TEMPO COMUM. DÉCIMA SÉTIMA SEMANA. SEGUNDA‑FEIRA

– Os cristãos, como o fermento na massa, estão chamados a transformar o mundo por dentro.
– Ser exemplares.
– União com Cristo para sermos apóstolos.

I. O SENHOR ENSINA‑NOS no Evangelho da Missa1 que o Reino de Deus é semelhante ao fermento que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha até que toda a massa fica fermentada. As pessoas que escutavam essas palavras do Senhor conheciam bem e estavam familiarizadas com esse fenômeno, pois tinham‑no presenciado muitas vezes nos fornos familiares. Um pouco daquele fermento guardado do dia anterior podia transformar uma boa massa de farinha e convertê‑la numa grande fornada de pão.

A imagem que o Senhor nos propõe deve levar‑nos a considerar em primeiro lugar como é insignificante a quantidade de fermento em comparação com a massa que deve transformar. Sendo tão pouco, o seu poder é muito grande. Isto significa que devemos ser audazes na nossa ação apostólica, porque a força do fermento cristão não é puramente humana: é a força do Espírito Santo que atua na Igreja. O Senhor conta também com as nossas poucas forças e com as nossas fraquezas.

“Porventura o fermento é naturalmente melhor que a massa? Não. Mas é o meio necessário para que a massa se elabore, convertendo‑se em alimento comestível e são.

“Ainda que a traços largos, pensai na eficácia do fermento, que serve para fazer o pão, alimento básico, simples, ao alcance de todos. Em muitos lugares, a preparação da fornada é uma verdadeira cerimônia, de que resulta um produto esplêndido, saboroso, que se come com os olhos. Talvez já o tenhais presenciado.

“Escolhem farinha boa; se possível, da melhor. Trabalham a massa na masseira, para misturá‑la bem com o fermento, em longo e paciente labor. Depois, um tempo de repouso, imprescindível para que a levedura complete a sua missão, inchando a massa.

“Entretanto, arde o lume no forno, animado pela lenha que se consome. E daquela massa, metida no calor do fogo, sai o pão fresco, esponjoso, de grande qualidade. Resultado impossível de alcançar, se não fosse pela levedura – em pequena quantidade – que se diluiu, que desapareceu no meio dos outros elementos, num trabalho eficiente, mas que não se vê”2.

Sem essa pequena quantidade de fermento, a massa não passaria de algo inútil, não comestível, imprestável. Nós, na vida diária, podemos ser causa de luz ou de escuridão, de alegria ou de tristeza, fonte de paz ou de inquietação, peso morto que refreia o caminhar dos outros ou fermento que transforma a massa. A nossa passagem pela terra não deixa de ter conseqüências: ou aproximamos os outros de Cristo ou acabamos por separá‑los dEle.

O Senhor escolheu‑nos para proclamarmos a sua mensagem por todos os lugares, a fim de lhe levarmos, um a um, os que não o conhecem, como fizeram os primeiros cristãos com os seus amigos, com as suas famílias, com os colegas e vizinhos, enquanto trabalhavam ou descansavam. Para isso, não é necessário que façamos coisas insólitas e surpreendentes, pois “ao perceberem que somos iguais a eles em todas as coisas, os outros sentir‑se‑ão impelidos a perguntar‑nos: Como se explica a vossa alegria? Donde vos vêm as forças para vencer o egoísmo e o comodismo? Quem vos ensina a viver a compreensão, a reta convivência e a entrega, o serviço aos outros?

“É então o momento de lhes manifestar o segredo divino da existência cristã, de lhes falar de Deus, de Cristo, do Espírito Santo, de Maria; o momento de procurar transmitir, através das nossas pobres palavras, a loucura do amor a Deus que a graça derramou em nossos corações”3.

Somos fermento na família, no ambiente de trabalho ou de estudo? Manifestamos com a nossa alegria que Cristo vive?

II. TEMOS DE CONSIDERAR também que o fermento só atua quando está em contacto com a massa. E assim, sem distinguir‑se dela, trabalhando por dentro, transforma‑a: “A mulher não se limitou a pôr o fermento, mas além disso escondeu‑o na massa. Do mesmo modo tendes de fazer vós quando estais misturados, identificados com as pessoas…, como o fermento que está escondido, mas não desaparece, antes vai transformando pouco a pouco toda a massa até fazê‑la adquirir a sua própria qualidade”4. Só se nos encontrarmos metidos na entranha do mundo, numa profissão ou ofício, é que poderemos levar novamente a Criação para Deus. E nós fomos chamados para isso por vocação divina.

Os primeiros cristãos, que foram verdadeiro fermento num mundo que se decompunha, conseguiram em pouco tempo que a fé penetrasse nas famílias, no Senado, na milícia e até no palácio imperial: “Somos de ontem e enchemos o mundo e tudo o que é vosso: casas, cidades, ilhas, municípios, assembléias e até os vossos acampamentos, as tribos e as decúrias, os palácios, o senado, o foro”5.

