TEMPO COMUM. VIGÉSIMA SÉTIMA SEMANA. QUINTA-FEIRA

– Modo de santificar o nome de Deus. O primeiro pedido do Pai-Nosso.
– O Reino de Deus.
– A propagação do Reino dos Céus.

I. “QUANDO CHEGARMOS à dignidade de filhos de Deus, seremos abrasados pela ternura que habita no coração de todos os filhos verdadeiros; e, sem pensar mais nos nossos interesses pessoais, só teremos zelo pela glória do nosso Pai. Dir-lhe-emos: Santificado seja o vosso nome, testemunhando assim que a sua glória constitui todo o nosso desejo e a nossa alegria” 1.

Nesta primeira petição das sete de que se compõe o Pai-Nosso, “pedimos que Deus seja conhecido, amado, honrado e servido por todos e por nós em particular”2. Jesus ensina-nos a ordem que devemos seguir habitualmente nas nossas súplicas. A primeira coisa que devemos pedir é a glória de Deus.

É realmente o mais urgente, também para nós, que andamos preocupados com as necessidades imediatas. “Ocupa-te de Mim – dizia Jesus a Santa Catarina de Sena –, e Eu me ocuparei de ti”. O Senhor não nos deixará sozinhos.

Santificado seja o vosso nome. Na Sagrada Escritura, o nome de uma pessoa equivale à própria pessoa; é a sua identidade mais profunda. Por isso Jesus dirá no final da sua vida, como que resumindo os seus ensinamentos: Manifestei o teu nome aos homens3. Revelou-nos o mistério de Deus.

No Pai-Nosso, formulamos o desejo amoroso de que o nome de Deus, do nosso Pai-Deus, seja conhecido e reverenciado em toda a terra; e também devemos expressar a nossa dor pelas ocasiões em que é profanado, silenciado ou proferido com leviandade: “Ao dizermos santificado seja o vosso nome, admoestamo-nos a nós mesmos para que desejemos que o nome do Senhor, que sempre é santo em si mesmo, seja também tido como santo por todos os homens, quer dizer, que nunca seja desprezado por eles”4.

Em determinados ambientes, parece que os homens não querem mencionar o nome de Deus. Em vez do Criador, falam da “sábia natureza” ou chamam “destino” à Providência divina, etc. Por vezes, são somente modos de dizer, mas há ocasiões em que se silencia o nome de Deus intencionalmente. Nesses casos, devemos vencer possíveis respeitos humanos e, também intencionalmente, honrar o nosso Pai. Sem afetação, manter-nos-emos fiéis aos modos cristãos de falar, que manifestam externamente a fé da nossa alma. As expressões tradicionais em muitos países, tais como “graças a Deus” ou “se Deus quiser”5, etc., podem servir de ajuda em algumas ocasiões para termos presente o Senhor nas nossas conversas.

Isto não significa que devamos ser como essas pessoas que fazem intervir o nome de Deus em qualquer coisa, de modo inconsiderado e inoportuno (“Deus o castigou…”). O segundo preceito do Decálogo proíbe-nos que tomemos o nome de Deus em vão. Se amamos a Deus, amaremos o seu santo nome e nunca o mencionaremos com falta de respeito ou de reverência, como expressão de impaciência ou de surpresa. Este amor ao nome de Deus estender-se-á também ao de Santa Maria, sua Mãe, ao dos seus amigos, os Santos, e ao de todas as pessoas e coisas que lhe estão consagradas.

Honramos a Deus no nosso coração quando fazemos um ato de reparação sempre que, na nossa presença, se falta ao respeito devido ao nome de Deus ou de Jesus Cristo; ao sabermos que se cometeu um sacrilégio ou ao termos notícia de algum episódio que ofende o bom nome do Pai comum. Não devemos também esquecer-nos de atualizar pessoalmente os atos de reparação e desagravo públicos sempre que nos unimos aos louvores que se rezam na Bênção com o Santíssimo. Nessa ocasião, o sacerdote, em nome de todos, reza: Bendito seja Deus, bendito seja o seu santo nome… São jaculatórias que podemos repetir ao longo do dia, especialmente em face de situações em que temos o dever de reparar.

“Considerai – diz Santa Teresa – que ganhais um grande tesouro e que fazeis muito mais dizendo uma só palavra do Pai-Nosso de quando em quando, do que repetindo-o muitas vezes apressadamente. Permanecei bem junto dAquele a quem pedis, e não deixará de ouvir-vos; e crede, o verdadeiro modo de louvar e santificar o seu nome é este”6.

Talvez algumas dessas jaculatórias nos possam ajudar a manter a presença de Deus no dia de hoje: Pai, santificado seja o vosso nome…

II. VENHA A NÓS o vosso Reino, pedimos a seguir no Pai-Nosso. São João Crisóstomo comenta que o Senhor “nos mandou que desejássemos os bens que estão por chegar e que apressássemos o passo na nossa viagem para o Céu; mas, enquanto a viagem não termina, vivendo ainda na terra, quer que nos esforcemos por levar vida do Céu”7.

