano, Prefácio na festa da Assunção; (11) R. A. Knox, Sermão na festividade da Assunção de Nossa Senhora, 15-VIII-1954; (12) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 68; (13) João Paulo II, Enc. Redemptoris Mater, 25-III-1987, n. 41; (14) cfr. Paulo VI, Discurso, 15-VIII-1963; (15) João Paulo II, op. cit.; (16) Oração de São Bernardo; (17) São Ildefonso de Toledo, Livro sobre a virgindade perpétua de Santa Maria, 12; (18) Josemaría Escrivá, Forja, n. 433; (19) cfr. Lc 11, 27; Antífona da Comunhão da Missa vespertina da Vigília; (20) Fil 3, 21; (21) 1 Cor 15, 20-26; Segunda leitura da Missa do dia 15 de agosto; (22) João Paulo II, Homilia, 15-VIII-1980; (23) São Bernardo, Homilia na Assunção da B. Virgem Maria, 1; (24) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, 2ª ed., Quadrante, São Paulo, 1975, ns. 177-178.

Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal


São Tarcísio

15 de Agosto

São Tarcísio

Tarcísio foi um mártir da Igreja dos primeiros séculos, vítima da perseguição do imperador Valeriano, em Roma. A Igreja de Roma contava, então, com 50 sacerdotes, sete diáconos e mais ou menos 50 mil fiéis no centro da cidade imperial. Ele era um dos integrantes dessa comunidade cristã romana, quase toda dizimada pela fúria sangrenta daquele imperador.

Tarcísio era acólito do papa Xisto II, ou seja, era coroinha na igreja, servindo ao altar nos serviços secundários, acompanhando o santo papa na celebração eucarística.

Durante o período das perseguições, os cristãos eram presos, processados e condenados a morrer pelo martírio. Nas prisões, eles desejavam receber o conforto final da Eucaristia, mas era impossível para um sacerdote entrar. Numa das tentativas, dois diáconos, Felicíssimo e Agapito, foram identificados como cristãos e brutalmente sacrificados. O papa Xisto II queria levar o Pão sagrado a mais um grupo de mártires que esperavam a execução, mas não sabia como.

Foi quando Tarcísio pediu ao santo papa que o deixasse tentar, pois não entregaria as hóstias a nenhum pagão. Ele tinha 12 anos de idade. Comovido, o papa Xisto II abençoou-o e deu-lhe uma caixinha de prata com as hóstias. Mas Tarcísio não conseguiu chegar à cadeia. No caminho, foi identificado e, como se recusou a dizer e entregar o que portava, foi abatido e apedrejado até morrer. Depois de morto, foi revistado e nada acharam do sacramento de Cristo. Seu corpo foi recolhido por um soldado, simpatizante dos cristãos, que o levou às catacumbas, onde foi sepultado.

Essas informações são as únicas existentes sobre o pequeno acólito Tarcísio. Foi o papa Dâmaso quem mandou colocar na sua sepultura uma inscrição com a data de sua morte: 15 de agosto de 257.

Tarcísio foi, primeiramente, sepultado junto com o papa Stefano nas catacumbas de Calisto, em Roma. No ano 767, o papa Paulo I determinou que seu corpo fosse transferido para o Vaticano, para a basílica de São Silvestre, e colocado ao lado dos outros mártires. Em 1596 seu corpo foi transferido e colocado definitivamente embaixo do altar principal daquela mesma basílica.

A basílica de São Silvestre é a mais solene do Vaticano. Nela, todos os papas iniciam e terminam seus pontificados. Sem dúvida, o lugar mais apropriado para o comovente protetor da Eucaristia: o mártir e acólito Tarcísio. Ele foi declarado Padroeiro dos Coroinhas ou Acólitos, que servem ao altar e ajudam na celebração eucarística.

Texto: Paulinas Internet


A Benção das Crianças

TEMPO COMUM. DÉCIMA NONA SEMANA. SÁBADO

– O amor de Jesus pelas crianças e pelos que, por serem filhos de Deus, se fazem semelhantes a elas.
– Vida de infância e filiação divina.
– Infância espiritual e humildade.

I. JESUS AMOU COM PREDILEÇÃO assim no‑lo mostra o Evangelho em várias ocasiões – os doentes, os que mais precisavam dEle e as crianças. Quanto a estas, amou‑as com verdadeira ternura porque, além de precisarem sempre de ajuda, possuem as qualidades que Ele exige como condições indispensáveis para se fazer parte do seu Reino.

Em duas ocasiões o Evangelho da vida pública nos mostra Jesus abençoando as crianças e apresentando‑as aos seus discípulos como exemplo. Uma foi na Galiléia, em Cafarnaum, e a outra na Judéia, provavelmente perto de Jericó, quando o Senhor se preparava para subir a Jerusalém. O último desses relatos está contido no Evangelho da Missa de hoje 1: Apresentaram‑lhe umas crianças, diz São Mateus. Quem as levou eram certamente mulheres: as mães, avós ou irmãs. Entraram na casa onde Jesus estava, provavelmente empurrando as crianças para a frente, e puseram‑nas diante do Senhor, para que lhes impusesse as mãos e orasse por elas, como se se tratasse de um gesto habitual de Jesus. Talvez com isso tivessem distraído os ouvintes que escutavam o Mestre, porque diz o Evangelho que os discípulos as repreendiam. Mas o Senhor interveio: Deixai vir a mim as criancinhas, e não as impeçais, porque delas é o reino dos céus. E tendo‑lhes imposto as mãos, partiu dali.

Ao declarar que o Reino dos céus pertence às crianças, o Senhor ensina em primeiro lugar, com o sentido próprio das palavras, que as crianças não estão de maneira nenhuma excluídas do Reino e que, portanto, devemos ter um grande cuidado em prepará‑las e conduzi‑las a Ele. Antes de mais nada, devem ser batizadas quanto antes, como o tem repetido a nossa Mãe a Igreja em todas as épocas 2, pois deseja tê‑las quanto antes no seu seio. “O sentir comum dos Santos Padres – ensina o Catecismo Romano – prova que esta lei deve ser entendida não só em relação aos que já estão na idade adulta, mas também às crianças na infância, e que a Igreja a recebeu por Tradição Apostólica. Deve‑se crer, além disso, que o próprio Cristo Nosso Senhor não quis que fosse negado o sacramento e a graça do batismo às crianças, das quais dizia: Deixai vir a mim as criancinhas e não as impeçais…” 3 O dever dos pais inicia‑se com “a obrigação de fazer com que os filhos sejam batizados nas primeiras semanas de vida” 4.

Nessa passagem do Evangelho, o Senhor diz‑nos também que o seu Reino pertence aos que, como as crianças, têm um olhar limpo e um coração puro, sem complicações nem orgulho: diante de Deus, somos como crianças, e assim devemos comportar‑nos diante dEle. “A criança está, no começo da vida, aberta a qualquer aventura. Também tu; não ponhas nenhum obstáculo para avançar na vida do Evangelho e para continuar durante a tua vida nessa novidade” 5.

II. NA SUA PRIMEIRA VINDA à terra, na Encarnação, o Filho de Deus não se apresentou como um anjo nem como um poderoso; veio sob a débil e frágil condição de uma criança. Embora tivesse podido manifestar‑se de outra forma, preferiu a debilidade de uma criança, como se necessitasse de proteção e amor.

Deus quis que nós, imitando o seu Filho, nos comportássemos como aquilo que somos: filhos débeis, que necessitam continuamente da sua ajuda. O Pai quer que sejamos chamados filhos de Deus, e que o sejamos na realidade6, e nessas poucas palavras está contido um dos pontos centrais da nossa fé, que nos dá a pauta para o nosso comportamento diante de Deus.

Para sermos como crianças, é necessário que nos disponhamos a mudar profundamente, que deixemos de pensar, julgar e agir à maneira das pessoas mais velhas; e que assimilemos o ensinamento divino e nos impregnemos dele com a espontaneidade e a inocência de um filho pequeno, sem os preconceitos, a malícia e as espertezas dos adultos. Para isso, temos de cultivar em primeiro lugar uma firme vontade de nos comportarmos como filhos de Deus, dóceis à sua Vontade, com pureza de mente e de corpo, humildade e simplicidade de espírito.

Fazer‑se semelhante às crianças na vida espiritual é mais do que uma boa devoção: é um querer expresso do Senhor. Ainda que nem todos os santos o tenham manifestado de uma maneira explícita, essa foi a atitude de todos eles, porque o Espírito Santo desperta‑a sempre, inspirando‑nos essa retidão de coração que as crianças possuem na sua inocência 7.

“O menino bobo chora e esperneia, quando a mãe carinhosa lhe espeta um alfinete no dedo para lhe tirar o espinho que se cravou… O menino ajuizado, talvez com os olhos cheios de lágrimas – porque a carne é fraca –, olha agradecido para a sua boa mãe, que o faz sofrer um pouco para evitar maiores males.

“– Jesus, que eu seja menino ajuizado” 8, pedimos‑lhe nestes minutos de oração: que eu saiba compreender que na doença, na dor, no aparente fracasso profissional…, encontra‑se a mão providente de um Pai que nunca deixou de velar pelos seus filhos. Aceitemos com um coração alegre e agradecido tudo o que a vida nos queira oferecer, o doce e o amargo, como enviado ou permitido por quem é infinitamente sábio, por quem mais nos ama.

Esta vida de infância espiritual exige simplicidade, humildade, abandono, mas não é imaturidade. “O menino bobo chora e esperneia…”: o infantilismo é falta de maturidade da mente, do coração, das emoções, e está intimamente ligado à falta de auto‑disciplina, à falta de luta. É uma atitude que pode acompanhar as pessoas durante toda a vida, até à velhice, até à morte, impedindo‑as de ser verdadeiramente crianças diante de Deus.

A verdadeira infância espiritual traz consigo maturidade na mente – que é ponderar os acontecimentos à luz da fé e com a assistência dos dons do Espírito Santo – e, juntamente com essa maturidade, a simplicidade, a descomplicação: “O menino ajuizado olha agradecido…”

Por contraste, não progride no caminho de infância quem vive na maranha da complicação, com todas as flutuações da imaturidade nos seus desejos, nas suas idéias, nas suas imaginações, com uma conduta variável a cada momento. Esse está permanentemente preocupado com o seu “eu”…, que é a única coisa que lhe importa, ao contrário do menino ajuizado que, na sua simplicidade e na sua fraqueza, está totalmente ocupado na glória de seu Pai‑Deus, tal como viveu sempre o seu Mestre aqui na terra: a verdadeira criança, o verdadeiro filho, vive e fala com seu Pai 9.

III. A NOSSA PIEDADE deve estar impregnada de amor, e como poderíamos amar se não começássemos por reconhecer o Senhor como um Pai cheio de amor para com os seus filhos pequenos? Talvez muitos cristãos vivam afastados de Deus ou mantenham com Ele umas relações dificultadas pela imaturidade dos seus caprichos, ou marcadas pela rigidez e pela frieza, por não terem descoberto nas suas vidas o sentido da filiação divina e o caminho da infância espiritual, que para tantas almas foi o começo definitivo de uma verdadeira vida interior.

Em verdade vos digo: Quem não receber o reino de Deus como uma criança não entrará nele10. “Por que se diz – pergunta Santo Ambrósio – que as crianças são aptas para o Reino dos céus? Talvez porque geralmente não têm malícia, não sabem enganar nem se atrevem a enganar‑se; desconhecem a luxúria, não desejam as riquezas e ignoram a ambição. Mas a virtude de tudo isto não consiste no desconhecimento do mal, mas na sua repulsa; não consiste na impossibilidade de pecar, mas em não consentir no pecado. Por conseguinte, o Senhor não se refere à infância como tal, mas à inocência que as crianças possuem na sua simplicidade” 11.

Na vida cristã, a maturidade dá‑se precisamente quando nos fazemos crianças diante de Deus, filhos pequenos que confiam e se abandonam nEle como uma criança se abandona nos braços de seu pai. Então encaramos os acontecimentos do mundo como são, no seu verdadeiro valor, e não temos outra preocupação fora a de agradar ao nosso Pai e Senhor.

A vida de infância espiritual é um caminho que exige a virtude sobrenatural da fortaleza para vencer os ímpetos do orgulho e da auto‑suficiência, todos esses movimentos interiores que, à vista dos nossos fracassos, nos podem levar ao desalento, à aridez e à solidão. A piedade filial, pelo contrário, fortalece a esperança, a certeza de chegar à meta, e dá‑nos paz e alegria nesta vida. Perante as dificuldades da vida, não nos sentiremos nunca sozinhos. O Senhor não nos abandona, e esta confiança será para nós como a água para o viajante no deserto. Sem ela, não poderíamos prosseguir viagem.

Peçamos à Virgem, nossa Mãe, que nos segure sempre pela mão, como aos filhos pequenos, com tanto mais cuidado quanto maiores forem a maturidade humana e a experiência que os anos nos forem dando.

(1) Mt 19, 13‑15; (2) cfr. S. C. para a doutrina da fé, Instrução sobre o batismo das crianças, 20‑X‑1980; (3) Catecismo Romano, II, 2, 32; (4) Código de Direito Canônico, can. 867, 1; (5) Ch. Lubich, Palabras para vivir, Ciudad Nueva, Madrid, 1981, pág. 47; (6) 1 Jo 3, 1; (7) cfr. B. Perquin, Abba, Padre, pág. 142; (8) Josemaría Escrivá, Forja, n. 329; (9) cfr. B. Perquin, op. cit., pág. 143; (10) Lc 18, 17; (11) Santo Ambrósio, Comentário ao Evangelho de São Lucas, 18, 17.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal


São Maximiliano Maria Kolbe

14 de Agosto

São Maximiliano Maria Kolbe

“Por Jesus Cristo estou disposto a qualquer tipo de sofrimento. A Imaculada está comigo e ela me ajuda”, costumava dizer São Maximiliano Kolbe, sacerdote que morreu mártir em um campo de concentração nazista e cujo memória litúrgica a Igreja celebra neste dia 14 de agosto.

São Maximiliano Maria Kolbe nasceu na Polônia em 8 de janeiro de 1894 na cidade da Zdunska Wola, que naquele tempo estava ocupada pela Rússia. Foi batizado com o nome Raimundo, na Igreja paroquial. Aos 13 anos, ingressou no seminário franciscano da Ordem dos Frades Menores Conventuais, na cidade polonesa do Lvov, a qual, por sua vez, estava ocupada pela Áustria. No seminário, adotou o nome de Maximiliano. Finalizou seus estudos em Roma e em 1918 foi ordenado sacerdote.

Devoto da Imaculada Conceição, pensava que a Igreja devia ser militante em sua colaboração com a Graça Divina para o avanço da Fé Católica. Movido por esta devoção e convicção, fundou em 1917 um movimento chamado “Milícia da Imaculada”, cujos membros se consagrariam à Bem-aventurada Virgem Maria e teriam o objetivo de lutar mediante todos os meios moralmente válidos, pela construção do Reino de Deus em todo mundo.

Verdadeiro apóstolo moderno, iniciou a publicação da revista mensal “Cavaleiro da Imaculada”, orientada a promover o conhecimento, o amor e o serviço à Virgem Maria na tarefa de converter almas para Cristo. Com uma tiragem de 500 exemplares em 1922, alcançou cerca de 1 milhão de exemplares em 1939.

Em 1929, fundou a primeira “Cidade da Imaculada”, no convento franciscano de Niepokalanów a 40 quilômetros de Varsóvia, que no passar do tempo se converteria em uma cidade consagrada à Virgem.

Em 1931, logo após o Papa solicitar missionários, ofereceu-se como voluntário. Em 1936, retornou à Polônia como diretor espiritual do Niepokalanów e, três anos mais tarde, em plena Guerra Mundial, foi preso junto com outros frades e enviado a campos de concentração na Alemanha e Polônia. Foi liberado pouco tempo depois, precisamente no dia consagrado à Imaculada Conceição.

Foi feito prisioneiro novamente em fevereiro de 1941 e enviado à prisão de Pawiak, para ser transferido em seguida ao campo de concentração de Auschwitz, onde, apesar das terríveis condições de vida, prosseguiu seu ministério.

Em Auschwitz, o regime nazista procurava despojar os prisioneiros de todo rastro de personalidade, tratando-os de maneira desumana e impessoal, como um número; a São Maximiliano, atribuíram o número 16670. Apesar de tudo, durante sua estadia no campo, nunca abandonou sua generosidade e preocupação com os demais, assim como seu desejo de manter a dignidade de seus companheiros.

Em agosto do mesmo ano, 1941, um prisioneiro conseguiu fugir de Auschwitz. Por causa disso, os soldados alemães, furiosos, impingiram uma punição terrível aos outros prisioneiros: sortearam dez presos para serem mortos de maneira cruel. Um dos dez sorteados era Francisco Gajowniczek. Quando soube de sua triste sorte, começou a chorar e clamar em voz alta, afirmando ter esposa e filhos para criar. Nesse momento, São Maximiliano Maria Kolbe pediu ao comandante alemão para ir no lugar de Francisco. O comandante concordou.

Os soldados alemães despiram, então, São Maximiliano Maria Kolbe e os outros nove. Depois, prenderam-nos numa cela escura, húmida e pequena. Ali os dez prisioneiros ficaram sem água e sem alimentos, para morrerem aos poucos. 

Dez dias depois de sua condenação e ao encontrá-lo ainda vivo, os nazistas lhe deram uma injeção letal em 14 de agosto de 1941. Em 1973, o Papa Paulo VI o beatificou e, em 1982, São João Paulo II o canonizou como Mártir da Caridade.

Fonte: https://www.acidigital.com