Sem excentricidades, como fiéis comuns, podemos fazer o mesmo, mostrando aos que nos rodeiam o que significa seguir o Senhor de perto: cumprindo com retidão os nossos deveres e comportando‑nos serenamente, como filhos de Deus. A nossa vida, apesar das suas fraquezas, deve ser um ponto de referência claro que arraste os outros para Cristo. “Por esse caminho chega‑se a Deus”, é o que os outros devem poder pensar ao verem a nossa vida coerente com a fé que professamos.

As normas usuais da convivência, por exemplo, podem ser para muitos o começo de um regresso para Deus. Com freqüência, essas normas não passam de atitudes e gestos externos, e só se praticam por costume ou porque tornam mais fácil o trato social… Para os cristãos, devem ser também fruto de uma verdadeira caridade, manifestações de uma atitude interior de sincero interesse pelos outros. Devem ser reflexo exterior de uma íntima união com Deus.

A temperança do cristão é outra das manifestações mais convincentes e mais atrativas da vida cristã. Onde quer que estejamos, temos que esforçar‑nos por dar sempre esse bom exemplo, que fluirá com simplicidade do nosso comportamento; não raras vezes essa atitude discreta, mas delicadamente firme, foi para muitos que a presenciavam o começo de um verdadeiro encontro com Deus.

“Cristo deixou‑nos na terra para que sejamos faróis que iluminam, doutores que ensinam; para que cumpramos o nosso dever como o fermento […]. Nem sequer seria necessário expor a doutrina se a nossa vida fosse tão radiante, não seria necessário recorrer às palavras se as nossas obras dessem tal testemunho. Já não haveria nenhum pagão se nos comportássemos como verdadeiros cristãos”6.

Neste clima de exemplo, de alegria serena, de ajudas talvez pequenas mas freqüentes, de trabalho bem feito, ser‑nos‑á fácil levar ao Senhor os que convivem ou trabalham conosco. E essa ação apostólica paciente e constante, apoiada na integridade da conduta, é também peça fundamental na busca do nosso destino eterno: “Aquele que devolve ao redil uma ovelha errante garante para si próprio um advogado poderoso diante de Deus”7.

III. PARA VIBRARMOS, para sermos fermento, é necessário que cresçamos na união com Cristo. Não podemos perder essa força interior que nos dá impulso para levarmos a cabo um apostolado que só pode ter por origem o amor a Deus. Sem essa união, todo o trabalho e todo o esforço convertem‑se em agitação estéril e transitória. Sempre houve quem imaginasse presunçosamente que ia transformar o mundo mediante as suas próprias forças; mas não demorou muito a ver a inconsistência dos seus propósitos. Nunca se deixam de cumprir aquelas palavras do Senhor: Sem Mim, nada podeis fazer8.

“Se a levedura não fermenta, apodrece. Pode desaparecer, reavivando a massa; mas pode também desaparecer por se perder, num monumento à ineficácia e ao egoísmo”9. O cristão “apodrece” quando se deixa invadir pela tibieza no seu relacionamento com Deus, quando esmorece no cumprimento dos seus deveres religiosos, quando deixa de lutar contra os seus defeitos, um de cada vez, quando se desleixa em robustecer a sua formação religiosa mediante a leitura de livros de doutrina espiritual…; numa palavra, quando só tem tempo para pensar nas “suas coisas”, não nas de Deus.

Pelo contrário, cumpre a sua missão de fermento quem procura que a sua fé amorosa se manifeste em atos, quem experimenta a necessidade de alimentar continuamente o seu amor a Deus mediante a oração mental, a recepção freqüente dos sacramentos da Confissão e da Eucaristia e o cultivo do espírito de mortificação e penitência nas pequenas situações de cada dia… “É preciso que sejas «homem de Deus», homem de vida interior, homem de oração e de sacrifício. – O teu apostolado deve ser uma superabundância da tua vida «para dentro»”10.

Para sermos fermento eficaz na nossa vida de todos os dias, temos de olhar para Nossa Senhora, porque “a bem‑aventurada Virgem Maria, Rainha dos Apóstolos, é modelo perfeito desta vida espiritual e apostólica. Enquanto levou na terra uma vida igual à de todos, cheia de cuidados familiares e de trabalhos, estava intimamente associada ao Filho, cooperando de modo absolutamente singular na obra do Salvador”11.

(1) Mt 13, 31‑35; (2) São Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 257; (3) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 148; (4) São João Crisóstomo, Homilia sobre São Mateus, 46, 2; (5) Tertuliano, Apologético, 37; (6) São João Crisóstomo, Homilia 10 sobre a 1ª Epístola a Timóteo; (7) São Tomás de Villanueva, Sermão do domingo “in albis”, 1, c, págs. 900‑901; (8) Jo 15, 5; (9) São Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 258; (10) São Josemaría Escrivá, Caminho, n. 961; (11) Conc. Vat. II, Decr. Apostolicam actuositatem, 4.