A expressão Reino de Deus tem um triplo significado: o Reino de Deus em nós, que é a graça; o Reino de Deus na terra, que é a Igreja; e o Reino de Deus no Céu, que é a eterna bem-aventurança.

Em primeiro lugar, pedimos a Deus que reine em nós mediante a graça santificante, pela qual se compraz em cada um de nós como um rei na sua corte; e que nos conserve unidos a Si por meio das virtudes da fé, da esperança e da caridade, que lhe permitem reinar respectivamente no nosso entendimento, no nosso coração e na nossa vontade8.

Ao rezarmos diariamente pela chegada do Reino de Deus, pedimos também que o Senhor nos ajude a ser fiéis à graça. É um reinado, o de Jesus na nossa alma, que avança ou retrocede conforme correspondemos ou rejeitamos as contínuas graças e ajudas que Ele nos concede.

 

Cumprem-se também nos nossos corações as parábolas do Reino. Antes de adquirir a plenitude definitiva na alma de cada um dos fiéis, o Reino de Deus é como um grão de trigo que, enterrado, prepara a espiga da colheita; como o fermento, que vai transformando o coração até que seja inteiramente de Deus; como o grão de mostarda, que começa como uma pequena semente na alma e, se não levantamos obstáculos, irá crescendo sem mais limites que o das nossas resistências e negações. O Reino de Deus estabelece-se agora, pela graça, no coração dos homens; está dentro de vós, disse Jesus9. E percebemos a sua presença na alma através dos afetos e moções do Espírito Santo. Se soubermos corresponder-lhes dócil e prontamente, o Senhor tomará posse das nossas almas e o seu Reino será uma realidade em nós. “Antes éramos servos no mundo, agora reinemos sob o domínio de Cristo”10.

III. QUANDO REZAMOS venha a nós o vosso reino, também pedimos que a Igreja se dilate e propague por todo o mundo para a salvação dos homens.

Pedimos pelo apostolado que se realiza em toda a terra, e sentimo-nos comprometidos a empregar todos os meios ao nosso alcance para a expansão do Reino de Deus. Porque “não é suficiente pedirmos com insistência o Reino de Deus se não acrescentamos à nossa petição todas aquelas coisas com que se procura e se encontra”11, isto é, as nossas iniciativas apostólicas, por pequenas que nos pareçam.

Num mundo que em não poucos aspectos parece ter retornado ao paganismo, impõe-se a todos os cristãos “o dever luminoso de colaborar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e acolhida por todos os homens em toda a parte”12.

A nossa primeira obrigação é, ordinariamente, orientar o apostolado para todos aqueles que Deus colocou ao nosso lado: a esposa ou o marido, cada um dos filhos, os amigos, os colegas. Neste apostolado com essas pessoas, do qual não podemos esquivar-nos sob nenhum pretexto, o que nos deve importar acima de tudo é que tomem a sério a vida cristã, que entrem por caminhos de vida interior, de oração, de freqüência dos Sacramentos, que adquiram uma sólida formação doutrinal-religiosa. Isto é o mais importante.

Depois, temos de nos preocupar por orientar todo o universo para Cristo, cada um na medida das suas possibilidades. A dignidade da pessoa humana, os direitos da consciência, o respeito devido ao trabalho, a preocupação por uma distribuição mais eqüitativa dos bens, o sincero desejo de paz entre os povos, etc., são tarefa que incumbe a todos os cristãos e a que todos podem prestar a sua colaboração, seja grande ou pequena. Deus conta com esse muito ou pouco de cada um.

Venha a nós o vosso Reino. E “Jesus Cristo recorda a todos: Et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum (Jo 12, 32), se vós me colocardes no cume de todas as atividades da terra, cumprindo o dever de cada instante, dando testemunho de mim no que parece grande e no que parece pequeno, omnia traham ad meipsum, tudo atrairei a mim. O meu reino entre vós será uma realidade […].

“Foi para isso que nós, os cristãos, fomos chamados, essa é a nossa tarefa apostólica e a preocupação que deve consumir a nossa alma: conseguir que o reino de Cristo se torne realidade, que não haja mais ódios nem crueldades, que estendamos pela terra o bálsamo forte e pacífico do amor. Peçamos hoje ao nosso Rei que nos faça colaborar humilde e fervorosamente com o propósito divino de unir o que se quebrou, de salvar o que está perdido, de ordenar o que o homem desordenou, de levar a seu termo o que se extraviou, de reconstruir a concórdia entre todas as coisas criadas”13. Comecemos, como sempre, pelo que está ao nosso alcance na convivência normal de todos os dias.

(1) Cassiano, Colações, 9, 18; (2) Catecismo maior, n. 290; (3) Jo 17, 6; (4) Santo Agostinho, Carta 130, a Proba; (5) Ti 4, 15; (6) Santa Teresa, Caminho de perfeição, 31, 13; (7) São João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 19, 5; (8) cfr. Catecismo maior, ns. 294-295; (9) Lc 17, 21; (10) São Cipriano, Tratado sobre a oração do Senhor, 13; (11) Catecismo Romano, IV, 10, n. 2; (12) Concílio Vaticano II, Decreto Apostolicam actuositatem, 3; (13) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 183.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal