30 de Agosto 2019
A SANTA MISSA

21ª Semana do Tempo Comum – Sexta-feira
Cor: Verde
1ª Leitura: 1Ts 4,1-8
“Esta é a vontade de Deus: vivei na santidade”
Leitura da Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses
1 Meus irmãos, eis o que vos pedimos e exortamos no Senhor Jesus: Aprendestes de nós como deveis viver para agradar a Deus, e já estais vivendo assim. Fazei progressos ainda maiores! 2 Conheceis, de fato, as instruções que temos dado em nome do Senhor Jesus. 3 Esta é a vontade de Deus: vivei na santidade, afastai-vos da impureza; 4 cada um saiba tratar o seu parceiro conjugal com santidade e respeito, 5 sem se deixar levar pelas paixões, como fazem os pagãos que não conhecem a Deus. 6 Que ninguém, nessa matéria, prejudique ou engane seu irmão, porque o Senhor se vinga de tudo, como já vos dissemos e comprovamos. 7 Deus não nos chamou à impureza, mas à santidade. 8 Portanto, desprezar estes preceitos não é desprezar um homem e sim, a Deus, que nos deu o Espírito Santo.
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Sl 96(97) 1.2b. 5-6. 10. 11-12 (R. 12a)
R. Ó justos, alegrai-vos no Senhor!
1 Deus é Rei! Exulte a terra de alegria, *
e as ilhas numerosas rejubilem!
2b Treva e nuvem o rodeiam no seu trono, *
que se apoia na justiça e no direito. R.
5 As montanhas se derretem como cera *
ante a face do Senhor de toda a terra;
6 e assim proclama o céu sua justiça, *
todos os povos podem ver a sua glória. R.
10 O Senhor ama os que detestam a maldade, +
ele protege seus fiéis e suas vidas, *
e da mão dos pecadores os liberta. R.
11 Uma luz já se levanta para os justos, *
e a alegria, para os retos corações.
12 Homens justos, alegrai-vos no Senhor, *
celebrai e bendizei seu santo nome! R.
Evangelho: Mt 25,1-13
“O noivo está chegando. Ide ao seu encontro”.
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo São Mateus
Naquele tempo, disse Jesus, a seus discípulos, esta parábola: 1 ‘O Reino dos Céus é como a história das dez jovens que pegaram suas lâmpadas de óleo e saíram ao encontro do noivo. 2 Cinco delas eram imprevidentes, e as outras cinco eram previdentes. 3 As imprevidentes pegaram as suas lâmpadas, mas não levaram óleo consigo. 4 As previdentes, porém, levaram vasilhas com óleo junto com as lâmpadas. 5 O noivo estava demorando e todas elas acabaram cochilando e dormindo. 6 No meio da noite, ouviu-se um grito: `O noivo está chegando. Ide ao seu encontro!’ 7 Então as dez jovens se levantaram e prepararam as lâmpadas. 8 As imprevidentes disseram às previdentes: `Dai-nos um pouco de óleo, porque nossas lâmpadas estão se apagando.’ 9 As previdentes responderam: `De modo nenhum, porque o óleo pode ser insuficiente para nós e para vós. É melhor irdes comprar aos vendedores’. 10 Enquanto elas foram comprar óleo, o noivo chegou, e as que estavam preparadas entraram com ele para a festa de casamento. E a porta se fechou. 11 Por fim, chegaram também as outras jovens e disseram: `Senhor! Senhor! Abre-nos a porta!’ 12 Ele, porém, respondeu: `Em verdade eu vos digo: Não vos conheço!’ 13 Portanto, ficai vigiando, pois não sabeis qual será o dia, nem a hora.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
Beato Eustáquio van Lieshout
30 de Agosto
Beato Eustáquio van Lieshout
Humberto van Lieshout, mais tarde conhecido como Padre Eustáquio, nasceu no dia 3 de novembro de 1890, em Aarle Rixtel, na Holanda. Em 1913, ingressou na Congregação dos Sagrados Corações e, no dia 10 de agosto de 1919, foi ordenado sacerdote. Foi Mestre de Noviços, vigário paroquial, cuidando de famílias belgas que, em l914, tiveram que deixar a Pátria por causa da invasão alemã.
Foi enviado como missionário, em 1924, na Espanha e, no ano seguinte, no Rio de Janeiro, Brasil. Em 1925, assumiu, com outros missionários, a pastoral do Santuário da Abadia de Água Suja e outras paróquias de Diocese de Uberaba, e atendimento a outras comunidades. Em 26 de março de 1926, foi nomeado Reitor do Santuário Nossa Senhora da Abadia e Conselheiro da Congregação dos Sagrados Corações no Brasil.
Em suas orientações e curas físicas, Padre Eustáquio falava da disposição de Deus de curar a pessoa integralmente. Indicava medicamentos. Servia-se de folhas e raízes e muitos procuravam sua ajuda. De Romaria, foi transferido para Poá – São Paulo. Por causa do aglomerado de pessoas que o procuravam e pelo transtorno, foi enviado à cidade de Araguari, onde se comunicava quase só com seu amigo Padre Gil. Em 12 de fevereiro passou a coordenar a parórquia de Ibiá. E, no dia 7 do mesmo ano, o encontramos na Capital mineira, na Paróquia de Cristo Rei.
O povo afluía pedindo bênçãos e curas. Em 9 de setembro de 1942, Juscelino Kubitscheck, então Prefeito da Capital, beneficiado por milagre de Padre Eustáquio, doou um terreno, onde foi construída a Igreja dos Sagrados Corações, cuja pedra fundamental foi benzida por Dom Cabral. Padre Eustáquio assim se expressou: “Não verei o fim da guerra. Comecei a igreja, mas não a terminarei”.
Em 23 de agosto, após celebrar a missa – durante o retiro que pregava às alunas do Colégio Sagrado Coração de Jesus, em Belo Horizonte – sentiu-se desfalecer. O diagnóstico do médicos acusou um tipo de tifo causado por uma picada de carrapato. Padre Eustáquio tinha certeza de que não iria sobreviver. Chamava pelo Padre Gil.
Enquanto aguardava, renovou os votos religiosos. E, ante a emoção dos presentes, repetiu a fórmula da profissão religiosa; e, renovou os votos de Pobreza, Castidade e Obediência, como irmão da Congregação dos Sagrados Corações de Jesus e de Maria. Depois disse aos irmãos: “Graças a Deus, estou pronto! Mas, como demora o Padre Gil!”. Até que dia 30 de agosto, Padre Gil conseguiu chegar. Assim que o viu, Padre Eustáquio conseguiu erguer-se do leito com grande esforço, e disse: “Padre Gil, graças a Deus!” E desfaleceu para sempre.
Belo Horizonte amanheceu de luto, e a Imprensa noticiava seu falecimento. Após sua morte, constatou-se que um devoto foi curado de um câncer. O relato consta no processo de beatificação, iniciado em 1997. E outros milagres se sucederam.
Padre Eustáquio dizia que sua vocação era “amar e fazer amar a Deus”. Após o reconhecimento de sua vida e de seus milagres, por parte da Santa Sé, Padre Eustáquio foi beatificado em Belo Horizonte, Brasil, pelo Cardeal José Saraiva Martins, a 15 de junho do ano 2006.
Fonte: http://arquisp.org.br
O azeite da caridade
TEMPO COMUM. VIGÉSIMA PRIMEIRA SEMANA. SEXTA‑FEIRA
– O azeite que mantém acesa a luz da caridade é a intimidade com Jesus.
– O brilho das boas obras.
– Ser luz para os outros.
I. O EVANGELHO DA MISSA1 relata‑nos um costume judeu; o Senhor alude a ele para nos dar um ensinamento sobre o espírito de vigilância que devemos cultivar sempre. Jesus diz‑nos: O Reino dos céus é semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do esposo e da esposa... Estas virgens são as jovens não casadas, damas de honra da noiva, que esperam o esposo na casa dela. O ensinamento centra‑se na atitude que se deve ter à chegada do Senhor. Ele vem até nós, e devemos aguardá‑lo com espírito vigilante, com o amor desperto, pois – diz São Gregório Magno comentando esta parábola – “dormir é morrer”2.
Cinco dessas virgens – lemos na parábola – eram néscias, pois não levaram consigo o azeite necessário para o caso de que o esposo tardasse em chegar. As outras cinco foram previdentes, prudentes, e junto com as lâmpadas levaram azeite nas suas vasilhas. Umas e outras adormeceram, pois a espera foi longa. E quando à meia‑noite se ouviu a voz: Eis o esposo que chega, ide ao seu encontro, somente as que tinham levado azeite de reserva puderam preparar as suas lâmpadas e entrar na sala de bodas. As outras, apesar dos seus esforços, ficaram de fora.
O Espírito Santo ensina que não nos basta ter começado a percorrer o caminho que leva a Cristo: é preciso que nos mantenhamos nele numa atitude permanente de alerta, porque a tendência de todos os homens e mulheres é a de mitigar a entrega que a vocação cristã traz consigo. Quase sem o percebermos, introduz‑se na alma o desejo de tornar compatível o seguimento de Cristo com a frouxidão de um ambiente aburguesado. É necessário estarmos atentos, porque a pressão do ambiente que tem como norma de vida a procura insaciável do conforto pode ser muito forte. Seríamos então semelhantes a essas virgens, inicialmente cheias de bom espírito, mas que se cansam cedo e já não podem ir ao encontro do Esposo, apesar de se terem preparado para esse momento durante todo o dia.
Se não estivéssemos alerta, o Senhor encontrar‑nos‑ia sem o brilho das boas obras, adormecidos, com a lâmpada apagada. Que pena se um cristão, depois de anos e anos de luta, viesse a descobrir no final da sua vida que os seus atos estavam desprovidos de valor sobrenatural por lhes ter faltado o azeite do amor e da caridade!
A virtude teologal da caridade deve iluminar todos os nossos atos, em todas as circunstâncias, em cada momento: quando nos sentimos bem dispostos e na doença, no cansaço e no fracasso; entre pessoas de trato amável e com as que têm um gênio difícil; no trabalho e na família..., sempre. “Na alma bem disposta há sempre um propósito vivo, firme e decidido de perdoar, sofrer e ajudar, uma atitude que incita sempre a realizar atos de caridade. Se a alma se firmou neste desejo de amar e neste ideal de amar desinteressadamente, terá com isso a prova mais convincente de que as suas comunhões, confissões, meditações e toda a sua vida de oração estão em ordem, são sinceras e fecundas”3.
Ora bem, o azeite que mantém acesa a caridade é o espírito de oração: a intimidade com Jesus.
Não é difícil observar que a caridade é pouco vivida, mesmo entre muitos que têm o nome de cristãos. “No entanto, considerando as coisas com sentido sobrenatural, descobriremos também a raiz dessa esterilidade: a ausência de uma vida de relação intensa e contínua, de tu a Tu, com Nosso Senhor Jesus Cristo; e o desconhecimento da obra do Espírito Santo na alma, cujo primeiro fruto é precisamente a caridade”4.
II. O SEGUIMENTO DE CRISTO nasce do Amor e nele encontra o seu alimento. O aburguesamento constitui um fracasso desses grandes desejos de seguir o Mestre. Quem se apega a uma vida cômoda, quem foge da abnegação e do sacrifício, ou se deixa levar obsessivamente pela ânsia de satisfações pessoais, não encontrará as forças necessárias para dar‑se a Deus e aos outros com todo o coração e com toda a alma.
“Há também outros que afligem o seu corpo com a abstinência, mas dessa mesma abstinência querem obter retribuições humanas; dedicam‑se a ensinar os outros, dão muitas coisas aos indigentes, mas na realidade são virgens néscias, porque somente buscam como paga um louvor passageiro”5. São aqueles a quem falta retidão de intenção; as suas obras acabam vazias.
O Senhor pede‑nos perseverança no amor, uma perseverança que deve ir crescendo continuamente, ao ritmo da alegria que se experimenta em servir a Deus em cada época e em cada situação. Esforçai‑vos e fortalecei o vosso coração, vós todos que esperais no Senhor6, aconselha‑nos o Espírito Santo. Sem desânimos, perseverantes no esforço diário, para que o Amor nos encontre preparados quando vier. “Acaso não são estas virgens prudentes – comenta Santo Agostinho – as que perseveram até o fim? Por nenhuma outra causa, por nenhuma outra razão se permitiu a sua entrada a não ser por terem perseverado até o fim... E porque as suas lâmpadas ardem até o último momento, são‑lhes abertas as portas e lhes é dito que entrem”7: alcançaram o fim das suas vidas.
Quando o cristão perde essa atitude atenta, quando cede ao pecado venial e deixa que o seu trato de amizade com Cristo se esfrie, fica às escuras, sem luz para si mesmo e para os outros, que tinham direito ao influxo do seu bom exemplo. Quando vai deixando de lado o espírito de mortificação e descura a oração..., a sua luz esmorece e acaba por apagar‑se, “e depois de tanto trabalho, depois de tantos suores, depois daquela valente luta e das vitórias conseguidas contra as más inclinações da natureza, as virgens néscias tiveram que retirar‑se envergonhadas, com as suas lâmpadas apagadas e a cabeça baixa”8.
O Amor de Deus não consiste em ter começado – ainda que com muito ímpeto –, mas em perseverar, em recomeçar uma vez e outra, continuamente.
III. AS NÉSCIAS “não é que tivessem permanecido inativas, porque tentaram fazer alguma coisa... Mas ouvem a voz que lhes responde com dureza: Não vos conheço (Mt XXV, 12). Não souberam ou não quiseram preparar‑se com a devida solicitude e esqueceram‑se de tomar a razoável precaução de adquirir o azeite a tempo. Faltou‑lhes generosidade para cumprir acabadamente o pouco que lhes fora pedido. Tinham tido muitas horas à sua disposição, mas desaproveitaram‑nas.
“Pensemos na nossa vida com valentia. Por que não conseguimos, às vezes, os minutos de que precisamos para terminar amorosamente o nosso trabalho, que é o meio da nossa santificação? Por que descuramos as obrigações familiares? Por que nos entra a precipitação à hora de rezar ou de assistir ao Santo Sacrifício da Missa? Por que nos faltam a serenidade e a calma para cumprirmos os deveres do nosso estado, e nos entretemos sem pressa nenhuma em ir atrás dos caprichos pessoais? Podemos responder: são ninharias. Sim, é verdade; mas essas ninharias são o azeite, o nosso azeite, que mantém viva a chama e acesa a luz”9.
O desejo de amar sempre mais a Cristo, a luta contra os defeitos e fraquezas, recomeçando sempre, é o que mantém acesa a chama, é o azeite da vasilha, que não permite que o brilho da caridade se extinga.
Dessa atitude vigilante, que o Senhor deseja que mantenhamos no coração, devem beneficiar‑se os que estão mais perto de nós. Pesa muito, em certas ocasiões, um ambiente movido por uma concepção grosseiramente materialista da vida, como pesam os maus exemplos daqueles que deveriam ser sinais indicadores; é grande, às vezes, a inclinação das paixões “que puxam para baixo”..., mas a força da caridade bem vivida pode muito mais. Frater qui adjuvatur a fratre, quasi civitas firma10, o irmão ajudado pelo seu irmão é tão forte como uma cidade amuralhada, que o inimigo não pode assaltar. É maior o poder do bem que o do mal. Daqui a importância da nossa vida: é necessário que sejamos como lâmpadas acesas, que iluminam o caminho de muitos.
Que forças podemos tirar da consideração de que, se amolecemos, não só nós, mas os outros, talvez mais fracos do que nós, perderão a Luz ou nunca a encontrarão! Existe uma maneira heróica e uma maneira estúpida, aburguesada, imprevidente, como a das virgens néscias, de percorrer os caminhos de Deus. Vale a pena que nos detenhamos num exame de consciência profundo: “Na tua vida, há duas peças que não se encaixam: a cabeça e o sentimento.
“A inteligência – iluminada pela fé – mostra‑te claramente não só o caminho, mas a diferença entre a maneira heróica e a maneira estúpida de percorrê‑lo. Sobretudo, põe diante de ti a grandeza e a formosura divina das tarefas que a Trindade deixa em nossas mãos.
“O sentimento, pelo contrário, apega‑se a tudo o que desprezas, mesmo que continues a considerá‑lo desprezível. É como se mil e uma insignificâncias estivessem esperando qualquer oportunidade, e logo que a tua pobre vontade se debilita – por cansaço físico ou por perda de sentido sobrenatural –, essas ninharias se amontoam e se agitam na tua imaginação, até formarem uma montanha que te oprime e te desanima: as asperezas do trabalho; a resistência em obedecer; a falta de meios; os fogos de artifício de uma vida regalada; pequenas e grandes tentações repugnantes; rajadas de sentimentalismo; a fadiga; o sabor amargo da mediocridade espiritual... E, às vezes, também o medo: medo porque sabes que Deus te quer santo e não o és.
“Permite‑me que te fale com crueza. Sobram‑te «motivos» para voltar atrás, e falta‑te arrojo para corresponder à graça que Ele te concede, porque te chamou para seres outro Cristo, ipse Christus! – o próprio Cristo. Esqueceste a admoestação do Senhor ao Apóstolo: «Basta‑te a minha graça!», que é uma confirmação de que, se quiseres, podes”11.
Se, confiantes na graça de Deus, nos dermos heroicamente ao Senhor e a todos os que temos ao nosso lado, poderemos esperar Cristo que chega e que nos introduzirá no banquete de bodas, no Amor sem medida e sem fim.
(1) Mt 25, 1‑13; (2) São Gregório Magno, Homilias sobre o Evangelho, 12, 2; (3) B. Baur, Na intimidade com Deus, pág. 247; (4) Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 236; (5) São Gregório Magno, op. cit., 12, 1; (6) Sl 30, 25; (7) Santo Agostinho, Sermão 93, 6; (8) São João Crisóstomo, Homilias sobre os Evangelhos, 78, 2; (9) Josemaria Escrivá, op. cit, n. 41; (10) cfr. Liturgia das Horas, II, Preces Visperae: Prov 18, 19; (11) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 166.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
Martírio de São João Batista
– A fortaleza de João.
– O seu martírio.
– Alegria nas contradições que por seguirmos fielmente o Senhor.
São João é o único santo de quem a Igreja comemora o nascimento e a morte. Com o seu exemplo cheio de fortaleza, o Precursor ensina-nos a cumprir, apesar de todos os obstáculos, a missão que cada um recebeu de Deus.
I. E FALAREI DOS TEUS PRECEITOS diante dos reis, sem me envergonhar. E deleitar-me-ei nos teus mandamentos, que amo 1.
No dia 24 de junho, a Igreja celebrou o nascimento de São João Batista; hoje comemora o seu dies natalis, o dia da sua morte, ordenada por Herodes. Este rei, como o chama São Marcos, é um dos personagens mais tristes do Evangelho. Foi durante o seu governo que Cristo pregou e se manifestou como o Messias esperado. Também teve oportunidade de conhecer João, incumbido por Deus de mostrar o Messias, e chegou a ouvi-lo com gosto2. Podia ter conhecido Jesus, a quem queria ver pessoalmente, mas cometeu a enorme injustiça de mandar decapitar aquele que poderia tê-lo levado até o Senhor. A imoralidade da sua vida, as suas más paixões, impediram-no de descobrir a Verdade e levaram-no a esse grande crime. Foi tal a cegueira da sua mente e do seu coração que, quando realmente se encontrou cara a cara com o Senhor do céu e da terra3, pretendeu que o entretives-se, a ele e aos seus amigos, com algum dos seus prodígios.
A ocasião apresentou-se quando o rei ofereceu no dia do seu aniversário um banquete a que foram convidados os principais da região. A filha de Herodíades dançou diante dos presentes e agradou a Herodes e aos comensais. Então o rei prometeu-lhe: Pede-me o que quiseres e eu to darei. E jurou-lhe: Dar-te-ei tudo o que me pedires, ainda que seja a metade do meu reino. Por instigação de sua mãe, a jovem pediu-lhe a cabeça de João Batista. O rei entristeceu-se, mas, por causa do juramento e dos que com ele estavam à mesa, não quis desgostá-la. Executada a ordem, os discípulos do Batista recolheram o corpo e deram-lhe sepultura. Muitos deles, com toda a certeza, seriam mais tarde fiéis seguidores de Cristo.
II. SÃO MARCOS RELATA-NOS que Herodes mandara prender João, e mantinha-o em ferros no cárcere por causa de Herodíades, mulher de Filipe, seu irmão, que ele tinha tomado ilicitamente por mulher 9. Herodíades odiava João porque este reprovava essa união ilegítima e o escândalo que causava entre o povo; por isso procurava ocasião de matá-lo. Mas Herodes temia João, sabendo que era varão justo e santo; e defendia-o, e a seu conselho fazia muitas coisas, e ouvia-o com gosto.
O Senhor pede-nos também essa fortaleza e coerência, para que saibamos dar na vida diária um testemunho simples por meio do nosso exemplo e da nossa palavra, sem medo nem respeitos humanos.
São João pregava a todos: à multidão do povo, aos publicanos, aos soldados4; aos fariseus e saduceus 5, e ao próprio Herodes. Com o seu exemplo humilde, íntegro e austero, avalizava o seu testemunho sobre o Messias, que já tinha chegado 6. João dizia a Herodes: Não te é licito ter a mulher do teu irmão 7. E não temeu os grandes e poderosos, nem se importou com as conseqüências das suas palavras. Tinha presente na alma a advertência do Senhor ao profeta Jeremias, que a primeira Leitura da Missa nos recorda hoje: Tu, pois, cinge os teus rins, levanta-te e diz-lhes tudo o que te mando. Não lhes tenhas medo, porque eu farei que não temas a sua presença. Porque eu te converto hoje em cidade fortificada, em coluna de ferro e em muro de bronze sobre toda esta terra, diante dos reis de Judá, dos seus príncipes, dos seus sacerdotes e do seu povo. E pelejarão contra ti, mas não prevalecerão, porque eu estou contigo para te livrar 8.
João deu-se inteiramente a Cristo: não somente dedicou todos os seus esforços a preparar a sua chegada e os primeiros discípulos que o Mestre teria, mas sacrificou-lhe a sua própria vida. "Não devemos duvidar - diz São Beda - de que, se São João suportou a prisão e os grilhões, foi em testemunho do nosso Redentor, de quem foi precursor e por quem deu a vida. O seu perseguidor não lhe pediu que negasse Cristo, mas procurou obrigá-lo a calar a verdade. Isso é suficiente para afirmar que morreu por Cristo, porque o próprio Cristo disse: Eu sou a verdade [...]. Considerou apetecível aceitar a morte [...], tendo em conta que a sofria pela confissão do nome de Cristo e que com ela alcançaria a palma da vida perene. Bem o diz o Apóstolo: Porque vos foi dado por Cristo não apenas crer nele, mas ainda sofrer por ele. E o mesmo Apóstolo explica em outro lugar por que é um dom sofrer por Cristo: Os sofrimentos desta vida não se comparam à futura glória que se revelará em nós" 10.
Ao longo dos séculos, todos aqueles que seguiram de perto o Senhor alegraram-se quando tiveram que sofrer perseguições, tribulações ou contrariedades pela fé. Foram muitos os que seguiram o exemplo dos Apóstolos, a quem, depois de açoitados, ordenaram-lhes que não falassem mais no nome de Jesus, e soltaram-nos. Porém, eles saíram gozosos da presença do conselho, por terem sido achados dignos de sofrer afrontas pelo nome de Jesus ". E, longe de viverem acovardados e temerosos, todos os dias não cessavam de ensinar e de anunciar Jesus Cristo no templo e pelas casas 11. Certamente, lembraram-se das palavras do Senhor relatadas por São Mateus: Bem-aventurados sereis quando vos injuriarem e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo o mal de vós por minha causa. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois também assim perseguiram os profetas que vos precederam 12.
Podemos nós entristecer-nos ou queixar-nos se alguma vez temos que padecer um pouco pela nossa fé ou por sermos fiéis à chamada que recebemos do Senhor?
II. A HISTÓRIA DA IGREJA e dos seus santos mostra-nos como todos aqueles que quiseram seguir de perto os passos de Cristo encontraram de um modo ou de outro a Cruz e a contradição. Para subir ao Calvário e corredimir com Cristo, não existem caminhos fáceis e cômodos.
Já nos primeiros tempos, São Pedro escrevia uma Epístola com acentos claros de consolo aos que sofriam. Não se tratava da sangrenta perseguição que viria anos mais tarde, mas da situação incômoda em que muitos se encontravam por serem conseqüentes com a sua fé: umas vezes, no âmbito familiar, onde os escravos tinham que suportar as injustiças dos seus amos14, e as mulheres, as intolerâncias dos seus maridos 15; outras, por causa das calúnias, injúrias ou discriminações... São Pedro recorda-lhes que os contratempos que os afligem não são inúteis: devem servir-lhes para purificar-se, sabendo que é Deus quem julga, não os homens. Sobretudo devem ter presente que - à imitação de Jesus Cristo -alcançarão por esse meio muitos bens, e mesmo o dom da fé para os seus próprios perseguidores, como efetivamente aconteceu. Chama-os bem-aventurados e anima-os a suportar os sofrimentos com alegria. Pede-lhes que considerem que o cristão está incorporado em Cristo e participa da sua Paixão, Morte e Ressurreição. É Ele quem dá sentido e plenitude à cruz de cada dia 16.
Desde São João Batista, foram muitos os que perderam a vida por guardarem fidelidade a Cristo. Também nos nossos dias. "O entusiasmo que Jesus despertou entre os seus seguidores e a confiança infundida pelo contacto imediato com Ele conservaram-se vivos na comunidade cristã e constituíram a atmosfera em que viviam os primeiros cristãos: [...] Jesus Cristo tem a seu favor o testemunho de uma história quase bimilenário. O cristianismo produziu frutos bons e magníficos. Penetrou no interior dos corações, apesar de todas as oposições externas e de todas as resistências ocultas. O cristianismo mudou o mundo e converteu-se na salvaguarda de todos os valores nobres e sagrados. O cristianismo passou com o maior êxito pela prova da sua persistência, a que Gamaliel se referiu certo dia (At 5, 28). Não é, portanto, obra dos homens, já que, se fosse assim, ter-se-ia desmoronado e extinguido há muito tempo". Pelo contrário, vemos a força que a fé e o amor a Cristo têm nas nossas almas e nos milhões de corações que o confessam e lhe são fiéis, apesar das dificuldades e contradições. 17
Não é provável que o Senhor nos peça uma confissão de fé que nos leve à morte. Se no-la pedisse, dá-la-íamos de bom grado. O normal será que nos peça a paz e a alegria no meio das resistências que um ambiente paganizado opõe à fé: a calúnia, a ironia, o desprezo... O nosso júbilo será grande aqui na terra, e muito maior no Céu.
Todos os obstáculos devem ser vistos sempre com sentido positivo. "Cresce perante os obstáculos. - A graça do Senhor não te há de faltar: «Inter médium, montium pertransi-bunt aquae!»: pássaras através das montanhas!" 18 Mas é preciso fé, "fé viva e penetrante. Como a fé de Pedro. - Quando a tiveres, disse-o Ele, afastarás as montanhas, os obstáculos, humanamente insuperáveis, que se oponham aos teus empreendimentos de apóstolo"19.
Além disso, nunca nos faltará o consolo de Deus. E se alguma vez se tomar mais difícil caminharmos ao lado de Cristo, recorreremos a Nossa Senhora, Auxílio dos cristãos, para alcançarmos refugio e amparo.
(1) Sl 118, 46-47; Antífona de entrada da Missa do dia 29 de agosto; (2) Mc 6, 17-20; (3) Lc 23, 6-9; (4) Lc 3, 10-14; (5) Mt 3, 7-12; (6) Jo 1, 29; 36-37; (7) Mc 6, 18; (8) Jer 1, 17-19; (9) Mc 6, 17 e segs.; (10) Liturgia das Horas, Segunda Leitura; São Beda, Homília 23; (11) At 5, 40--41; (12) At 5, 42; (13) Mt 5, 11-12; (14) cfr. 1 Pe 2, 18-25; (15) cfr. 1 Pe 3, 1-3; (16) cfr. Sagrada Bíblia, Epístolas católicas, EUNSA, Pamplqna, 1988, págs. 116-117; (17) A. Lang, Teologia fundamental, Rialp, Madrid, 1966, vol. I, págs. 319-320; (18) cfr. São Josemaria Escrivá, Caminho, n. 12; (19) ib., n. 489.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
29 de Agosto 2019
A SANTA MISSA

Memória: Martírio de São João Batista
Cor: Vermelha
1ª Leitura: Jr 1, 17-19
“Comunica-lhes tudo que eu te mandar dizer:
não tenhas medo em sua presença”
Leitura do Livro de Jeremias
Naqueles dias a Palavra do Senhor foi-me dirigida: 17 “Vamos, põe a roupa e o cinto, levanta-te e comunica-lhes tudo que eu te mandar dizer: não tenhas medo, senão, eu te farei tremer na presença deles. 18 Com efeito, eu te transformarei hoje numa cidade fortificada, numa coluna de ferro, num muro de bronze contra todo o mundo, frente aos reis de Judá e seus príncipes, aos sacerdotes e ao povo da terra; 19 eles farão guerra contra ti, mas não prevalecerão, porque eu estou contigo para defender-te”, diz o Senhor.
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Sl 70(71), 1-2.3-4a.5-6ab.15ab e 17(R. cf. 15ab)
R. Minha boca anunciará vossa justiça.
1 Eu procuro meu refúgio em vós, Senhor: *
que eu não seja envergonhado para sempre!
2 Porque sois justo, defendei-me e libertai-me! *
Escutai a minha voz, vinde salvar-me! R.
3 Sede uma rocha protetora para mim, *
um abrigo bem seguro que me salve!
Porque sois a minha força e meu amparo, +
o meu refúgio, proteção e segurança! *
4 Libertai-me, ó meu Deus, das mãos do ímpio. R.
5 Porque sois, ó Senhor Deus, minha esperança, *
em vós confio desde a minha juventude!
6a Sois meu apoio desde antes que eu nascesse, *
6b desde o seio maternal, o meu amparo. R.
15a Minha boca anunciará todos os dias *
15b vossa justiça e vossas graças incontáveis.
17 Vós me ensinastes desde a minha juventude, *
e até hoje canto as vossas maravilhas. R.
Evangelho: Mc 6, 17-29
“Quero que me dês agora, num prato, a cabeça de João Batista”
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, 17 Herodes tinha mandado prender João, e colocá-lo acorrentado na prisão. Fez isso por causa de Herodíades, mulher do seu irmão Filipe, com quem se tinha casado. 18 João dizia a Herodes: “Não te é permitido ficar com a mulher do teu irmão”. 19 Por isso Herodíades o odiava e queria matá-lo, mas não podia. 20 Com efeito, Herodes tinha medo de João, pois sabia que ele era justo e santo, e por isso o protegia. Gostava de ouvi-lo, embora ficasse embaraçado quando o escutava. 21 Finalmente, chegou o dia oportuno. Era o aniversário de Herodes, e ele fez um grande banquete para os grandes da corte, os oficiais e os cidadãos importantes da Galileia. 22 A filha de Herodíades entrou e dançou, agradando a Herodes e seus convidados. Então o rei disse à moça: “Pede-me o que quiseres e eu to darei”. 23 E lhe jurou dizendo: “Eu te darei qualquer coisa que me pedires, ainda que seja a metade do meu reino”. 24 Ela saiu e perguntou à mãe: “O que vou pedir?” A mãe respondeu: “A cabeça de João Batista”. 25 E, voltando depressa para junto do rei, pediu: “Quero que me dês agora, num prato, a cabeça de João Batista”. 26 O rei ficou muito triste, mas não pôde recusar. Ele tinha feito o juramento diante dos convidados. 27 Imediatamente, o rei mandou que um soldado fosse buscar a cabeça de João. O soldado saiu, degolou-o na prisão, 28 trouxe a cabeça num prato e a deu à moça. Ela a entregou à sua mãe. 29Ao saberem disso, os discípulos de João foram lá, levaram o cadáver e o sepultaram.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
Martírio de São João Batista
29 de Agosto
Martírio de São João Batista
A festa da natividade de são João Batista ocorre no dia 24 de junho. Ela faz parte da tradição dos cristãos, assim como esta que celebramos hoje, do martírio de são João Batista. No calendário litúrgico da Igreja, esta comemoração iniciou na França, no século V, sendo introduzida em Roma no século seguinte. A origem da comemoração foi a construção de uma igreja em Sebaste, na Samaria, sobre o local indicado como o do túmulo de são João Batista.
João era primo de Jesus e foi quem melhor soube levar ao povo a palavra do Mestre. Jesus dedicou-lhe uma grande simpatia e respeito, como está escrito no evangelho de são Lucas: 'Na verdade vos digo, dentre os nascidos de mulher, nenhum foi maior que João Batista'. João Batista foi o precursor do Messias. Foi ele que batizou Jesus no rio Jordão e preparou-lhe o caminho para a pregação entre o povo. Não teve medo e denunciou o adultério do rei Herodes Antipas, que vivia na imoralidade com sua cunhada Herodíades.
A ousadia do profeta despertou a ira do rei, que imediatamente mandou prendê-lo. João Batista permaneceu na prisão de Maqueronte, na margem oriental do mar Morto, por três meses. Até que, durante uma festa no palácio daquela cidade, a filha de Herodíades, Salomé, instigada pela ardilosa e perversa mãe, dançou para o rei e seus convidados. A bela moça era uma exímia dançarina e tinha a exuberância da juventude, o que proporcionou a todos um estonteante espetáculo.
No final, ainda entusiasmado, o rei Herodes disse que ela poderia pedir o que quisesse como pagamento, porque nada lhe seria negado. Por conselho da mãe, ela pediu a cabeça de João Batista numa bandeja. Assim, a palavra do rei foi mantida. Algum tempo depois, o carrasco trazia a cabeça do profeta em um prato, entregando-a para Salomé e para sua maldosa mãe. O martírio por decapitação de são João Batista, que nos chegou narrado através do evangelho de são Marcos, ocorreu no dia 29 de agosto, um ano antes da Paixão de Jesus.
Texto: Paulinas Internet
Amar o Trabalho Profissional
TEMPO COMUM. VIGÉSIMA PRIMEIRA SEMANA. QUARTA-FEIRA
– O exemplo de São Paulo.
– A qualidade humana do trabalho.
– Amar a nossa ocupação profissional.
I. O TRABALHO É um dom de Deus, um grande bem para o homem, ainda que seja "o sinal de um bem árduo, conforme a terminologia de São Tomás [...]. E é não somente um bem útil ou para ser usufruído, mas um bem digno, isto é, um bem que corresponde à dignidade do homem, que expressa essa dignidade e a aumenta" 1. Uma vida sem trabalho c0rrompe-se, e, no trabalho, o homem "toma-se mais homem" 2, mais digno e mais nobre, se o realiza como Deus quer.
O trabalho é conseqüência do preceito de dominar a terra 3 dado por Deus à humanidade, que se tomou penoso pelo pecado original 4, mas que constitui o "eixo da nossa santidade e o meio sobrenatural e humano apto para levarmos Cristo conosco e fazermos o bem a todos" 5. E como que a coluna vertebral do homem, que dá base de sustentação a toda a sua vida, e o meio através do qual devemos alcançar ti nossa santidade e a dos outros. Um modo errôneo de equacionar o trabalho profissional pode repercutir em toda a vida do homem, mesmo nas suas relações com Deus.
Por isso, compreendemos bem os males que a preguiça, 0 trabalho mal feito, as tarefas realizadas pela metade podem ocasionar... "O ferro que jaz ocioso, consumido pela ferrugem, torna-se mole e inútil; mas, se é empregado no trabalho, é muito mais útil e belo, e não fica muito atrás da prata pelo seu brilho. A terra baldia não produz nada de útil, mas mato, cardos, espinhos e árvores infrutíferas; mas a que é cultivada coroa-se de suaves frutos. E, para dizê-lo numa só palavra, todo o ser se corrompe pela ociosidade e se aperfeiçoa pela operação que lhe é própria" 6; o homem, pelo seu trabalho.
São Paulo, como lemos na primeira Leitura da Missa 7, fala aos primeiros cristãos de Tessalônica do modo como se comportou com eles enquanto lhes pregava a Boa Nova de Jesus: Estais lembrados - diz-lhes - dos nossos trabalhos e fadigas; trabalhando noite e dia para não sermos pesados a nenhum de vós...8 E mais tarde, na segunda Epístola: Vós mesmos sabeis como deveis imitar-nos; pois não vivi entre vós sem trabalhar, nem comi de graça o pão de ninguém, mas trabalhei e cansei-me de noite e de dia para não ser pesado a ninguém 9. O Espírito Santo, com este exemplo, inculcava-nos um princípio prático bem claro a seguir: Se alguém não quiser trabalhar, que não coma.
Hoje, na nossa oração serena e sossegada, temos que ter presente que o Senhor também espera de nós esse mesmo espírito de laboriosidade, de trabalho intenso, que se viveu entre os primeiros cristãos. Um dos escritos cristãos mais antigos - a Didaquê - deixou-nos este admirável testemunho: "Todo aquele que chegar a vós em nome do Senhor, seja recebido; depois, examinando-o, vireis a conhecê-lo [...]. Se quem chega é um viajante, não permanecerá entre vós mais do que dois dias ou, se for necessário, três. Mas, se quiser estabelecer-se entre vós, tendo um ofício, que trabalhe e assim se alimente. E se não tiver ofício, provede conforme a vossa prudência, de modo que não viva entre vós nenhum cristão ocioso. Se não quiser fazer assim, é um traficante de Cristo; estai alerta contra esses" 10.
II NOS SEUS ANOS de Nazaré, o Senhor deu-nos um exemplo admirável da importância do trabalho e da perfeição humana e sobrenatural com que devemos realizar a nossa tarefa profissional. "Jesus, crescendo e vivendo como um de nós, revela-nos que a existência humana, a vida comum e de cada dia, tem um sentido divino. Por muito que tenhamos considerado estas verdades, devemos encher-nos sempre de admiração ao pensar nos trinta anos de obscuridade que constituem a maior parte da vida de Jesus entre os seus irmãos, os homens. Anos de sombra, mas, para nós, claros como a luz do sol" 11.
A sua própria maneira de falar, as parábolas e imagens que emprega na sua pregação revelam um homem que conheceu muito de perto o trabalho; fala sempre "para quem se afana, para uma vida ordinária sempre regida pela lei da normalidade, pela aparição previsível dos mesmos problemas para as mesmas pessoas. Este é o ambiente da pregação de Cristo; os seus ensinamentos ficaram graficamente inseridos neste contexto. Não era o "filósofo", nem o "visionário", mas o artesão. Alguém que trabalhava, como todos" 12.
Durante a sua vida pública, o Mestre chamou para junto de si pessoas que estavam habituadas ao trabalho: São Pedro, pescador de ofício, voltará às suas tarefas de pesca logo que tiver a primeira oportunidade,3; São Mateus é convidado a seguir o Senhor num momento em que estava ocupado no seu ofício de cobrador de impostos, e o mesmo aconteceu com os outros Apóstolos.
Quando São Paulo partiu de Atenas e chegou a Corinto, encontrou um judeu chamado Áquila, originário do Ponto, e sua esposa Priscila. Juntou-se a eles. E como era do mesmo ofício, hospedou-se em casa deles e trabalhava em companhia de Áquila; ambos eram fabricantes de lonas14. Foi durante essa estadia de ano e meio em Corinto que São Paulo escreveu as exigentes exortações que dirigiu aos cristãos de Tessalônica, convencido de que muitos dos males que vinham afligindo aquela comunidade cristã se deviam à circunstância de que alguns eram mais dados a falar e a andar de casa em casa do que a ocupar-se no seu trabalho.
Devemos examinar com freqüência a qualidade humana do nosso trabalho: se o começamos e terminamos no horário previsto, ainda que alguns dos nossos colegas, ou mesmo todos, não o façam; se o realizamos com ordem, sem deixar para o fim os assuntos mais difíceis ou menos gratos; se trabalhamos intensamente, procurando evitar conversas, chamadas telefônicas inúteis ou menos necessárias; se procuramos melhorar constantemente a qualidade desse trabalho com o estudo oportuno, procurando estar atualizados nas novas questões que surgem em todas as profissões; se nos excedemos em cumpri-lo, como acontece com tudo o que se ama, mas com prudência e retidão, sem prejudicar o tempo que devemos à família, ao apostolado, à nossa formação espiritual e religiosa... Numa palavra, contemplemos Jesus na sua oficina de Nazaré, pecamos licença ao Senhor para entrar ali com os olhos da fé, e então veremos se o nosso trabalho tem a qualidade e a profundidade que Ele pede aos que o seguem.
III. TEMOS QUE AMAR e cuidar do nosso trabalho porque é um preceito do nosso Pai-Deus. Mediante o trabalho de todos os dias, a personalidade desenvolve-se, ganha-se o preciso para as necessidades da família e para as pessoais, bem como para prestar ajuda às boas obras de formação, de apostolado, etc. Temos que amar o trabalho e convertê-lo ao mesmo tempo em tema e campo de oração, porque, acima de tudo, é caminho de santidade.
Podemos oferecer todos os dias ao Senhor imensas coisas que procuramos que estejam bem feitas: o estudante poderá oferecer-lhe horas de estudo intensas e seguidas; a mãe de família, a solicitude eficaz pelos filhos, pelo marido, o cuidado dos mil detalhes que fazem da sua casa um verdadeiro lar; o médico, a par da competência profissional, o trato amável e acolhedor com os pacientes; as enfermeiras, essas horas cheias de serviço contínuo, como se cada um dos doentes fosse o próprio Cristo...
É no meio e na execução do próprio trabalho que devem surgir com freqüência os pedidos de ajuda ao Senhor, as ações de graças, os desejos de dar glória a Deus com aquilo que temos entre mãos... Nós, os cristãos correntes, os simples leigos, não nos santificamos apesar do trabalho, mas através do trabalho; encontramos o Senhor nos mais variados incidentes que o compõem, uns agradáveis, outros menos, mas todos eles o campo por excelência em que se exercitam as virtudes humanas e as sobrenaturais.
O amor ao nosso trabalho profissional levar-nos-á freqüentemente a permanecer, talvez por muitos anos ou por toda a vida, na mesma tarefa. Isto não significa que não devamos aspirar a conseguir uma situação ou um lugar de trabalho de mais destaque. Mas esse desejo legítimo, que faz parte da boa mentalidade profissional, não deve causar intranqüilidade nem desassossego, como se o êxito profissional e financeiro fosse o único motivo que nos leva a trabalhar. Os cristãos não devem medir os seus trabalhos unicamente pelo dinheiro, como se fosse o que em última análise lhes importa. Enquanto não nos chegam essas oportunidades de subir na escala profissional, se fizemos jus a isso, devemos santificar precisamente essas tarefas que nos ocupam, sem uma mentalidade provisória que comprometeria a sua eficácia santificadora.
E por fim, lembremo-nos de que São Paulo, no meio da preocupação por sustentar-se e não ser gravoso a ninguém, continuava a ser o Apóstolo das gentes, o eleito de Deus, e servia-se da sua profissão para aproximar os outros de Cristo. Assim devemos nós fazer, qualquer que seja o nosso ofício e o nosso lugar na sociedade.
(1) João Paulo II, Ene. Laborem exercens, 14-IX-1981, I, 9; (2) ib.; (3) cfr. Gen 1, 28; (4) cfr. Gen 3, 17; (5) São Josemaria Escrivá, Carta, 14-11-1950; (6) São João Crisóstomo, Homília sobre Priscila e Àquila; (7) 1 Tess 2, 9-13; Primeira leitura da Missa da quarta-feira da vigésima primeira semana do TC, ano I; (8) 1 Tess 2, 9; (9) 2 Tess 3, 7-8; (10) Didaquê ou Doutrina dos Doze Apóstolos; (11) São Josemaria Escrivá, É Cristo que passa, n. 14; (12) R. Gómez Pérez, La fe y los dias, pág. 20; (13) cfr. Jo 21, 3; (14) cfr. At 18, 1-3.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
28 de Agosto 2019
A SANTA MISSA

21ª Semana do Tempo Comum – Quarta-feira
Memória: Santo Agostinho – bispo e doutor da Igreja
Cor: Branca
1ª Leitura: 1Ts 2,9-13
“Trabalhamos dia e noite;
foi assim que vos anunciamos o evangelho de Deus.”
Leitura da Primeira Carta de São Paulo ao Tessalonicenses
9 Irmãos, certamente ainda vos lembrais dos nossos trabalhos e fadigas. Trabalhamos dia e noite, para não sermos pesados a nenhum de vós. Foi assim que anunciamos o Evangelho de Deus. 10 Vós sois testemunhas, e Deus também, de quão santo, justo, irrepreensível foi o nosso proceder para convosco, os fiéis. 11 Bem sabeis que, como um pai a seus filhos, 12 nós exortamos a cada um de vós e encorajamos e insistimos, para que vos comporteis de modo digno de Deus, que vos chama ao seu reino e à sua glória. 13 Por isso agradecemos a Deus sem cessar por terdes acolhido a pregação da Palavra de Deus, não como palavra humana, mas como aquilo que de fato é: Palavra de Deus, que está produzindo efeito em vós que abraçastes a fé.
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Sl 138(139), 7-8.9-10.11-12ab(R. cf. 1)
R. Senhor, vós me sondais e me conheceis!
7 Em que lugar me ocultarei de vosso espírito? *
E para onde fugirei de vossa face?
8 Se eu subir até os céus, ali estais; *
se eu descer até o abismo, estais presente. R.
9 Se a aurora me emprestar as suas asas, *
para eu voar e habitar no fim dos mares;
10 mesmo lá vai me guiar a vossa mão *
e segurar-me com firmeza a vossa destra. R.
11 Se eu pensasse: ‘A escuridão venha esconder-me *
e que a luz ao meu redor se faça noite!’
12a Mesmo as trevas para vós não são escuras, +
12b a própria noite resplandece como o dia, * R.
Evangelho: Mt 23,27-32
“Sois filhos daqueles que mataram os profetas”.
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo São Mateus
Naquele tempo, disse Jesus: 27 Ai de vós, mestres da Lei e fariseus hipócritas! Vós sois como sepulcros caiados: por fora parecem belos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda podridão! 28 Assim também vós: por fora, pareceis justos diante dos outros, mas por dentro estais cheios de hipocrisia e injustiça. 29 Ai de vós, mestres da Lei e fariseus hipócritas! Vós construís sepulcros para os profetas e enfeitais os túmulos dos justos, 30 e dizeis: ‘Se tivéssemos vivido no tempo de nossos pais, não teríamos sido cúmplices da morte dos profetas’. 31 Com isso, confessais que sois filhos daqueles que mataram os profetas. 32 Completai, pois, a medida de vossos pais!’
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
27 de Agosto 2019
A SANTA MISSA

21ª Semana do Tempo Comum – Terça-feira
Memória: Santa Mônica
Cor: Branca
1ª Leitura: 1Ts 2,1-8
“Desejávamos dar-vos não somente o evangelho de Deus,
mas até, a própria vida”
Leitura da Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses
1 Bem sabeis, irmãos, que nossa vinda até vós não foi em vão. 2 Apesar de maltratados e ultrajados em Filipos, como sabeis, encontramos em Deus a coragem de vos anunciar o Evangelho, em meio a grandes lutas. 3 A nossa exortação não se baseia no erro, na ambiguidade ou no desejo de enganar. 4 Ao contrário, uma vez que Deus nos achou dignos, a ponto de nos confiar o Evangelho, falamos não para agradar aos homens, mas a Deus, que examina os nossos corações. 5 Bem sabeis que nunca usamos palavras de adulação, nem procedemos movidos por disfarçada ganância. Deus é testemunha disso. 6 E também não procuramos elogios humanos, nem da parte de vós, nem de outros, 7 embora pudéssemos fazer valer a nossa autoridade de apóstolos de Cristo. Foi com muita ternura que nos apresentamos a vós, como uma mãe que acalenta os seus filhinhos. 8 Tanto bem vos queríamos, que desejávamos dar-vos não somente o Evangelho de Deus, mas até a própria vida; a tal ponto chegou a nossa afeição por vós.
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Sl 138 (139), 1-3.4-6(R. cf. 1)
R. Senhor, vós me sondais e conheceis.
1 Senhor, vós me sondais e conheceis, *
2 sabeis quando me sento ou me levanto;
de longe penetrais meus pensamentos, +
3 percebeis quando me deito e quando eu ando, *
os meus caminhos vos são todos conhecidos. R.
4 A palavra nem chegou à minha língua, *
e já, Senhor, a conheceis inteiramente.
5 Por detrás e pela frente me envolveis; *
pusestes sobre mim a vossa mão.
6 Esta Verdade é por demais maravilhosa, *
é tão sublime que não posso compreendê-la. R.
Evangelho: Mt 23, 23-26
“Vós deveríeis praticar isto, sem contudo deixar aquilo.”
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
Naquele tempo, disse Jesus: 23 Ai de vós, mestres da Lei e fariseus hipócritas! Vós pagais o dízimo da hortelã, da erva-doce e do cominho, e deixais de lado os ensinamentos mais importantes da Lei, como a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Vós deveríeis praticar isto, sem contudo deixar aquilo. 24 Guias cegos! Vós filtrais o mosquito, mas engolis o camelo. 25 Ai de vós, mestres da Lei e fariseus hipócritas! Vós limpais o copo e o prato por fora, mas, por dentro, estais cheios de roubo e cobiça. 26 Fariseu cego! Limpa primeiro o copo por dentro, para que também por fora fique limpo.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
Primeiro , ser Justos
TEMPO COMUM. VIGÉSIMA PRIMEIRA SEMANA. TERÇA‑FEIRA
– A virtude da justiça e a dignidade humana.
– A justiça social transcende o estritamente estipulado.
– A economia, que tem as suas próprias leis, deve ter em vista o bem das pessoas.
I. A LEI DE MOISÉS prescrevia que se pagasse o dízimo 1: devia‑se entregar para a sustentação do Templo a décima parte do produto dos frutos mais comuns do campo, como os cereais, o vinho e o azeite. Os fariseus pagavam, além disso, o dízimo da hortelã e do cominho, plantas aromáticas que se cultivavam nos jardins das casas e que serviam para condimentar a comida. Era por parte deles uma manifestação equívoca de generosidade para com Deus, porque ao mesmo tempo deixavam de cumprir outros graves mandamentos em relação ao próximo. Por essa hipocrisia, o Senhor dir‑lhes‑ia: Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que pagais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, e desprezais os pontos mais graves da lei: a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Eram estas as coisas que devíeis praticar, sem omitir aquelas2.
O Senhor não despreza o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, que poderia ter sido uma verdadeira expressão de amor: como quem presenteia umas flores a uma pessoa que ama, ou ao Senhor no Sacrário; o que Jesus rejeita é a hipocrisia que esse falso zelo ocultava, pois com isso justificavam‑se em relação à omissão dos outros deveres essenciais: a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Não devemos nunca cair numa hipocrisia semelhante à desses homens: as nossas oferendas voluntárias são gratas a Deus quando cumprimos as obrigatórias e necessárias, determinadas pela justiça, que é uma virtude pela qual damos a cada um o que é seu: Eram estas as coisas que devíeis praticar, sem omitir aquelas.
A virtude da justiça fundamenta‑se na intocável dignidade da pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus e destinada a uma felicidade eterna.
E se considerarmos o respeito que todo o homem merece “à luz das verdades reveladas por Deus, devemos avaliar necessariamente em maior grau esta dignidade, já que os homens foram redimidos pelo sangue de Jesus Cristo, feitos filhos e amigos de Deus pela graça sobrenatural e constituídos herdeiros da glória eterna”3.
O respeito aos direitos das pessoas começa por um justo ordenamento das leis civis, para o qual os cristãos devem contribuir, como cidadãos exemplares, com todas as suas forças. É doloroso verificar como o espírito humano, na sua auto‑suficiência e rebeldia aos planos divinos, persiste em querer derrubar os princípios da dignidade da natureza humana, afirmados há séculos e constantemente confirmados pela doutrina da Igreja. Tem‑se visto como aos poucos – muitas vezes por plebiscito, como se a verdade pudesse depender do que pensa ou é levada a pensar a maioria numa determinada sociedade e num determinado momento histórico – se vão implantando leis que permitem pôr termo à vida do ser humano a partir da sua concepção, como se degrada o mistério da reprodução da vida humana, fechando os olhos a experiências que a nivelam pela dos animais, como se destrói a coesão e a solidez da família, autorizando o divórcio até mesmo por mútuo consentimento, como se deixam desprotegidos os menores diante da onda de pornografia e violência que domina os meios de comunicação, e assim por diante.
Persistem os fautores das leis iníquas, e calam‑se muitos cristãos, por julgarem que não podem ou não lhes compete fazer nada. Não é o momento de pensarmos, no silêncio fecundo da oração, que o pouco que achamos estar ao nosso alcance deve ser feito? Que não é uma faculdade, mas uma obrigação em consciência?
II. PARA VIVER A JUSTIÇA, não basta simplesmente lamentar‑se diante das situações de injustiça; as queixas e as lamentações são estéreis se não se traduzem em mais oração e em obras para remediar essas situações. Cada cristão deve pensar em como vive a justiça nas circunstâncias normais da sua vida: na família, no trabalho profissional, nas relações sociais…
Viver a justiça com aqueles com quem nos relacionamos habitualmente significa, entre outros deveres, respeitar‑lhes o direito à fama, à intimidade… “Estas exigências não devem limitar‑se unicamente à ordem econômica […]; a vida e a moral cristã têm exigências mais amplas. O respeito à vida, à fidelidade, à verdade, a responsabilidade e a boa preparação, a laboriosidade e a honestidade, o repúdio à menor fraude, o sentido social e mesmo a generosidade devem sempre inspirar o cristão no exercício das suas atividades profissionais e trabalhistas” 4.
Também a calúnia, a maledicência, a murmuração… constituem uma verdadeira e flagrante injustiça, pois “entre os bens temporais, a boa reputação parece ser o mais valioso de todos eles, e pela sua perda o homem fica privado de realizar muitas coisas boas” 5. O Apóstolo Tiago diz da língua que é um mundo inteiro de maldade 6: pode servir para louvar a Deus, para falar com Ele, para comunicar‑se…, ou pode causar um mal enorme, se não há um empenho decidido em não falar nunca mal de ninguém.
Faltar à justiça através da palavra não é coisa pouco freqüente. Por isso o Senhor nos pede que não nos deixemos guiar pelos rumores e juízos precipitados que se difundem em alguns meios de comunicação social, que nunca emitamos um juízo negativo sobre pessoas ou instituições, que não sejamos inquisidores nem verdugos das vidas alheias. E se alguém tem o dever de julgar, deve empenhar‑se em colher todas as informações possíveis, ouvindo as duas partes, matizando os seus juízos e ressalvando sempre a intenção das pessoas, que somente Deus conhece.
Devemos viver os deveres de justiça com aqueles que o Senhor colocou sob os nossos cuidados, colaborando na formação de todos, tratando com mais esmero aqueles que, por doença, idade ou condições particulares, mais precisam de ser acompanhados. Sabemos bem que não viveria esta virtude, por exemplo, o pai ou a mãe que tivesse tempo para as suas distrações e gostos, e não dedicasse o tempo necessário à educação dos filhos; ou que se dedicasse ao trabalho profissional de uma maneira incompatível com a permanência diária no lar, à disposição da mulher e dos filhos, por várias horas além das do sono.
III. A ECONOMIA TEM as suas próprias leis e mecanismos, mas essas leis não são suficientes nem supremas, nem esses mecanismos intocáveis. Não se pode conceber a ordem econômica – insiste o Magistério da Igreja – como uma ordem independente e soberana, pois deve estar submetida aos princípios superiores da justiça social, de modo a que se possam corrigir os seus defeitos e deficiências e se tenha em conta a dignidade da pessoa 7.
A justiça social exige que não se deixe o trabalhador à mercê das leis da concorrência, como se o seu trabalho fosse uma simples mercadoria 8; e uma das principais preocupações do Estado e dos empresários “deve ser esta: a de dar trabalho a todos” 9, como disse São João Paulo II em São Paulo. O desemprego forçoso é um dos maiores males de um país e causa de muitos outros nas pessoas, nas famílias e na própria sociedade.
Podem dar‑se circunstâncias em que, cumprindo aquilo que é estritamente legal, aquilo que está estabelecido, se falte à justiça com esse mínimo estipulado: pode acontecer que se despeçam empregados de acordo com a lei, mas que com isso se cometa uma enorme injustiça; ou que se paguem ou se atualizem salários de acordo com as leis, mas com isso se ofenda a dignidade da pessoa…: “A justiça – diz o Fundador do Opus Dei – não se manifesta exclusivamente no respeito exato dos direitos e deveres, à semelhança dos problemas aritméticos, que se resolvem fazendo somas e subtrações” 10.
Por sua vez, quem trabalha numa oficina, na Universidade, numa empresa, não viveria a justiça se não cumprisse com esmero a sua tarefa, com competência profissional, aproveitando o tempo, cuidando dos instrumentos de trabalho que são propriedade da fábrica, da biblioteca, do hospital, do escritório, do lar em que se ajuda a dona de casa nas tarefas do lar.
Os estudantes faltariam à justiça com a sociedade, com a família, e às vezes gravemente, se não aproveitassem intensamente o tempo dedicado ao estudo. De modo geral, as qualificações obtidas podem ser matéria para um bom exame de consciência. Quantas vezes o nível medíocre dos conhecimentos adquiridos na Faculdade não é a causa de que não se consiga ser um bom profissional no dia de amanhã, faltando‑se assim à justiça com a empresa em que se trabalha! São pontos que devemos examinar com freqüência, para vivermos delicadamente, diante de Deus e dos homens, os deveres com relação ao próximo: a justiça, a misericórdia e a fidelidade nos pactos e promessas.
Peçamos à Santíssima Virgem essa retidão de consciência necessária para que, no que está ao nosso alcance – que nunca é pouco e tem aspectos diversos –, a sociedade seja sempre ou venha a ser em breve prazo um remanso de convivência digno dos filhos de Deus.
(1) Lev 27, 30‑33; Deut 14, 22 e segs.; (2) Mt 23, 23; (3) João XXIII, Enc. Pacem in terris, 11‑4‑1963, 10; (4) Conferência Episcopal Espanhola, Instr. Past. Os católicos na vida pública, 22‑4‑1986, ns. 113‑114; (5) São Tomás, Suma Teológica, II‑II, q. 73, a. 2; (6) Ti 3, 6; (7) cfr. Pio XI, Enc. Quadragesimo anno, 15‑6‑1931, 37; (8) João Paulo II, Enc. Sollicitudo rei socialis, 30‑12‑1987, 34; (9) idem, Alocução no estádio do Morumbi, São Paulo, 3‑7‑1980; (10) São Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 168.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal