TEMPO DO ADVENTO. SEGUNDA SEMANA. TERÇA-FEIRA

– Confissão dos pecados e propósito de emenda. Confissão individual, auricular e completa.
– Diante do próprio Jesus Cristo. Confissão freqüente.
– Cada confissão, um bem para toda a Igreja. A Comunhão dos Santos e o sacramento da Penitência.

I. UMA VOZ CLAMA no deserto: preparai um caminho para o Senhor, aplainai na estepe um caminho para o nosso Deus. Todo o vale seja preenchido; todo o monte ou outeiro, rebaixado; o solo eriçado mude-se em plano, e as escabrosidades em solo liso1.

O melhor modo de prepararmos a alma para o Senhor que chega é prepararmos muito bem as nossas confissões. A necessidade deste sacramento, fonte de graça e misericórdia ao longo de toda a nossa vida, manifesta-se especialmente neste tempo em que a liturgia da Igreja nos anima a esperar o Natal. Ela nos ajuda a rezar pedindo: Ó Deus, que enviastes a este mundo o vosso Unigênito para libertar da antiga escravidão o gênero humano, concedei que cheguem à verdadeira liberdade aqueles que esperam a vossa misericórdia2.

A Confissão é também, com a Sagrada Eucaristia, o sacramento que nos prepara para o encontro definitivo com Cristo no final da nossa existência. Toda a nossa vida é um contínuo advento, uma espera do último instante para o qual não deixamos de preparar-nos dia após dia. Consola-nos pensar que é o próprio Senhor quem deseja ardentemente que estejamos com Ele na nova terra e no novo céu que nos preparou3.

Cada confissão bem feita é um impulso que recebemos de Deus para continuar a caminhar, sem desânimos, sem tristezas, livres das nossas misérias.

E Cristo nos diz novamente: Tem confiança, os teus pecados te são perdoados4; volta a começar… É Ele próprio quem nos perdoa depois da humilde manifestação das nossas culpas. Confessamos os nossos pecados “ao próprio Deus, ainda que quem os escuta no confessionário seja o homem-sacerdote. Este homem é o humilde e fiel servidor desse grande mistério que se realiza entre o filho que retorna e o Pai”5.

“As causas do mal não devem ser procuradas no exterior do homem, mas sobretudo no interior do seu coração. E o seu remédio também parte do coração. Por conseguinte, os cristãos, mediante a sinceridade no seu empenho por converter-se, devem insurgir-se contra o achatamento do homem e proclamar com a sua própria vida a alegria da verdadeira libertação do pecado […] mediante um sincero arrependimento, um firme propósito de emenda e uma firme confissão das culpas”6.

Para aqueles que caíram em pecado mortal depois de batizados, este sacramento é tão necessário para a salvação como o é o Batismo para os que ainda não foram regenerados para a vida sobrenatural: “É o meio de saciar o homem com a justiça que provém do próprio Redentor”7. E é tal a sua importância para a Igreja que “os sacerdotes podem ver-se obrigados a adiar ou mesmo deixar outras atividades por falta de tempo, mas nunca o confessionário”8.

Todos os pecados mortais cometidos depois do batismo, bem como as circunstâncias que modifiquem a sua espécie, devem passar pelo tribunal da Penitência, numa confissão auricular e secreta, com absolvição individual.

O Santo Padre pede-nos que façamos tudo o que estiver ao nosso alcance “para ajudar a comunidade eclesial a apreciar plenamente o valor da confissão individual como um encontro pessoal com o Salvador misericordioso que nos ama, e a ser fiel às diretrizes da Igreja num assunto de tanta importância”9.

“Não podemos esquecer que a conversão é um ato interior de especial profundidade, em que o homem não pode ser substituído por outros, não pode fazer-se representar pela comunidade”10.

II. ALÉM DE SER completa no que se refere aos pecados graves, a confissão tem de ser sobrenatural: conscientes de que vamos pedir perdão ao próprio Deus, a quem ofendemos, pois todos os pecados, incluídos aqueles que se referem aos nossos irmãos, são ofensa direta a Deus.

A confissão feita com sentido sobrenatural é um verdadeiro ato de amor a Deus. Ouve-se na intimidade da alma a voz do próprio Cristo que diz, como a Pedro: Simão, filho de João, tu me amas? E com as mesmas palavras deste Apóstolo podemos também nós dizer-lhe: Domine, tu omnia nosti, tu scis quia amo te11, Senhor, Tu sabes todas as coisas, Tu sabes que eu te amo…, apesar de tudo.

Depois do pecado mortal, a maior desgraça que nos pode acontecer é o pecado venial, pois nos priva de muitas graças atuais.

Cada pequena infidelidade é um grande tesouro perdido: diminui o fervor da caridade; aumenta as dificuldades na prática das virtudes, que cada vez nos hão de parecer mais inacessíveis; e inclina ao pecado mortal, que acabará por chegar se não se reage com prontidão.

A comunhão e a confissão freqüentes são a melhor arma na luta por evitar os pecados veniais. Além disso, cada confissão obtém-nos graças específicas para evitarmos os defeitos e pecados de que nos acusamos e arrependemos. Amar a confissão freqüente é sintoma de finura de alma, de amor a Deus; desprezá-la ou olhá-la com indiferença é falta de delicadeza interior e, freqüentemente, verdadeiro endurecimento em relação aos bens espirituais.

A freqüência da confissão depende das necessidades de cada alma em particular. Quando uma pessoa está seriamente determinada a cumprir a vontade de Deus em tudo e a ser inteiramente de Deus, tem verdadeira necessidade de recorrer a este sacramento com mais freqüência e pontualidade: “A confissão renovada periodicamente, chamada de «devoção», sempre acompanhou na Igreja o caminho da santidade”12.

III. A RECONCILIAÇÃO de cada homem com Deus e com a Igreja no sacramento da Penitência é um dos seus atos mais íntimos e pessoais. Muitas coisas fundamentais mudam no santuário da consciência em cada confissão. E como este sacramento tem uma profunda e inseparável dimensão social, muitas coisas mudam também no âmbito familiar, no estudo, no trabalho, no relacionamento com os amigos, etc.

O pecado, porque é a maior tragédia que pode existir para um homem, produz um profundo desequilíbrio em quem o comete. E quem está desequilibrado, desequilibra também os que tem à sua volta. No sacramento da Confissão, o Senhor coloca de novo as coisas no seu lugar; além de perdoar o pecado, introduz na alma a ordem e a harmonia perdidas.

Uma confissão bem feita é, pois, um grande presente a todos aqueles que convivem e trabalham conosco. Todas as nossas coisas passam a ser ditas e feitas de uma forma muito diferente. Além disso, causamos um bem incalculável a toda a Igreja. Toda ela se alegra e se enriquece misteriosamente de cada vez que o sacerdote pronuncia as palavras da absolvição. Pela Comunhão dos Santos, cada confissão tem as suas ressonâncias benfazejas em todo o Corpo Místico de Cristo.

Na vida íntima da Igreja – de que Cristo é a pedra angular –, cada fiel sustenta os outros com as suas boas obras e merecimentos, e ao mesmo tempo é sustentado por eles. Todos necessitamos uns dos outros e, na verdade, todos participamos continuamente dos bens espirituais comuns. Os nossos méritos ajudam os nossos irmãos, os homens espalhados por toda a terra; e, em sentido contrário, o pecado, a tibieza, os pecados veniais, o aburguesamento, são lastro para todos os membros da Igreja peregrina: Se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e se um membro é honrado, todos os membros se alegram com ele13.

“Esta é a outra face daquela solidariedade que, em nível religioso, se desenvolve no mistério profundo e magnífico da Comunhão dos Santos, graças à qual se pôde dizer que «toda a alma que se eleva, eleva o mundo». A esta lei da elevação corresponde, infelizmente, a lei da descida, de tal forma que se pode falar de uma comunhão do pecado, pela qual uma alma que se rebaixa pelo pecado rebaixa consigo a Igreja e, de certo modo, o mundo inteiro. Por outras palavras, não existe pecado algum, mesmo o mais íntimo e secreto, o mais estritamente individual, que afete exclusivamente aquele que o comete. Todo o pecado repercute, com maior ou menor intensidade, com maior ou menor dano, em todo o conjunto eclesial e em toda a família humana”14.

Quando alguém se aproxima com boas disposições do sacramento da Confissão, não é só o penitente que experimenta um momento de alegria, mas todos… E quando encontra a dracma, chama as suas amigas e vizinhas e diz-lhes: Alegrai-vos comigo15. Os bem-aventurados do céu, as benditas almas do purgatório e a Igreja que ainda peregrina neste mundo alegram-se de cada vez que se dá uma absolvição.

“Desatar” os vínculos do pecado é ao mesmo tempo atar os nós da fraternidade. Não deveríamos recorrer a este sacramento com mais alegria e com mais prontidão, sabendo que, pelo simples fato de nos confessarmos bem, estamos ajudando tantos e tantos cristãos e especialmente aqueles que estão mais próximos de nós?

Peçamos a Deus com a Igreja: Consolados pela vinda do vosso Filho, sejamos purificados da antiga culpa16.

(1) Is 40, 1-11; (2) Oração da Missa do sábado da primeira semana do Advento; (3) Apoc 21, 1; (4) Mt 9, 2; (5) João Paulo II, Homilia na paróquia de Santo Inácio de Antioquia, Roma, 16-III-1980; (6) cfr. João Paulo II, Homilia, Roma, 5-IV-1979; (7) João Paulo II, Enc. Redemptor hominis, 20; (8) João Paulo II, Roma, 17-XI-1978; (9) João Paulo II, Alocução, Tóquio, 23-II-1981; (10) João Paulo II, Enc. Redemptor hominis, 20; (11) Jo 21, 17; (12) João Paulo II, Alocução, 30-I-1981; (13) 1 Cor 12, 26; (14) João Paulo II, Exortação apostólica Reconciliatio et Paenitentia, 2-XII-1984, 16; (15) Lc 15, 19; (16) Oração da Missa da terça-feira da primeira semana do Advento.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal