TEMPO COMUM. VIGÉSIMO NONO DOMINGO. ANO B

– A vida cristã consiste em imitar Cristo.
– Jesus nos ensina com a sua vida que não veio para ser servido, mas para servir. Imitá-lo.
– Servir com alegria.

I. COMO O DISCÍPULO diante do mestre, como o menino junto da sua mãe, assim deve estar o cristão em todas as suas ocupações diante de Cristo. O filho aprende a falar ouvindo a sua mãe, esforçando-se por copiar as suas palavras; da mesma forma, vendo Jesus fazer e agir, aprendemos a conduzir-nos como Ele. A vida cristã consiste na imitação da do Mestre, pois Ele se encarnou deixando-vos o exemplo, para que sigais os seus passos1. São Paulo exortava os primeiros cristãos a imitarem o Senhor com estas palavras: Tende entre vós os mesmos sentimentos que teve Cristo Jesus2. Ele é a causa exemplar de toda a santidade, isto é, do amor a Deus Pai. E isto não só pelas suas obras, mas pelo seu ser, pois o seu modo de agir era a expressão externa da sua união com o Pai, do seu amor por Ele.

A nossa santidade não consiste tanto numa imitação externa de Jesus, mas em permitir que o nosso ser mais profundo se vá configurando com Cristo. Despojai-vos do homem velho com todas as suas obras e revesti-vos do homem novo…3, recomendava São Paulo aos Colossenses.

Esta renovação diária significa limar constantemente os nossos costumes, expurgar da nossa vida os defeitos humanos e morais, suprimir o que não combina com a vida de Cristo… Mas significa sobretudo procurar que os nossos sentimentos sobre os homens, sobre as realidades criadas, sobre a tribulação, se pareçam cada dia mais com os que teve Jesus em circunstâncias semelhantes, de tal maneira que a nossa vida seja em certo sentido um prolongamento da sua, pois Deus nos predestinou para sermos conformes com a imagem do seu Filho4.

A própria graça divina, na medida em que correspondemos à ação contínua do Espírito Santo, vai acentuando a nossa semelhança com Cristo. Seremos santos se Deus Pai puder afirmar de nós o que um dia disse do seu Filho: Este é meu filho bem-amado, em quem pus as minhas complacências5. A nossa santidade consistirá, pois, em sermos pela graça o que Cristo é por natureza: filhos de Deus.

O Senhor é tudo para nós. “Esta árvore é para mim uma planta de salvação eterna; dela me alimento, dela me sacio. Pelas suas raízes eu me enraízo, e pelos seus ramos eu me estendo; a sua sombra alegra-me e o seu espírito, como vento delicioso, fertiliza-me. À sua sombra levantei a minha tenda, e, fugindo dos grandes calores, ali encontro um abrigo cheio de frescor. As suas folhas são a minha defesa, os seus frutos a minha perfeita delícia, e eu saboreio livremente os seus frutos, que me estavam reservados desde o princípio. Ele é o meu alimento na fome, na sede a minha fonte e na nudez o meu vestido, pois as suas folhas são espírito de vida. Quando temo a Deus, Ele é a minha proteção; e quando vacilo, o meu apoio; quando combato, o meu prêmio; e quando triunfo, o meu troféu”6. Nada desejo fora dEle.

II. O EVANGELHO DA MISSA7 relata-nos o episódio em que Tiago e João pedem a Jesus que lhes reserve os dois lugares de maior honra no seu Reino. Ao ouvi-los, os demais Apóstolos começaram a indignar-se contra eles. Jesus disse-lhes então: Vós sabeis que os que são reconhecidos como soberanos das nações as dominam; e que os seus príncipes lhes fazem sentir o seu poder. Porém, entre vós não deve ser assim, mas o que quiser ser grande faça-se vosso servo; e o que entre vós quiser ser o primeiro faça-se escravo de todos. E dá-lhes a razão suprema: Porque o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em redenção de muitos.

Em diversas ocasiões o Senhor proclamará que não veio para ser servido, mas para servir: Non veni ministrari sed ministrare8. Toda a sua vida foi um serviço contínuo e a sua doutrina é um apelo constante aos homens para que se esqueçam de si próprios e se dêem aos outros. Percorreu os caminhos da Palestina servindo a cada um – impondo as mãos a cada um9 – dos que encontrava à sua passagem. Permaneceu para sempre na sua Igreja – e de modo particular na Sagrada Eucaristia – para nos servir diariamente com a sua companhia, com a sua humildade, com a sua graça. Na noite anterior à sua Paixão e Morte, querendo ensinar algo de suma importância, e para que ficasse sempre clara esta característica essencial do cristão, lavou os pés aos seus discípulos, para que eles fizessem também o mesmo10.

A Igreja, continuadora da missão salvífica de Cristo no mundo, tem como tarefa principal servir os homens pela pregação da palavra e pela celebração dos sacramentos. Além disso, “participando das melhores aspirações dos homens e sofrendo por não os ver felizes, deseja ajudá-los a conseguir o seu pleno desenvolvimento, e isto precisamente porque lhes propõe o que ela possui como próprio: uma visão global do homem e da humanidade”11.

Nós, os cristãos, que queremos imitar o Senhor, temos que dispor-nos a fazer da vida um serviço alegre a Deus e aos outros, sem esperar nada em troca; dispor-nos a servir mesmo aos que não agradecerão o serviço que lhes prestarmos.

Haverá ocasiões em que muitos não entenderão esta atitude de disponibilidade alegre; bastar-nos-á então saber que Cristo a entende e nos acolhe como verdadeiros discípulos seus. O “orgulho” do cristão será precisamente este: servir como Jesus serviu. Mas só aprenderemos a dar-nos, a estar disponíveis quando estivermos perto de Jesus.

“Ao empreenderes cada jornada para trabalhar junto de Cristo e atender tantas almas que o procuram, convence-te de que não há senão um caminho: recorrer ao Senhor. Somente na oração, e com a oração, aprendemos a servir os outros!”12

É da oração que obteremos as forças e a humildade necessárias para fazermos da vida um serviço.

III. O NOSSO SERVIÇO a Deus e aos outros deve estar impregnado de humildade, mas vez por outra pode caber-nos a honra de levar Cristo aos outros, como a coube ao burrinho sobre o qual Jesus entrou em Jerusalém13. Então, mais do que nunca, temos de estar dispostos a purificar a intenção, se for preciso. “Quando me elogiam – escreveu aquele que mais tarde seria João Paulo I –, experimento a necessidade de comparar-me com o jumento que levava Cristo no dia de Ramos. E digo de mim para mim: «Como teriam rido do burro se, ao escutar os aplausos da multidão, tivesse ficado cheio de soberba e tivesse começado – asno como era – a acenar agradecimentos à direita e à esquerda!… Não vás tu cair em semelhante ridículo…!»”14 A nossa disponibilidade para as necessidades alheias deve levar-nos a ajudar os outros de tal forma que, sempre que seja possível, não o percebam e assim não possam dar-nos nenhuma recompensa em troca, nem sequer um sorriso esboçado. Basta-nos o olhar de Jesus sobre a nossa vida. Já é suficiente recompensa!

O serviço deve ser alegre, como nos recomenda a Sagrada Escritura: Servi o Senhor com alegria15, especialmente nos trabalhos da convivência diária que possam ser mais difíceis ou ingratos e que costumam ser com freqüência os mais necessários. A vida compõe-se de uma série de serviços mútuos diários. Procuremos exceder-nos nessas tarefas, mostrando-nos sempre alegres e desejosos de ser úteis. Encontraremos muitas ocasiões de serviço no exercício da profissão, na vida familiar…, com parentes, amigos, conhecidos, e também com as pessoas que nunca mais voltaremos a ver. Quando somos generosos na nossa entrega aos outros, sem indagar se a merecem ou não, sem ficar muito preocupados se não nos agradecem…, compreendemos que “servir é reinar”16.

Aprendamos de Nossa Senhora a ser úteis aos outros, a pensar nas suas dificuldades, a facilitar-lhes a vida aqui na terra e o seu caminho para o Céu. Ela nos dá exemplo: “No meio do júbilo da festa, em Caná, apenas Maria repara na falta de vinho… Até aos menores detalhes de serviço chega a alma se, como Ela, vive apaixonadamente pendente do próximo, por Deus”17.

Então encontramos facilmente Jesus, que vem ao nosso encontro e nos diz: Todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes18.

(1) 1 Pe 2, 21; (2) Fil 2, 5; (3) Col 3, 9; (4) Rom 8, 29; (5) Mt 3, 17; (6) Santo Hipólito, Homilia de Páscoa; (7) Mc 10, 35-45; (8) Mt 20, 8; (9) Lc 4, 40; (10) cfr. Jo 13, 4 e segs.; (11) Paulo VI, Carta Encíclica Populorum progressio, 26.03.67, 13; (12) Bem-aventurado Josemaría Escrivá, Forja, n. 72; (13) cfr. Lc 19, 35; (14) Albino Luciani, Ilustríssimos senhores, pág. 59; (15) Sl 99, 2; (16) cfr. João Paulo II, Carta Encíclica Redemptor hominis, 4.03.79; (17) Bem-aventurado Josemaría Escrivá, Sulco, n. 631; (18) Mt 25, 40.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal