TEMPO COMUM. DÉCIMA QUARTA SEMANA. QUARTA‑FEIRA

– José, filho de Jacó, figura de São José, Esposo virginal de Maria.
– Patrocínio de São José sobre a Igreja universal e sobre cada um de nós. Recorrer a ele nas necessidades.
– Ite ad Ioseph… Ide a José.

I. AO LONGO DOS SÉCULOS, muitos cristãos conscientes da missão excepcional de São José na vida de Jesus e de Maria, procuraram na história do povo hebreu episódios e imagens que prefigurassem o esposo virginal de Maria, pois o Antigo Testamento anuncia o Novo. Numerosos Padres da Igreja viram São José profetizado no filho do patriarca Jacó, que tinha o mesmo nome. O Papa Pio IX, ao proclamar São José padroeiro da Igreja Universal, mencionou esses antigos testemunhos. E a liturgia também faz o mesmo paralelismo. As duas figuras não só tiveram o mesmo nome, como também é possível encontrar neles virtudes e atitudes extraordinariamente coincidentes, numa vida tecida de provas e alegrias.

Por uma série de circunstâncias providenciais, tanto José, o filho de Jacó, como o esposo virginal de Maria foram para o Egito: o primeiro, perseguido pelos irmãos e vendido a uma caravana de mercadores, numa atitude ditada pela inveja que prefigura a traição que se cometeria com Cristo; o segundo, fugindo de Herodes para salvar Aquele que trazia a salvação ao mundo 1.

José, o filho de Jacó, recebeu de Deus o dom de interpretar os sonhos do Faraó, pelo que veio a saber o que aconteceria mais tarde. O novo José também recebeu a mensagem de Deus em sonhos. Àquele – faz notar São Bernardo –, foi‑lhe dada a inteligência dos mistérios dos sonhos; este mereceu conhecer e participar dos mistérios soberanos 2. Foi como se os sonhos do primeiro, ainda que efetivados na sua pessoa, houvessem tido a sua plena realização no segundo.

José teve um sonho e contou‑o aos seus irmãos […]. «Ouvi – disse‑lhes ele – o sonho que tive: estávamos atando feixes no campo, e eis que o meu feixe se levantou e se pôs de pé, enquanto os vossos o cercavam e se prostravam diante dele […]». José teve ainda outro sonho, que contou aos seus irmãos: «O sol, a lua e onze estrelas prostravam‑se diante de mim» […] 3.

Esses sonhos cumpriram‑se quando Jacó, seu pai, se mudou para o Egito com toda a família e se prostrou efetivamente diante do filho, convertido em primeiro ministro do país. Mas, ao mesmo tempo, podemos pensar que prefiguravam o mistério da casa de Nazaré, na qual Jesus, Sol da justiça, e Maria, louvada na liturgia como uma brilhante Lua branca e bela, se submeteriam à autoridade do chefe de família.

O primeiro José obteve a confiança e o favor do Faraó e converteu‑se no intendente dos celeiros de trigo do Egito; quando a fome assolava os povos vizinhos e as multidões recorriam ao Faraó pedindo‑lhe trigo para poderem sobreviver, este dizia‑lhes: Ide a José e fazei o que ele vos disser 4. Quando a fome se espalhou pela terra, José abriu os celeiros e repartiu víveres entre os egípcios… E de todas as regiões vinha‑se ao Egito comprar trigo a José, porque a fome era violenta em toda a terra.

E agora, que a fome também assola a terra – fome principalmente de doutrina, de piedade, de amor –, a Igreja recomenda‑nos: Ide a José. Em face de todas as necessidades que nos afligem pessoalmente, diz‑nos: recorrei ao Santo Patriarca de Nazaré. E Jesus acrescenta: aquele que em vida teve a grande missão de cuidar de Mim e de minha Mãe nas nossas necessidades corporais, aquele que amparou as nossas vidas em tantos momentos difíceis, continuará a cuidar de Mim nos meus membros, que são todos os homens necessitados. Ide a José e ele vos dará tudo quanto vos for necessário.

II. ESTE É O SERVO fiel e prudente a quem o senhor colocou à frente da sua família 5. São palavras que a liturgia aplica a São José: pai fiel e solícito, que atende com prontidão as necessidades dessa grande família do Senhor que é a Igreja.

José governou a casa de Nazaré, e a Sagrada Família não só simboliza a Igreja, mas também de certo modo a conteve, como a semente contém a árvore, e a fonte o rio. A santa casa de Nazaré conteve as premissas da Igreja nascente. Esta é a razão pela qual o Santo Patriarca “considera especialmente confiada a si a multidão dos cristãos que compõem a Igreja, quer dizer, esta imensa família espalhada por toda a terra, sobre a qual – por ser Esposo de Maria e Pai de Jesus Cristo – possui, por assim dizer, uma autoridade de pai. Portanto, é coisa natural e digníssima do bem‑aventurado José que, assim como uma vez proveu a todas as necessidades da família de Nazaré e a protegeu santamente, cubra agora com a sua celestial proteção e defesa a Igreja de Jesus Cristo” 6.

Este patrocínio do Santo Patriarca sobre a Igreja universal é principalmente de ordem espiritual; mas estende‑se também à ordem temporal, como a do outro José, o filho de Jacó, chamado pelo rei do Egito “salvador do mundo”.

A ele recorreram os santos e os bons cristãos de todos os tempos. Santa Teresa relata a grande devoção que tinha por São José e a experiência do seu patrocínio. “Não me recordo até agora de lhe ter suplicado coisa alguma que tenha deixado de me atender. É coisa de causar espanto as grandes mercês que Deus me fez por meio deste bem‑aventurado santo, os perigos de que me livrou, tanto do corpo como da alma. A outros santos o Senhor parece ter‑lhes dado graça para socorrer numa determinada necessidade; quanto a este glorioso santo, tenho experiência de que socorre em todas e de que o Senhor nos quer dar a entender que, assim como lhe esteve sujeito na terra – que, como tinha nome de pai sendo aio, podia mandar‑lhe –, assim no céu faz tudo quanto lhe pede […].

“Se fosse pessoa com autoridade para escrever, de boa vontade me estenderia em dizer muito detalhadamente as mercês que este glorioso santo me fez a mim e a outras pessoas […]. Só peço, pelo amor de Deus, que o experimente quem não acreditar em mim, e verá por experiência o grande bem que é encomendar‑se a este glorioso Patriarca e ter‑lhe devoção; em especial, as pessoas de oração deveriam sempre ser‑lhe afeiçoadas, que não sei como se pode pensar na Rainha dos Anjos, no tempo que tanto passou com o Menino Jesus, que não se dêem graças a São José pelo bem que lhes fez” 7.

III. DEVEMOS RECORRER a São José pedindo‑lhe que ampare e proteja a Igreja, pois é o seu defensor e protetor. Pedimos a sua ajuda nas nossas necessidades familiares, espirituais e materiais: Sancte Ioseph, ora pro eis, ora pro me…, rogai por eles, rogai por mim.

Para os homens e mulheres do nosso tempo, e para os de qualquer época, São José constitui uma figura entranhada e venerável, cuja vocação e dignidade admiramos, e cuja fidelidade a serviço de Jesus e de Maria agradecemos; “por São José vamos diretamente a Maria, e por Maria à fonte de toda a santidade, Jesus Cristo” 8.

São José ensina‑nos a tratar Cristo com piedade, respeito e amor: “São José, varão feliz – dizemos‑lhe com uma antiga oração da Igreja –, que tivestes a dita de ver e ouvir o próprio Deus, a quem muitos reis quiseram ver e não viram, ouvir e não ouviram; e não só ver e ouvir, mas ainda trazê‑lo em vossos braços, beijá‑lo, vesti‑lo e guardá‑lo…, ensina‑nos a recebê‑lo com amor e reverência na Sagrada Comunhão, e dá‑nos para isso uma maior delicadeza de alma.

“São José, nosso Pai e Senhor, castíssimo, limpíssimo, tu que mereceste trazer Jesus Menino em teus braços, e lavá‑lo e abraçá‑lo: ensina‑nos a tratar o nosso Deus, a ser limpos, dignos de ser outros Cristos.

“E ajuda‑nos a fazer e a ensinar, como Cristo, os caminhos divinos – ocultos e luminosos – dizendo aos homens que podem ter continuamente, na terra, uma eficácia espiritual extraordinária” 9.

São José proporciona‑nos, além disso, um modelo, cujo ensinamento silencioso podemos e devemos empenhar‑nos em seguir: “Nas coisas humanas, José foi mestre de Jesus; conviveu diariamente com Ele, com carinho delicado, e cuidou dEle com abnegação alegre. Não será esta uma boa razão para considerarmos este varão justo, este Santo Patriarca, em quem culmina a fé da Antiga Aliança, como Mestre de vida interior? A vida interior não é outra coisa senão uma relação de amizade assídua e íntima com Cristo, para nos identificarmos com Ele. E José saberá dizer‑nos muitas coisas sobre Jesus. Por isso, não abandonemos nunca a devoção que lhe dedicamos: Ite ad Ioseph, ide a José, como diz a tradição cristã servindo‑se de uma frase tirada do Antigo Testamento (Gen XLI, 55).

“Mestre de vida interior, trabalhador empenhado no seu ofício, servidor fiel de Deus, em relação contínua com Jesus: este é José. Ite ad Ioseph. Com São José, o cristão aprende o que significa pertencer a Deus e estar plenamente entre os homens, santificando o mundo. Procuremos a intimidade com José, e encontraremos Jesus. Procuremos a intimidade com José, e encontraremos Maria, que encheu sempre de paz a amável oficina de Nazaré” 10.

(1) Cfr. M. Gasnier, José, o silencioso, Editorial Aster, Lisboa, 1984, págs. 12‑13; (2) cfr. São Bernardo, Homilia sobre a Virgem Mãe, 2; (3) cfr. Gen 37, 5‑10; (4) Gen 41, 55; Primeira leiturada Missa da quarta‑feira da décima quarta semana do TC, ano I; (5) Missal Romano, Missa da solenidade de São José, Antífona de entrada, Lc 12, 42; (6) Leão XIII, Enc. Quamquam pluries, 15‑VIII‑l889; (7) Santa Teresa, Vida, 6; (8) Bento XV, Motu proprio Bonum sane et salutare, 25‑VII‑1920; (9) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 553; (10 ) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 56.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal