Amar a Castidade
TEMPO COMUM. TRIGÉSIMA TERCEIRA SEMANA. SÁBADO
– Sem a pureza, é impossível o amor.
– Castidade matrimonial e virgindade.
– Apostolado sobre esta virtude. Meios para guardá-la.
I. OS SADUCEUS, que negavam a ressurreição dos mortos, aproximaram-se de Jesus e propuseram-lhe uma questão que, na opinião deles, reduzia ao absurdo essa verdade comumente admitida pelos demais hebreus1. Segundo a lei judaica2, se um homem morria sem deixar filhos, o seu irmão era obrigado a casar-se com a viúva para suscitar descendência ao falecido. Ora bem, apresentava-se como argumento aparentemente sólido contra a ressurreição dos corpos o caso de sete irmãos que tivessem morrido sucessivamente sem deixar descendência: Na ressurreição, de qual deles será a mulher?
O Senhor responde reafirmando com citações da Sagrada Escritura a ressurreição dos mortos, e desfaz o argumento dos saduceus comentando as qualidades dos corpos ressuscitados. A objeção revelava uma grande ignorância acerca do poder de Deus de glorificar o corpo humano comunicando-lhe uma condição semelhante à dos anjos, os quais não necessitam da reprodução da espécie por serem imortais3. A atividade procriadora limita-se a uns anos dentro da vida terrena do homem, para que possa cumprir a missão de propagar a espécie e, sobretudo, aumentar o número dos eleitos no Céu. Só a vida eterna é definitiva: esta vida é uma passagem para o Céu.
Pela virtude da castidade – ou pureza –, a faculdade de gerar é governada pela razão e tem em vista a procriação e a união do homem e da mulher dentro da vida conjugal. O impulso sexual situa-se assim no âmbito da ordem querida por Deus na criação, e é nele e somente nele que deve ser satisfeito.
A virtude da castidade leva também a viver uma limpeza da mente e do coração: a evitar quaisquer pensamentos, afetos e desejos que afastem do amor de Deus, conforme a vocação de cada um4. Sem a castidade, é impossível o amor humano, bem como o amor a Deus.
Se a pessoa renuncia ao empenho por manter essa limpeza do corpo e da alma, abandona-se à tirania dos sentidos e rebaixa-se a um nível infra-humano: “É como se o «espírito» se fosse reduzindo, empequenecendo, até ficar num pontinho... E o corpo aumenta, agiganta-se até dominar5. E o homem torna-se incapaz de entender a amizade com o Senhor.
Já nos primeiros tempos, no meio de um ambiente pagão hedonista, a Igreja admoestava com firmeza os cristãos sobre “os prazeres da carne, que, como cruéis tiranos, depois de aviltarem a alma na impureza, inabilitam-na para as obras santas da virtude”6. A pureza prepara a alma para o amor divino e para uma fecunda dedicação apostólica.
II. A CASTIDADE não consiste somente na renúncia ao pecado. Não é algo negativo: “não olhar”, “não fazer”, “não desejar”... É entrega do coração a Deus, delicadeza e ternura com o Senhor, “afirmação gozosa”7. É virtude para todos, que deve ser vivida conforme o estado de cada um.
Dentro da vida conjugal, a castidade ensina os casados a respeitarem-se mutuamente e a amarem-se com um amor mais firme, mais delicado, mais duradouro.
“O amor consegue que as relações conjugais, sem deixarem de ser carnais, se revistam, por assim dizer, da nobreza do espírito e estejam à altura da dignidade do homem. O pensamento de que a união sexual se destina a suscitar novas vidas tem um admirável poder de transfiguração, mas a união física só se enobrece verdadeiramente quando procede do amor e é expressão do amor [...].
“E quando o sexo se desvincula completamente do amor e se busca a si próprio, então o homem abandona a sua dignidade e profana também a dignidade do outro. Um amor forte e cheio de ternura é, pois, uma das melhores garantias e sobretudo uma das causas mais profundas da pureza conjugal.
“Mas existe ainda uma causa mais alta. A castidade, diz-nos São Paulo, é um «fruto do Espírito» (cfr. Gál 5, 23), quer dizer, uma conseqüência do amor divino. Para a guarda da pureza no matrimônio, necessita-se não só de um amor dedicado e respeitoso pela outra pessoa, mas sobretudo de um grande amor a Deus. O cristão que procura conhecer e amar Jesus Cristo encontra nesse amor um poderoso estímulo para a sua castidade. Sabe que a pureza aproxima de modo especial de Jesus Cristo e que a proximidade de Deus, prometida aos que guardam um coração limpo (cfr. Mt 5, 8), é por sua vez a principal garantia dessa limpeza”8.
A castidade não é a primeira nem a mais importante das virtudes, nem a vida cristã pode reduzir-se à pureza, mas sem ela não há caridade, e esta, sim, é a primeira das virtudes, a que dá plenitude a todas as outras. Sem a castidade, o próprio amor humano se corrompe. Aqueles que foram chamados a servir a Deus dentro da vida matrimonial, santificam-se precisamente pelo cumprimento abnegado e fiel dos deveres conjugais, que para eles se tornam caminho certo de união com Deus.
Quanto aos que receberam a vocação para o celibato apostólico, encontram na entrega total ao Senhor e aos outros por Deus, indiviso corde9, sem a mediação conjugal, a graça para viverem felizes e alcançarem uma íntima e profunda amizade com Deus. Se hoje olhamos para Nossa Senhora – e neste dia da semana, o sábado, muitos cristãos têm-na especialmente presente –, vemos que nEla se dão de modo sublime essas duas possibilidades que nas outras mulheres se excluem: a maternidade e a virgindade. Em muitas terras cristãs, chamam-na simplesmente “a Virgem”, a Virgem Maria. E tratamo-la ao mesmo tempo como Mãe. Foi vontade de Deus que a sua Mãe fosse simultaneamente Virgem.
A virgindade é, pois, um valor altíssimo aos olhos de Deus, e encerra uma mensagem importante para os homens de todos os tempos: a satisfação do sexo não pertence à perfeição da pessoa. As palavras de Jesus: Quando ressuscitarem dos mortos, nem os homens desposarão mulheres, nem as mulheres, homens... indicam que “há uma condição de vida, sem matrimônio, na qual o homem – homem e mulher –, encontra ao mesmo tempo a plenitude da doação pessoal e a comunhão entre as pessoas, graças à glorificação de todo o seu ser na união perene com Deus. Quando o chamamento à continência pelo reino dos Céus encontra eco na alma humana [...], não é difícil perceber nisso uma especial sensibilidade do espírito humano, que já nas condições terrenas parece antecipar aquilo de que o homem participará na ressurreição futura”10. A virgindade e o celibato apostólico são aqui na terra uma antecipação do Céu.
Isto não significa que o sexo seja “uma realidade vergonhosa, mas uma dádiva divina que se orienta limpamente para a vida, para o amor e para a fecundidade. Este é o contexto, o pano de fundo em que se situa a doutrina cristã sobre a sexualidade. A nossa fé não desconhece nada das coisas belas, generosas, genuinamente humanas que há aqui em baixo”11. Aqueles que se entregam a Deus com todo o seu ser, sem que intervenha um amor humano no matrimônio, não o fazem, pois, “por um hipotético valor negativo do matrimônio, mas em vista do valor particular ligado a essa opção, o qual deve ser descoberto e acolhido pessoalmente como vocação própria. E por isso Cristo diz: Quem puder compreender, compreenda (Mt 19, 12)”12.
O Senhor deu a cada um uma missão nesta vida; a sua felicidade consiste em cumpri-la perfeitamente, com sacrifício e alegria.
III. A CASTIDADE VIVIDA no estado próprio de cada um é uma das maiores riquezas da Igreja perante o mundo; nasce do amor e orienta-se para o amor. É um sinal de Deus na terra. A continência pelo reino dos Céus “assemelha a Cristo que, na obra da Redenção, fez Ele próprio esta opção pelo reino dos Céus”13.
Os Apóstolos, afastando-se da tradição da Antiga Aliança segundo a qual a fecundidade era considerada uma bênção, seguiram o exemplo de Cristo, convencidos de que assim o seguiam mais de perto e se preparavam melhor para levar a cabo a missão apostólica que lhes fora confiada. Pouco a pouco, foram compreendendo – recorda-nos João Paulo II – como dessa continência brota uma particular “fecundidade espiritual e sobrenatural do homem, proveniente do Espírito Santo”14.
Atualmente, talvez muitas pessoas achem incompreensível a castidade, e muito mais o celibato apostólico e a virgindade vividos no meio do mundo. Os primeiros cristãos – que não eram pessoas consagradas, mas simples fiéis, celibatários ou casados – também tiveram que enfrentar um ambiente hostil a esta virtude. Por isso, um dos elementos muito importantes do apostolado que devemos realizar é o de valorizar a castidade e o cortejo de virtudes que a acompanham: torná-la atrativa por meio de um comportamento exemplar, e difundir amplamente a doutrina que a Igreja sempre ensinou sobre esta matéria que é decisiva para termos acesso à amizade com Deus.
Temos que esmerar-nos, por exemplo, em viver até ao pormenor as virtudes do pudor e da modéstia na maneira de vestir, no asseio pessoal, ao praticarmos esporte; negar-nos terminantemente a participar de conversas que não condizem com um cristão; repudiar os espetáculos imorais...; e sobretudo esbanjar alegria à nossa volta, mostrando assim que não somos pessoas recalcadas, reprimidas, mas vemos na castidade um valor de que resultam inúmeros frutos que nos elevam: o ar puro da liberdade, uma maior capacidade de amar, finura de alma, uma generosidade disposta a servir causas nobres...
Temos de proclamar ainda, aos quatro ventos, que a castidade é sempre possível quando se empregam os meios que a nossa Mãe a Igreja vem recomendando há séculos: o recolhimento dos sentidos – sobretudo dos olhos –, a prudência atenta para evitar as ocasiões, a moderação nos divertimentos, a temperança, o recurso habitual à oração, aos sacramentos e à penitência, a recepção frequente da Sagrada Eucaristia, a sinceridade com o confessor... e, sobretudo, um grande amor à Santíssima Virgem15. Nunca seremos tentados acima das nossas forças16.
Ao terminarmos a nossa oração, recorremos a Santa Maria, Mater pulchrae dilectionis, Mãe do amor formoso, que sempre nos ajudará a conseguir um amor mais firme, mesmo no meio das maiores tentações.
(1) Lc 20, 27-40; (2) cfr. Deut 25, 5 e segs.; (3) São Tomás de Aquino, Comentário ao Evangelho de São Mateus, 22, 30; (4) cfr. Catecismo Romano, III, 7, n. 6; (5) São Josemaría Escrivá, Sulco, n. 841; (6) Santo Ambrósio, Tratado sobre as virgens, 1, 3; (7) cfr. São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 5; (8) J. M. Martínez Doral, La santidad de la vida conyugal, em Scripta Teologica, Pamplona, 1989, vol. XXI, fasc. 3, págs. 880-881; (9) cfr. 1 Cor 7, 33; (10) São João Paulo II, Audiência geral, 10.03.82; (11) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 24; (12) João Paulo II, Audiência geral; (13) São João Paulo II, Audiência geral, 24.03.82; (14) ibid.; (15) cfr. Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, Declaração sobre certas questões de ética sexual, 29.12.75, 12; (16) cfr. 1 Cor 10, 13.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
22 de Novembro 2019
A SANTA MISSA

33ª Semana do Tempo Comum – Sexta-feira
Memória: Santa Cecília, virgem e mártir
Cor: Vermelha
1ª Leitura: 1Mc 4,36-37.52-59
“Celebraram a dedicação do altar, oferecendo com alegria holocaustos”
Leitura do Primeiro Livro dos Macabeus
36 Naqueles dias, Judas e seus irmãos disseram: ‘Nossos inimigos foram esmagados. Vamos purificar o lugar santo e reconsagrá-lo’. 37 Todo o exército então se reuniu e subiu ao monte Sião. 52 No vigésimo quinto dia do nono mês, chamado Casleu, do ano cento e quarenta e oito, levantaram-se ao romper da aurora, 53 e ofereceram um sacrifício conforme a Lei, sobre o novo altar dos holocaustos que haviam construído. 54 O altar foi novamente consagrado ao som de cânticos, acompanhados de cítaras, harpas e címbalos, na mesma época do ano e no mesmo dia em que os pagãos o haviam profanado. 55 Todo o povo prostrou-se com o rosto em terra para adorar e louvar a Deus que lhes tinha dado um feliz triunfo. 56 Durante oito dias celebraram a dedicação do altar, oferecendo com alegria holocaustos e sacrifícios de comunhão e de louvor. 57 Ornaram com coroas de ouro e pequenos escudos a fachada do templo. Reconstruíram as entradas e os alojamentos, nos quais colocaram portas. 58 Grande alegria tomou conta do povo, pois fora reparado o ultraje infligido pelos pagãos. 59 De comum acordo com os irmãos e toda a assembleia de Israel, Judas determinou que os dias da dedicação do altar fossem celebrados anualmente com alegres festejos, no tempo exato, durante oito dias, a partir do dia vinte e cinco do mês de Casleu.
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Salmo 1Cr 29,10. 11abc. 11d-12a. 12bcd (R. 13b)
R. Queremos celebrar o vosso nome glorioso.
10 Bendito sejais vós, ó Senhor Deus, +
Senhor Deus de Israel, o nosso pai. *
desde sempre e por toda a eternidade! R.
11a A Vós pertencem a grandeza e o poder +
11b toda a glória, esplendor e majestade, *
11c pois tudo é vosso: o que há no céu e sobre a terra! R.
11d A vós, Senhor, também pertence a realeza, +
pois sobre a terra, como rei, vos elevais! *
12a Toda glória e riqueza vêm de vós! R.
12b Sois o Senhor e dominais o universo, +
12c em vossa mão se encontra a força e o poder, *
12d em vossa mão tudo se afirma e tudo cresce! R.
Evangelho: Lc 19,45-48
Fizestes da casa de Deus um antro de ladrões.
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo: 45 Jesus entrou no Templo e começou a expulsar os vendedores. 46 E disse: ‘Está escrito: ‘Minha casa será casa de oração’. No entanto, vós fizestes dela um antro de ladrões.’ 47 Jesus ensinava todos os dias no Templo. Os sumos sacerdotes, os mestres da Lei e os notáveis do povo procuravam modo de matá-lo. 48 Mas não sabiam o que fazer, porque o povo todo ficava fascinado quando ouvia Jesus falar.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
Casa de Oração
TEMPO COMUM. TRIGÉSIMA TERCEIRA SEMANA. SEXTA-FEIRA
– Jesus expulsa os mercadores do Templo.
– O templo, lugar de oração.
– O culto verdadeiro.
I. UMA DAS LEITURAS previstas para a Missa de hoje é uma passagem do Livro dos Macabeus1em que se narra que Judas e seus irmãos, depois de vencerem os inimigos, decidiram purificar e renovar o santuário do Senhor que fora profanado pelos gentios e pelos que não tinham sido fiéis à fé dos seus antepassados.
Dirigiram-se para lá cheios de alegria, ao som de cânticos e de cítaras, de liras e de címbalos. E todo o povo se prostrou com o rosto por terra, e adoraram e levantaram a voz até ao céu, e bendisseram a Deus.
Celebraram a dedicação do altar durante oito dias e ofereceram com grande júbilo holocaustos e sacrifícios de ação de graças e de louvor. E adornaram a fachada do templo com coroas de ouro e com pequenos escudos; e restauraram as entradas do templo e os quartos, e puseram-lhes portas. E foi extraordinária a alegria do povo, e o opróbrio das nações foi afastado. Judas Macabeu determinou que esse dia fosse celebrado todos os anos com grande solenidade. O Povo de Deus, depois de tantos anos de opróbrio, manifestou a sua piedade e o seu amor a Deus com um júbilo transbordante.
O Evangelho da Missa2 mostra-nos Jesus santamente indignado ao ver o estado em que se encontrava o Templo, de tal maneira que expulsou dali os que vendiam e compravam. No Êxodo3, Moisés tinha disposto que nenhum israelita se apresentasse no Templo sem nada que oferecer. Para facilitar o cumprimento dessa disposição aos que vinham de longe, montou-se no átrio do Templo um serviço de compra e venda de animais para serem sacrificados. Mas essa medida, que a princípio podia ter sido tolerável e até conveniente, degenerou de tal modo que a primitiva intenção religiosa ficou subordinada aos benefícios econômicos da turba dos comerciantes, que talvez fossem os próprios servidores do Templo. O resultado foi que o Templo passou a parecer mais uma feira de gado do que um lugar de encontro com Deus4.
Movido pelo zelo da casa de seu Pai5, por uma piedade que brotava do mais fundo do seu Coração, Jesus não pôde suportar aquele deplorável espetáculo e expulsou dali todos os vendilhões, com as suas mesas e animais, sublinhando a finalidade do templo com um texto de Isaías bem conhecido de todos6: A minha casa é casa de oração, mas vós fizestes dela um covil de ladrões.
O que o Senhor quis ensinar a todos e nos quer ensinar a nós é o respeito e a compostura que se deve guardar na Casa de Deus, como devem ser a nossa devoção e o nosso recolhimento nesses recintos sagrados que são as igrejas, onde se celebra o sacrifício eucarístico e onde Jesus Cristo, Deus e Homem, está realmente presente no Sacrário. “Há uma urbanidade da piedade. – Aprende-a. – Dão pena esses homens «piedosos», que não sabem assistir à Missa – ainda que a ouçam diariamente –, nem benzer-se (fazem uns estranhos trejeitos, cheios de precipitação), nem dobrar o joelho diante do Sacrário (suas genuflexões ridículas parecem um escárnio), nem inclinar reverentemente a cabeça diante de uma imagem de Nossa Senhora”7.
II. A MINHA CASA é casa de oração. Quanta luz se desprende desta expressão que designa o templo como casa de Deus! Como tal devemos considerá-lo. Devemos entrar nele com amor, com alegria e também com um grande respeito, como convém ao lugar onde está – à nossa espera! – o próprio Deus.
Com freqüência, temos notícia ou assistimos a atos e cerimônias da vida pública, acadêmica, esportiva: uma recepção, um desfile, umas Olimpíadas... E percebemos imediatamente que o protocolo e uma certa solenidade não são supérfluos. Esses detalhes, às vezes mínimos – as precedências, o modo de vestir, o ritmo pausado de andar... –, entram pelos olhos e dão ao ato uma boa parte do seu valor e do seu ser.
Também entre as pessoas, o carinho demonstra-se por meio de pequenos pormenores, atenções e cuidados. A aliança que os futuros esposos se presenteiam ou outras atenções parecidas não são em si mesmas o amor, mas não há dúvida de que o manifestam. É o rito singelo que o homem tem necessidade de observar para exprimir o mais íntimo do seu ser. O homem não é apenas corpo nem apenas alma, carece de manifestar a sua fé por meio de atos externos e sensíveis que revelem bem o que traz no seu coração. Quando se vê, por exemplo, alguém dobrar o joelho pausadamente até o chão diante do Sacrário, é fácil pensar: tem fé e ama a Deus. E esse gesto de adoração, resultado daquilo que se traz no coração, ajuda quem o faz e todos os que estão presentes a ter mais fé e mais amor. O Papa João Paulo II alude neste sentido à influência que teve nele a piedade simples e sincera de seu pai: “O mero fato de vê-lo ajoelhar-se – conta o Pontífice – teve uma decisiva influência nos meus anos de juventude”8.
O incenso, as inclinações e genuflexões, o tom de voz adequado nas cerimônias, a dignidade da música sacra, dos paramentos e objetos sagrados, o decoro desses elementos do culto, a limpeza e cuidado com que se conservam, foram sempre manifestações de um povo que crê. O próprio esplendor dos materiais litúrgicos facilita a compreensão de que se trata sobretudo de uma homenagem a Deus. Quando se observam de perto alguns ostensórios da ourivesaria dos séculos XVI e XVII, nota-se que, quase sempre, a arte se torna mais rica e preciosa à medida que se aproxima do lugar destinado à Hóstia consagrada. Às vezes, desce a pormenores que quase não se notam: o melhor da arte concentrou-se no ponto em que se diria que só Deus a pode apreciar. Este cuidado até nas coisas mais pequenas ajuda muito a reconhecer a presença do próprio Deus.
Para o Senhor, também não é indiferente que o cumprimentemos em primeiro lugar ao entrarmos numa igreja, ou que nos empenhemos em chegar pontualmente à Missa – melhor uns minutos antes –, que façamos uma genuflexão bem feita diante dEle no Sacrário, que mantenhamos uma atitude recolhida na sua presença... O templo é para nós um lugar em que prestamos culto a Deus, em que o encontramos com uma presença verdadeira, real e substancial?
III. GRANDE PARTE das prescrições que o Senhor comunicou a Moisés no Sinai tendiam a fixar em detalhe a dignidade de tudo o que se referia ao culto. Especificava-se como se devia construir o tabernáculo, a arca, os utensílios, o altar, como deviam ser confeccionadas as vestes sacerdotais, como deviam ser as vítimas que se ofereceriam; que festas deviam ser guardadas; que tribo e que pessoas deviam exercer as funções sacerdotais...9
Todas essas indicações mostram que as coisas sagradas estão ligadas de uma maneira especial à Santidade divina; com elas, o Senhor demonstra a plenitude dos seus direitos. Naquele povo, tão freqüentemente tentado pelos ritos pagãos, Deus sempre procurou infundir um profundo respeito pelas coisas sagradas. Jesus Cristo sublinhou esse ensinamento com um espírito novo. Precisamente o zelo pela casa de Deus, pela sua honra e pela sua glória, constitui um ensinamento central do Messias, que Cristo nos transmitiu ao expulsar energicamente os vendilhões do Templo; durante a sua pregação, insistirá no respeito com que se devem tratar os dons divinos; houve ocasiões em que o fez com palavras muito fortes: Não deis aos cães o que é santo, nem lanceis aos porcos as vossas pérolas10.
Atualmente, assistimos em muitos lugares a uma onda de dessacralização. São atitudes por trás das quais jaz uma concepção atéia da pessoa, para a qual “o sentido religioso, que a natureza infundiu nos homens, deve ser considerado pura ficção ou imaginação, e deve, portanto, ser totalmente arrancado dos espíritos por ser absolutamente contrário ao caráter da nossa época e ao progresso da civilização”11.
Ao mesmo tempo, vemos crescer, mesmo entre pessoas que se chamam cultas, as práticas adivinhatórias, o culto desordenado e doentio pela estatística, pela planificação...: a incredulidade está presente em toda a parte. É que, no íntimo da sua consciência, o homem pressente a existência de Alguém que rege o universo, e que não é apreensível pela ciência. “Não têm fé. – Mas têm superstições”12.
A Igreja recorda-nos que somente Deus é o nosso único Senhor. E quis determinar muitos detalhes e formas do culto, que são expressões da honra e do verdadeiro amor devidos a Deus. Não se limitou a ensinar que a Santa Missa é o centro de toda a Igreja e da vida de cada cristão, e a determinar a sua liturgia; quis, além disso, que as nossas igrejas fossem verdadeiras casas de oração. Estabeleceu que os templos estivessem abertos nos horários convenientes “para que os fiéis possam facilmente orar diante do Santíssimo Sacramento”13. Dispôs14 o que foi prática constante através dos séculos: o Sacrário deve ser sólido, deve estar num lugar de destaque e ao mesmo tempo recolhido, para que os cristãos possam honrar o Santíssimo Sacramento também por meio do culto privado. Ao entrar num templo, deve-se saber com sinais claros onde está o Sacrário; por isso, prescreve-se o conopeu (o véu que deve cobri-lo normalmente), e que no altar do Sacrário arda constantemente uma lamparina com vela de cera... São detalhes que devem ser em primeiro lugar manifestações de amor e de adoração a Jesus Cristo, realmente presente, e só em segundo lugar sinais indicadores da sua presença.
Todos os fiéis, sacerdotes e leigos, devem ser “tão cuidadosos no culto e na honra a Deus que possam com razão chamar-se zelosos mais do que amantes..., para que imitem o próprio Jesus Cristo, de quem são estas palavras: O zelo da tua casa me devora (Jo 2, 17)”15.
(1) Mac 4, 36-37; 52-59; Primeira leitura da Missa da sexta-feira da trigésima terceira semana do Tempo Comum; (2) Lc 19, 45-48; (3) cfr. Êx 23, 15; (4) cfr. Sagrada Bíblia, Santos Evangelhos, nota a Mt 21, 12-13; (5) cfr. Jo 2, 17; (6) Is 56, 7; (7) São Josemaría Escrivá, Caminho, n. 541; (8) André Frossard, No tengais miedo, Plaza y Janes, Barcelona, 1982, págs. 12-13; (9) cfr. Êx 25, 1 e segs.; (10) Mt 7, 6; (11) João XXIII, Carta Encíclica Mater et Magistra, 15.05.61, 214; (12) São Josemaría Escrivá, Caminho, n. 587; (13) Paulo VI, Instrução Eucharisticum mysterium, 25.05.67; (14) ibid.; (15) Catecismo Romano, III, 2, n. 27.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
Santa Cecília
22 de Novembro
Santa Cecília
Santa Cecília nasceu provavelmente no ano 150, em Roma. Era filha de um Senador Romano, da família nobre dos Metelos. Era cristã, e desde pequena fez voto de castidade para viver o Amor de Deus e de Cristo. Como cristã numa época tão antiga, e em Roma, ela certamente herdou a fé dos discípulos de São Paulo, que levou a fé até Roma, e de São Pedro, o primeiro papa.
Cecília herdou a fé desses santos homens e de tantos outros que foram martirizados exatamente em Roma. O cristianismo que Cecília recebeu em sua formação, era o cristianismo dos mártires, dos heróis da fé. Cecília foi cristã numa Igreja perseguida, numa Igreja que ainda era minoritária, porém, cheia de profunda fé, esperança e coragem.
No transcorrer normal de sua vida, quando jovem ela foi prometida e dada em casamento a um jovem chamado Valeriano. No dia do casamento ela estava muito triste. Então, ela chamou seu noivo disse a ele toda verdade sobre sua fé. Disse que tinha feito voto de castidade para Deus, e começou a falar das glórias de Deus e de Jesus Cristo ao jovem, que a ouvia boquiaberto com a força de suas palavras e a convicção que vinha de seu coração.
Tamanho foi o poder das palavras de Cecília que, após ouvi-la, ele se converteu, entendeu a promessa de sua noiva e disse que iria respeitá-la em sua decisão. Naquela mesma noite ele recebeu o batismo. Valeriano contou o que ocorrera para seu irmão Tiburcio e este também, impressionado, se converteu. Ambos eram pagãos.
Santa Cecília, então, vendo a maravilha que Deus estava operando através dela, agradecida, cantou para Deus: Senhor, guardai sem manchas o meu corpo e minha alma, para que não seja confundida. Foi um canto inspirado e emocionante, que tocou profundamente o coração de todos. Daí vem o fato de ela ser considerada a padroeira dos músicos cristãos.
O prefeito de Roma, Turcius Almachius, teve conhecimento da conversão dos dois irmãos e quis o tesouro dos dois irmãos nobres e ricos. Os dois irmãos, porém, já tinham distribuído todos os seus bens aos pobres. O prefeito de Roma exigiu, então, sob pena de morte, que os dois abandonassem a nova fé. Os dois, porém, alimentados com a força do cristianismo nascente e cheios do poder de Deus, não renegaram sua fé. Assim, foram condenados à morte e decapitados.
Santa Cecília foi chamada ao conselho romano logo em seguida. Isso aconteceu provavelmente no ano 180. O conselho exigiu primeiro que ela revelasse onde estaria o tesouro dos dois irmãos. Ela disse que tudo já tinha sido distribuído aos pobres.
O prefeito, furioso, exigiu que ela renunciasse a fé cristã e adorasse aos deuses romanos. Cecília negou-se mostrando muita coragem e serenidade diante de todos. Condenaram-na à tortura. Mas, estando ela diante dos soldados romanos para ser torturada, ela falou a eles sobre as maravilhas de Deus, sobre a verdadeira religião, sobre sentido da vida, que é o seguimento de Jesus Cristo. Os soldados, maravilhados com uma mensagem que nunca tinham ouvido, ficaram do lado de Cecília, dizendo que iriam abandonar o culto aos deuses. Essas inúmeras conversões foram milagres que Deus operou através de Santa Cecília para que essas pessoas alcançassem a felicidade e a salvação.
O prefeito então, aborrecido e furioso, deu ordens para outros algozes trancarem Santa Cecília no balneário de águas quentes do seu próprio castelo, logo na entrada dos vapores. Ali, ela seria asfixiada pelos vapores ferventes que aqueciam as águas. Ninguém conseguia ficar ali por mais de alguns minutos. Era morte certa.
Porém, para surpresa de todos, milagrosamente ela foi protegida e nada lhe aconteceu. Todos ficavam impressionados com a fé daquela jovem, frágil, que enfrentava a morte sem receio por causa da grande fé que tinha em seu coração. Mas o prefeito, irredutível, mandou que ela fosse morta com três golpes de machado em seu pescoço.
O algoz obedeceu, mas não conseguiu arrancar sua cabeça, coisa que ele estava acostumado a fazer com apenas uma machadada. Santa Cecília permaneceu viva ainda por 3 dias, conversando e dando conselhos a todos que corriam para vê-la e rezar por ela.
Por fim, pressentindo sua morte iminente, Santa Cecília pediu para o Papa entregar todos os seus bens aos pobres e transformar sua casa numa igreja. Antes de sua morte, em seus últimos momentos neste mundo, sentindo que sua missão estava cumprida mesmo ela sendo ainda tão jovem, Cecília conseguiu cantar louvando a Deus, cantando as maravilhas de Deus.
Por isso, ela é a padroeira dos músicos e da música sacra. Depois disso, a fisicamente frágil e interiormente forte jovem romana que desafiou os poderes deste mundo, entregou seu espírito ao Pai Celestial. Após sua morte ela foi sepultada pelos cristãos na catacumba de São Calisto e desde então passou a ser venerada como mártir.
O túmulo de Santa Cecília ficou desaparecido por muitos séculos. No século IX, Santa Cecília apareceu ao Papa Pascoal l (817-824). Logo após este fato, seu túmulo foi encontrado e lá estava o caixão com as relíquias da Santa.
O corpo dela estava intacto, na mesma posição em que ela foi enterrada. Ao lado da Santa estavam também os corpos de Valeriano e Tiburcio. No ano de 1599, o Cardeal Sfondrati mandou abrir o tumulo de Santa Cecília, e seu corpo foi encontrado na mesma posição que estava quando o Papa Pascoal l a encontrou. Sua festa é celebrada em 22 de novembro, dia dos músicos e da música.
Fonte: https://cruzterrasanta.com.br
21 de Novembro 2019
A SANTA MISSA

Memória: Apresentação de Nossa Senhora
Cor: Branca
1ª Leitura: Zac 2, 14-17
“Rejubila, alegra-te, cidade de Sião,
eis que venho para habitar no meio de ti”
Leitura da Profecia de Zacarias
14 ‘Rejubila, alegra-te, cidade de Sião, eis que venho para habitar no meio de ti, diz o Senhor. 15 Muitas nações se aproximarão do Senhor, naquele dia, e serão o seu povo. Habitarei no meio de ti, e saberás que o Senhor dos exércitos me enviou a ti. 16 O Senhor entrará em posse de Judá, como sua porção na terra santa, e escolherá de novo Jerusalém. 17 Emudeça todo mortal diante do Senhor, ele acaba de levantar-se de sua santa habitação’
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Lc 1, 46-47.48-49.50-51.52-53.54-55
R. O Senhor se lembrou de mostrar sua bondade.
46 A minh’alma engrandece ao Senhor, *
47 e se alegrou o meu espírito em Deus, meu Salvador, R.
48 pois, ele viu a pequenez de sua serva, *
eis que agora as gerações hão de chamar-me de bendita.
49 O Poderoso fez por mim maravilhas *
e Santo é o seu nome! R.
50 Seu amor, de geração em geração, *
chega a todos que o respeitam.
51 Demonstrou o poder de seu braço, *
dispersou os orgulhosos. R.
52 Derrubou os poderosos de seus tronos *
e os humildes exaltou.
53 De bens saciou os famintos *
e despediu, sem nada, os ricos. R.
54 Acolheu Israel, seu servidor, *
fiel ao seu amor,
55 como havia prometido aos nossos pais, *
em favor de Abraão e de seus filhos, para sempre. R.
Evangelho: Mt 12, 46-50
“E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse:
‘Eis minha mãe e meus irmãos’”
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
Naquele tempo: 46 Enquanto Jesus estava falando às multidões, sua mãe e seus irmãos ficaram do lado de fora, procurando falar com ele. 47 Alguém disse a Jesus: ‘Olha! Tua mãe e teus irmãos estão aí fora, e querem falar contigo.’ 48 Jesus perguntou àquele que tinha falado: ‘Quem é minha mãe, e quem são meus irmãos?’ 49 E, estendendo a mão para os discípulos, Jesus disse: ‘Eis minha mãe e meus irmãos. 50 Pois todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe.’
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
Apresentação de Nossa Senhora
– O sentido da festa. A entrega de Maria.
– A nossa entrega. Correspondência à graça.
– Imitar Nossa Senhora. Renovar a entrega.
Neste dia, recorda-se a consagração da igreja de Santa Maria Menina, construída perto do Templo de Jerusalém para comemorar a dedicação que a Virgem – conforme uma piedosa tradição – fez de si própria ao Senhor, desde a sua primeira juventude, movida pelo Espírito Santo, de cujas graças estava repleta desde a sua Conceição Imaculada. A festa foi introduzida no Ocidente no século XIV.
I. NADA SABEMOS DA VIDA de Nossa Senhora até o momento em que o Arcanjo lhe apareceu para anunciar-lhe que tinha sido escolhida para ser a Mãe de Deus. Cheia de graça desde o primeiro momento da sua concepção, Maria teve uma existência completamente singular – Deus guardou-a em cada instante com um amor único e irrepetível – e ao mesmo tempo foi uma criança normal, que encheu de alegria todos os que conviveram com ela.
São Lucas, tão diligente em examinar todas as fontes que pudessem trazer-lhe notícias e dados, omite qualquer referência à meninice da Virgem. Muito provavelmente, Nossa Senhora nada lhe disse dos seus primeiros anos porque pouco tinha a contar: tudo se passou na intimidade da sua alma, num diálogo contínuo com seu Pai-Deus, que esperava, sem pressas, o momento inefável e único da Encarnação. “Mãe! Por que nos ocultaste os anos da tua primeira juventude? Virão depois os evangelhos apócrifos e inventarão mentiras; mentiras piedosas, sim, mas, ao fim e ao cabo, imagens falsas do teu verdadeiro ser. E dir-nos-ão que vivias no Templo, que os anjos te traziam de comer e falavam contigo... Sempre milagres, milagres... E assim te afastam de nós” 1, quando estás tão perto da nossa vida cotidiana!
A festa que celebramos hoje não tem a sua origem no Evangelho, mas numa antiga tradição. A Igreja não quis aceitar as narrações apócrifas segundo as quais Nossa Senhora teria passado a viver no Templo desde os três anos de idade, consagrada a Deus por um voto de virgindade. Mas aceita o núcleo essencial da festa 2, a dedicação que a Virgem fez de si própria, já desde a infância, movida pelo Espírito Santo, cuja graça a inundava desde o primeiro instante da sua concepção. Do que não há dúvida é de que foi absolutamente real a plena entrega de Maria a Deus, conforme foi crescendo.
Hoje é, pois, a festa da total entrega da Virgem a Deus e da sua plena dedicação aos planos divinos. Por essa plena entrega, que inclui a dedicação virginal, Nossa Senhora pôde dizer ao Anjo: Não conheço varão 3. Essas palavras descobrem delicadamente uma história de entrega que teve lugar na sua alma. Maria é já o primeiro fruto do Novo Testamento, em que a excelência da virgindade sobre o casamento alcançará todo o seu sentido, sem com isso diminuir o valor santificante da união conjugal, que o próprio Cristo elevará à dignidade de sacramento4.
Hoje pedimos à nossa Mãe que nos ajude a tornar realidade essa entrega do nosso coração, segundo a peculiar vocação que cada um tenha recebido. “Tens de entrar em colóquio com Santa Maria e confiar-lhe: – Ó Senhora, para viver o ideal que Deus meteu no meu coração, preciso voar... muito alto, muito alto! “Não basta que te desprendas, com a ajuda divina, das coisas deste mundo, sabendo que são terra. Mais ainda: mesmo que coloques o universo inteiro num montão debaixo dos teus pés, para estares mais perto do Céu..., isso não basta! Precisas voar, sem te apoiares em nada daqui de baixo, pendente da voz e do sopro do Espírito. – Mas, dizes-me, as minhas asas estão manchadas!: de barro de anos, sujo, pegajoso... E insisti contigo: recorre à Virgem. – Senhora – repete-lhe –, mal consigo levantar vôo!, a terra atrai-me como um imã maldito! – Senhora, Tu podes fazer que a minha alma se lance em vôo definitivo e glorioso, que tem o seu termo no Coração de Deus. Confia, que Ela te escuta” 5.
II. A VIRGEM MARIA foi a criatura que teve maior intimidade com Deus, a que dEle recebeu o maior amor; foi a cheia de graça 6. Nunca negou nada a Deus, e a sua correspondência à graça e às moções do Espírito Santo foi sempre plena. Devemos aprender dEla a dar-nos por inteiro ao Senhor, com uma plenitude de correspondência generosa, no estado e na vocação que Deus nos deu, no meio dos afazeres cotidianos no mundo. Ela é o exemplo que temos de imitar. “Tal foi Maria – ensina a este respeito Santo Ambrósio –, que a sua vida, por si mesma, é para todos um ensinamento”. E conclui: “Tende, pois, diante dos olhos, pintadas como uma imagem, a virgindade e a vida da Bem-aventurada Virgem, na qual se reflete como num espelho o brilho da pureza e a própria força da virtude” 7.
A nossa Mãe Santa Maria correspondia e crescia em santidade e graça. Tendo sido cumulada dos dons divinos desde o primeiro instante, foi alcançando uma nova plenitude na medida em que era fidelíssima às moções que o Espírito Santo lhe concedia. Só em Nosso Senhor não existiu aumento ou progresso da graça e da caridade, porque Ele tinha a plenitude absoluta no momento da Encarnação 8; como ensina o II Concílio de Constantinopla, seria falsa e herética a afirmação de que Jesus Cristo se tornou melhor pelo progresso das boas obras 9. Maria, porém, foi crescendo em santidade no decorrer da sua vida terrena. Mais ainda: existiu na sua vida um progresso espiritual sempre crescente, que foi aumentando na medida em que se aproximavam os grandes acontecimentos da sua vida aqui na terra: a Encarnação do seu Filho, a Corredenção no Calvário..., a Assunção aos Céus.
Acontece o mesmo na alma dos santos: quanto mais perto vão estando de Deus, mais fiéis são às graças recebidas e mais rapidamente caminham para Ele. “É o movimento uniformemente acelerado, símbolo do progresso espiritual da caridade numa alma que em nada se atrasa, e que caminha para Deus tanto mais depressa quanto mais se aproxima dEle, quanto mais é atraída por Ele”10. Assim deve ser a nossa vida, pois o Senhor nos chama à santidade no lugar onde nos encontramos. E serão precisamente as alegrias e as penas da vida as que nos servirão para irmos cada vez mais depressa para Deus, correspondendo às graças que recebemos. As dificuldades habituais do trabalho, o convívio com as pessoas, as notícias que recebemos..., devem ser motivo para amarmos cada dia mais o Senhor.
A Virgem convida-nos hoje a não deixarmos escondido no fundo do coração nada que não seja plenamente de Deus: “Senhor, tira a soberba da minha vida; destrói o meu amor próprio, este desejo de me afirmar e me impor aos outros; faz com que o fundamento da minha personalidade seja a identificação contigo”11, que cada dia esteja um pouco mais perto de Ti. Dá-me essa pressa dos santos em crescer no teu Amor.
III. NOSSA SENHORA dedicou-se plenamente a Deus movida pelo Espírito Santo, e talvez o tenha feito nessa idade em que as crianças alcançam o uso da razão, que nEla, cheia de graça, deve ter sido de uma particular luminosidade; ou talvez o tivesse feito desde sempre..., sem que houvesse nenhum ato formal. “A Virgem Maria menina sabia de sobra – afirma Santo Afonso Maria de Ligório – que Deus não aceita corações divididos, antes os quer completamente consagrados ao seu amor, em conformidade com o preceito divino: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e com toda a tua alma, e com todas as tuas forças (cfr. Deut 6, 5), e por isso, desde o momento em que começou a viver, amou a Deus com todas as suas forças e entregou-se completamente a Ele”12. Maria sempre pertenceu a Deus; e cada vez mais conscientemente, com um amor que alcançava em todas as ocasiões e circunstâncias uma nova plenitude.
Hoje, pode ser uma boa oportunidade – todos os dias o são – para que, meditando nesta festa de Maria, na qual se põe de manifesto a sua completa dedicação ao Senhor, renovemos a nossa entrega a Deus no meio dos afazeres cotidianos, no lugar em que o Senhor nos colocou.
Mas devemos ter em conta que todo o avanço na nossa união com Deus deve passar necessariamente por um trato mais freqüente com o Espírito Santo, Hóspede da nossa alma, a quem Nossa Senhora foi tão dócil ao longo da sua vida.
Para pedirmos essa graça, pode ser-nos útil a oração que São Josemaría Escrivá compôs para a sua devoção pessoal:
“Vem, ó Santo Espírito!: ilumina o meu entendimento para conhecer os teus mandatos; fortalece o meu coração contra as insídias do inimigo; inflama a minha vontade... Ouvi a tua voz e não quero endurecer-me e resistir, dizendo: depois..., amanhã. Nunc coepi! Agora!, não aconteça que o amanhã me falte. Ó Espírito de verdade e de sabedoria, Espírito de entendimento e de conselho, Espírito de alegria e de paz!: quero o que queres, quero porque o queres, quero como o queres, quero quando o quiseres...”13
Peçamos também a Nossa Senhora que haja muitas pessoas que, dóceis ao Espírito Santo, se entreguem inteiramente a Deus, como Ela, desde a sua primeira juventude.
(1) Salvador M. Iglesias, O Evangelho de Maria, Quadrante, São Paulo, 1991, pág. 16; (2) cfr. Paulo VI, Exort. Apost. Marialis cultus, 2-II-1974, 8; (3) cfr. Lc 1, 34; (4) cfr. Conc. Vat. II, Const. Gaudium et spes, 48; (5) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 994; (6) Oração coleta da Missa do dia 21 de novembro; (7) Santo Ambrósio, Sobre as virgens, II, 2; (8) cfr. R. Garrigou-Lagrange, La Madre del Salvador, pág. 100; (9) cfr. Conc. Contantinopolitano II, Dz 224; (10) ib., 103; (11) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 31; (12) Santo Afonso Maria de Ligório, As glórias de Maria, II, 3; (13) São Josemaría Escrivá, Postulação para a Causa de Beatificação e Canonização, Registro Histórico do Fundador, 20172, pág. 145.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
Apresentação de Nossa Senhora
21 de Novembro
Apresentação de Nossa Senhora
Tudo que sabemos da apresentação de Nossa Senhora no templo, sabemo-lo por lendas e informações extra-bíblicas (principalmente pelo proto-Evangelho de Tiago), o que não quer dizer que o assunto da festa careça de probabilidade histórica. Segundo uma piedosa lenda, Maria Santíssima, tendo apenas três anos de idade, foi pelos pais, em cumprimento de uma promessa, levada ao templo, para ali, com outras meninas, receber educação adequada à sua idade e posição. A Igreja oriental distinguiu este fato com as honras de uma festa litúrgica. A Igreja ocidental conhece a comemoração da Apresentação de Nossa Senhora desde o século VIII. Estabelecida primeiramente pelo Papa Gregório XI, em 1372, só para a corte papal, em Avignon, em 1585, Sixto V ordenou que fosse celebrada em toda a Igreja.
A Apresentação de Nossa Senhora encerra dois sacrifícios: A dos pais e da menina Maria. Diz a lenda que Joaquim e Ana ofereceram a Deus a filhinha no templo, quando esta tinha três anos. Sem dúvida, foi para estas santas pessoas um sacrifício muito grande separar-se da filhinha que se achava numa idade em que há pais que queiram confiar os filhos a mãos estranhas. Três anos é a idade em que a criança já recompensa de algum modo os trabalhos e sacrifícios dos pais, formulando palavras e fazendo já exercícios mentais que encantam e divertem, dando ao mesmo tempo provas de gratidão e amor filiais. São Joaquim e Santa Ana não teriam experimentado o sacrifício em toda a sua amargura? O coração dos amorosos pais não teria sentido a dor da separação? Que foi que os levou a fazer tal sacrifício? A lenda fala de um voto que tinham feito. Votos desta natureza não eram raros no Antigo testamento. As crianças eram educadas em colégios anexos ao templo, e ajudavam nos múltiplos serviços e funções da casa de Deus. Não erramos em supor que Joaquim e Ana, quando levaram a filhinha ao templo, fizeram-no por inspiração sobrenatural, querendo Deus que sua futura esposa e mãe recebesse uma educação e instrução esmeradíssima.
Grande era o sacrifício de Maria. Não resta dúvida que para Maria, a criança entre todas as mais privilegiadas, a cerimônia da apresentação significava mais que a entrada no colégio do templo. Maria reconhecia em tudo uma solene consagração da vida a Deus, a oferta de si mesma ao Supremo Senhor. O sacrifício que oferecia, era a oferta das primícias, e as primícias, por mais insignificantes que sejam, são preciosas por serem uma demonstração da generosidade do ofertante, e uma homenagem a quem as recebe. Maria ofereceu-se sem reserva, para sempre, com contentamento e júbilo. O que o salmista cantou, cheio de entusiasmo, traduziu-se na alma da bem-aventurada menina: “Quão amáveis são os teus tabernáculos, Senhor dos Exércitos! A minha alma suspira e desfalece pelos átrios do Senhor”. E entrarei junto ao altar de Deus; do Deus que alegra a minha mocidade.
Que espírito, tanto nos santos pais como na santa menina! Que espetáculo para o céu e para os homens! O que encanta a Deus e lhe atrai a graça, em toda a plenitude edifica e enleva a todos que se ocupam deste mistério na vida de Nossa Senhora. Poderá haver coisa mais bela que a piedade, o desprendimento completo no serviço do Senhor?
A vida de Maria Santíssima no templo foi a mais santa, a mais perfeita que se pode imaginar. O templo era a casa de Deus e na proximidade de Deus se sentia bem a bela alma em flor. “O passarinho acha casa para si e a rôla ninho nos altares do Senhor dos Exércitos, onde um dia é melhor que mil nas tendas dos pecadores”. Santo era o lugar onde Maria vivia. Era o templo onde os antepassados tinham feito orações, celebrado as festas; era o templo onde se achava o santuário do Antigo testamento, a arca, o trono de Deus no meio do povo; era o templo afinal, de que as profecias diziam que o Messias nele devia fazer entrada.
Naquele templo a menina Maria rezava e se preparava para a grande missão que Deus lhe tinha reservado. “Como os olhos da serva nas mãos da Senhora, assim os olhos de Maria estavam fitos no Senhor seu Deus”. Segundo uma revelação com que Maria agraciou a Santa Isabel de Turíngia todas as orações feitas naquele tempo se lhe resumiram no seguinte:
1) alcançar as virtudes da humildade, paciência e caridade;
2) conseguir amar e odiar tudo que a Deus tem amor ou ódio;
3) amar o próximo e tudo que lhe é caro;
4) a conservação da nação e do templo, a paz e a plenitude das graças de Deus e
5) finalmente ver o Messias e poder servir a sua santa Mãe.
Maria era o modelo de obediência, amor e respeito para com os superiores de caridade e amabilidade para com as companheiras. Tinha o coração alheio à antipatia, à rixa, ao azedume e ao amor próprio. Maria era uma menina humilde, despretensiosa e amante do trabalho. Com afã lia e estudava os Santos Livros.
Como as meninas do Colégio do templo se ocupavam de outros trabalhos concernentes ao serviço santo, é provável que Maria tenha recebido instruções sobre diversos trabalhos, como fossem: Pintura, trabalhos de agulha, canto e música. É opinião de muitos que o grande véu do templo, que na hora da morte de Jesus se partiu de alto a baixo, tenha sido confeccionado por Maria Santíssima e as companheiras.
Assim foi santíssima a vida de Maria no templo. O Divino Espírito Santo lapidou o coração e o espírito da esposa, mais do que qualquer outra criatura. Maria poderia aplicar a si as palavras contidas no Eclesiástico: “Quando ainda era pequena, procurei a sabedoria na oração. Na entrada do templo instava por ela... Ela floresceu como uma nova temporã. Meu coração nela se alegrou e desde a mocidade procurei seguir-lhe o rastro”.
É de admirar que Maria, assim amparada pelos cuidados humanos e divinos, progredisse de virtude em virtude? De Nosso Senhor o Evangelho constata diversas vezes esta circunstância. Como Jesus, também Maria cresceu em graça e sabedoria diante de Deus e dos homens. Este crescimento a Igreja contempla-o em imagens grandiosas traçadas no Livro do Eclesiástico: “Sou exaltada qual cedro no Líbano, e qual cipreste no monte Sião. Sou exaltada qual palma em Cedes e como rosais em Jericó. Qual oliveira especiosa nos campos e qual plátano, sou exaltada junto da água nas praças. Assim como o cinamomo e o bálsamo que difundem cheiro, exalei fragrância; como a mirra escolhida derramei odor de suavidade na minha habitação; como uma vide, lancei flores de um agradável perfume e as minhas flores são frutos de honra e de honestidade”. Nunca houve mocidade tão santa e esplendorosa como a de Maria Santíssima. Outra não poderia ser, devendo Maria preparar-se para a realização do mistério dos mistérios; da Encarnação do Verbo Eterno.
Fonte: Na luz Perpétua, 5ª. ed., Pe. João Batista Lehmann, Editora Lar Católico - Juiz de Fora - Minas Gerais, 1959.
Queremos que Cristo Reine
TEMPO COMUM. TRIGÉSIMA TERCEIRA SEMANA. QUARTA-FEIRA
– Instaurar todas as coisas em Cristo.
– A não aceitação de Cristo.
– Propagar o reinado de Cristo.
I. JESUS ESTAVA PERTO de Jerusalém e isso fez muitas pessoas pensarem que estaria iminente a chegada do Reino de Deus, um reino – conforme essa falsa opinião – de caráter temporal. O Senhor, imaginavam, entraria triunfalmente na cidade depois de vencer o poder romano, e eles teriam um lugar privilegiado quando chegasse esse momento. Esses sonhos, tão afastados da realidade, eram uma prolongação da mentalidade existente em muitos círculos judeus da época. Para corrigir a fundo essa mentalidade, Jesus expôs a parábola que o Evangelho da Missa de hoje nos relata 1.
Um homem de origem nobre partiu para um país longínquo a fim de receber a investidura real. Era costume que os reis de territórios dependentes do Império Romano recebessem o poder real das mãos do Imperador, e às vezes tinham até que ir a Roma. Na parábola, este personagem ilustre deixou a administração do seu território nas mãos de dez homens da sua confiança e partiu para receber a investidura. Deu-lhes dez minas, um pequeno tesouro, para que o fizessem render: Negociai com eles até eu voltar. Esses homens cumpriram o encargo: emprestaram a juros, compraram e venderam. Trabalharam bem para o seu senhor por uma longa temporada...
Ora, é isso o que a Igreja continua a fazer desde o dia em que recebeu o imenso Dom do Espírito Santo – enviado por Cristo – e, com Ele, a infalível palavra de Deus, a força dos sacramentos, as indulgências... “Em vinte séculos, trabalhou-se muito; não me parece nem objetivo nem honesto – comentava São Josemaría Escrivá – a ânsia com que alguns querem menosprezar a tarefa dos que nos precederam. Em vinte séculos realizou-se um grande trabalho e, com freqüência, realizou-se muito bem. Em certas épocas, houve desacertos, recuos, como também hoje há retrocessos, medo, timidez, ao mesmo tempo que não faltam atitudes de valentia e generosidade. Mas a família humana renova-se constantemente; em cada geração é necessário continuar com o empenho de ajudar o homem a descobrir a grandeza da sua vocação de filho de Deus, e inculcar-lhe o mandamento do amor ao Criador e ao próximo” 2. A vida é um tempo para fazer frutificar os bens divinos.
Corresponde-nos a cada um, a cada cristão, fazer render agora o tesouro de graças que o Senhor deposita nas nossas mãos, enquanto “vivificados e congregados no seu Espírito, caminhamos para a consumação da história humana, que coincide plenamente com o seu desígnio de amor: Restaurar todas as coisas em Cristo, as que estão nos céus e as que estão na terra (Ef 1, 10)” 3. Esta é a nossa tarefa até o momento em que o Senhor volte para cada um, isto é, até o momento da nossa morte: procurar com empenho que o Senhor esteja presente em todas as realidades humanas. Nada é alheio a Deus, pois todas as coisas foram criadas por Ele, e para Ele se dirigem, dentro da autonomia própria de cada uma: os negócios, a política, a família, o esporte, o ensino...
Eis que venho depressa – diz hoje o Senhor –, e a minha recompensa está comigo, para retribuir a cada um segundo as suas obras. Eu sou o Alfa e o Ômega, o primeiro e o último, o princípio e o fim 4. Só nEle os nossos afazeres aqui na terra encontram o seu sentido. A Igreja inteira é depositária do tesouro de Cristo: quando cada um de nós luta por ser fiel aos seus deveres, aos compromissos que adquiriu como cidadão e como cristão, a santidade de Deus cresce no mundo.
II. ENQUANTO aqueles administradores fiéis procuravam com empenho fazer render o tesouro do seu senhor, muitos dos seus concidadãos aborreciam-no; e enviaram atrás dele uma embaixada encarregada de dizer: Não queremos que ele reine sobre nós. O Senhor deve ter introduzido com muita pena estas palavras no meio do relato, pois fala de Si mesmo: Ele é o homem ilustre que partiu para terras longínquas. Jesus via nos olhos de muitos fariseus um ódio crescente e a rejeição mais completa. Quanto maior era a sua bondade e maiores as provas de misericórdia que dava, mais crescia a incompreensão que se podia notar em muitos rostos. Essa rejeição tão frontal, que pouco tempo depois atingiria o seu ponto culminante na Paixão, deve ter sido muito dura para o Mestre.
O Senhor também quis aludir à recusa de que seria objeto ao longo dos séculos. Acaso é menor a que hoje se dá? São menores o ódio e a indiferença? Na literatura, na arte, na ciência..., nas famílias..., parece ouvir-se um alarido gigantesco: Nolumus hunc regnare super nos!, não queremos que Ele reine sobre nós! Ele, “que é o autor do universo e de cada uma das criaturas, e que não se impõe com atitudes de domínio, mas mendiga um pouco de amor, mostrando-nos em silêncio as suas mãos chagadas.
“Como é possível, então, que tantos o ignorem? Por que se ouve ainda esse protesto cruel: Nolumus hunc regnare super nos (Lc 19, 14), não queremos que Ele reine sobre nós? Há na terra milhões de homens que se defrontam assim com Jesus Cristo, ou melhor, com a sombra de Jesus Cristo, porque, na realidade, o verdadeiro Cristo, não o conhecem, nem viram a beleza do seu rosto, nem perceberam a maravilha da sua doutrina.
“Diante desse triste espetáculo, sinto-me inclinado a desagravar o Senhor. Ao escutar esse clamor que não cessa, e que se compõe não tanto de palavras como de obras pouco nobres, experimento a necessidade de gritar bem alto: Oportet illum regnare! (1 Cor 15, 25), convém que Ele reine [...]. O Senhor impeliu-me a repetir, desde há muito tempo, um grito silencioso: Serviam!, servirei. Que Ele nos aumente as ânsias de entrega, de fidelidade à sua chamada divina – com naturalidade, sem ostentação, sem ruído –, no meio da rua. Agradeçamos-lhe do fundo do coração. Elevemos uma oração de súditos, de filhos!, e a nossa língua e o nosso paladar experimentarão o gosto do leite e do mel, e nos saberá a favo cuidar do reino de Deus, que é um reino de liberdade, da liberdade que Ele nos conquistou (cfr. Gal 4, 31)” 5.
Pôr-nos-emos a serviço de Cristo como nosso Rei e Senhor que é, como Salvador da Humanidade inteira e de cada um de nós. Serviam!, servirei, Senhor, é o que dizemos na intimidade da nossa oração.
III. DEPOIS DE ALGUM TEMPO, aquele senhor voltou com a investidura real e recompensou generosamente os servos que tinham trabalhado por fazer render o que haviam recebido; mas castigou duramente os que na sua ausência o tinham rejeitado, e sobretudo um dos administradores que havia perdido o tempo e não fizera render a mina que recebera. “O mau servo não se aplicou e nada devolveu; não honrou o seu amo e foi castigado. Glorificar a Deus é, pelo contrário, dedicar as faculdades que Ele me deu para conhecê-lo, amá-lo e servi-lo, e assim devolver-lhe todo o meu ser” 6.
Este é o fim da nossa vida: dar glória a Deus aqui na terra pelo bom uso de todas as coisas que recebemos, e depois na eternidade, com a Virgem, os anjos e os santos. Se o tivermos sempre presente, que bons administradores seremos dos dons que o Senhor nos quis dar para com eles ganharmos o Céu!
“Nunca vos arrependereis de tê-Lo amado”, costumava dizer Santo Agostinho 7. O Senhor é bom pagador já nesta vida quando somos fiéis. Que será no Céu! Agora temos que propagar o reinado de Cristo na terra, no meio da sociedade em que nos movemos; sentir-nos permanentemente responsáveis por dilatá-lo no ambiente em que nos desenvolvemos, a começar pela nossa família: “Não abandoneis os vossos pequenos; contribuí para a salvação do vosso lar com todo o esmero” 8, aconselhava vivamente o santo bispo de Hipona.
Nestes dias, enquanto esperamos a Solenidade de Cristo Rei, podemos preparar-nos para ela repetindo algumas jaculatórias que venham a dizer: Regnare Christum volumus!, queremos que Cristo reine! E que esse reinado seja uma realidade em primeiro lugar na nossa inteligência, na nossa vontade, no nosso coração, em todo o nosso ser 9. Por isso pedimos: “Meu Senhor Jesus: faz que eu sinta e secunde de tal modo a tua graça, que esvazie o meu coração..., para que o preenchas Tu, meu Amigo, meu Irmão, meu Rei, meu Deus, meu Amor!” 10
(1) Lc 19, 11-28; (2) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 121; (3) Concílio Vaticano II, Constituição Gaudium et spes, 45; (4) Apoc 22, 12-13; (5) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 179; (6) Joseph Tissot, La vida interior, pág. 102; (7) cfr. Santo Agostinho, Sermão 51, 2; (8) Santo Agostinho, Sermão 94; (9) cfr. Pio XI, Carta Encíclica Quas primas, 11.12.25; (10) São Josemaría Escrivá, Forja, n. 913.
Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal
20 de Dezembro 2019
A SANTA MISSA

33ª Semana do Tempo Comum – Quarta-feira
Cor: Verde
1ª Leitura: 2Mc 7,1.20-31
“O Criador do mundo vós dará de novo o espírito e a vida”
Leitura do Segundo Livro dos Macabeu
Naqueles dias, 1 aconteceu que foram presos sete irmãos, com sua mãe, aos quais o rei, por meio de golpes de chicote e de nervos de boi, quis obrigar a comer carne de porco, que lhes era proibida. 20 Mas especialmente admirável e digna de abençoada memória foi a mãe, que, num só dia, viu morrer sete filhos, e tudo suportou valorosamente por causa da esperança que depositou no Senhor. 21 Cheia de nobres sentimentos, ela exortava a cada um na língua de seus pais e, revestindo de coragem varonil sua alma de mulher, dizia-lhes: 22 “Não sei como aparecestes em minhas entranhas: não fui eu quem vos deu o espírito e a vida nem fui eu quem organizou os elementos dos vossos corpos. 23 Por isso, o Criador do mundo, que formou o homem na sua origem e preside à geração de todas as coisas, ele mesmo, na sua misericórdia, vos dará de novo o espírito e a vida, pois agora vos desprezais a vós mesmos, por amor às suas leis”. 24 Antíoco julgou que ela o desprezasse e suspeitou que o estivesse insultando. Como o mais novo dos irmãos ainda estivesse vivo, o rei tentava persuadi-lo. E não só com palavras, mas também com juramento, prometeu fazê-lo rico e feliz, além de torná-lo seu amigo e confiar-lhe altas funções, contanto que abandonasse as leis de seus antepassados. 25 Vendo que o jovem não lhe prestava nenhuma atenção, o rei chamou a mãe e exortou-a a dar conselhos ao rapaz, para que salvasse a sua vida. 26 Como ele insistisse com muitas palavras, ela concordou em persuadir o filho. 27 Inclinou-se então para ele e, zombando do cruel tirano, assim falou na língua de seus pais: “Filho, tem compaixão de mim, que te trouxe nove meses em meu seio e por três anos te amamentei; que te criei e eduquei até a idade que tens, sempre cuidando do teu sustento. 28 Eu te peço, meu filho: contempla o céu e a terra e observa tudo o que neles existe. Reconhece que não foi de coisas existentes que Deus os fez, e que também o gênero humano surgiu da mesma forma. 29 Não tenhas medo desse carrasco. Pelo contrário, sê digno de teus irmãos e aceita a morte, a fim de que eu torne a receber-te com eles no tempo da misericórdia”. 30 Mal tinha ela acabado de falar, o jovem declarou: “Que esperais? Não obedecerei às ordens do rei, mas aos mandamentos da Lei dada aos nossos pais por Moisés. 31 E tu, que inventaste toda espécie de maldades contra os hebreus, não escaparás às mãos de Deus”.
– Palavra do Senhor
– Graças a Deus.
Salmo Responsorial: Sl 16(17), 1.5-6.8b-9a e 15 (R. 15b)
R. Ao despertar me saciará vossa presença, ó Senhor!
1 Ó Senhor, ouvi a minha justa causa, *
escutai-me e atendei o meu clamor!
Inclinai o vosso ouvido à minha prece, *
pois não existe falsidade nos meus lábios! R.
5 Os meus passos eu firmei na vossa estrada, *
e por isso os meus pés não vacilaram.
6 Eu vos chamo, ó meu Deus, porque me ouvis, *
inclinai o vosso ouvido e escutai-me! R.
8b Protegei-me qual dos olhos a pupila *
e guardai-me, à proteção de vossas asas,
15 Mas eu verei, justificado, a vossa face *
e ao despertar me saciará vossa presença. R.
Evangelho: Lc 19,11-28
Porque tu não depositaste meu dinheiro no banco?
– O Senhor esteja convosco
– Ele está no meio de nós.
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo: 11 Jesus acrescentou uma parábola, porque estava perto de Jerusalém e eles pensavam que o Reino de Deus ia chegar logo. 12 Então Jesus disse: ‘Um homem nobre partiu para um país distante, a fim de ser coroado rei e depois voltar. 13 Chamou então dez dos seus empregados, entregou cem moedas de prata a cada um, e disse: ‘Procurai negociar até que eu volte’. 14 Seus concidadãos, porém, o odiavam, e enviaram uma embaixada atrás dele, dizendo: ‘Nós não queremos que esse homem reine sobre nós’. 15 Mas o homem foi coroado rei e voltou. Mandou chamar os empregados, aos quais havia dado o dinheiro, a fim de saber quanto cada um havia lucrado. 16 O primeiro chegou e disse: ‘Senhor, as cem moedas renderam dez vezes mais.’ 17 O homem disse: ‘Muito bem, servo bom. Como foste fiel em coisas pequenas, recebe o governo de dez cidades’. 18 O segundo chegou e disse: ‘Senhor, as cem moedas renderam cinco vezes mais’. 19 O homem disse também a este: ‘Recebe tu também o governo de cinco cidades’. 20 Chegou o outro empregado e disse: ‘Senhor, aqui estão as tuas cem moedas que guardei num lenço, 21 pois eu tinha medo de ti, porque és um homem severo. Recebes o que não deste e colhes o que não semeaste’. 22 O homem disse: ‘Servo mau, eu te julgo pela tua própria boca. Tu sabias que eu sou um homem severo, que recebo o que não dei e colho o que não semeei. 23 Então, porque tu não depositaste meu dinheiro no banco? Ao chegar, eu o retiraria com juros’. 24 Depois disse aos que estavam aí presentes: ‘Tirai dele as cem moedas e dai-as àquele que tem mil’. 25 Os presentes disseram: ‘Senhor, esse já tem mil moedas!’ 26 Ele respondeu: ‘Eu vos digo: a todo aquele que já possui, será dado mais ainda; mas àquele que nada tem, será tirado até mesmo o que tem. 27 E quanto a esses inimigos, que não queriam que eu reinasse sobre eles, trazei-os aqui e matai-os na minha frente’.’ 28 Jesus caminhava à frente dos discípulos, subindo para Jerusalém.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor!
São Félix de Valois
20 de Novembro
São Félix Valois
Félix nasceu em Paris, no ano 1127. Ele era nada menos que um príncipe da família real de Valois, na França. Como tal, tinha sempre à sua disposição todos os luxos e comodidades que a realeza oferecia. Porém, seu espírito era caridoso e despojado de vaidades. Desde menino manifestou vocação para o sacerdócio. Além disso, ainda criança, preocupava-se com os pobres e, sempre que podia, ajudava os necessitados.
Félix tinha uma enorme fortuna pessoal, como príncipe. Porém, sempre que podia, dava dinheiro e outros bens aos pobres. Frequentemente privava-se do próprio alimento para socorrer aos famintos. Ainda jovem, atendeu ao chamado de Cristo para o sacerdócio. Estudou para isso e, no tempo certo, foi ordenado padre. Ao receber a ordenação, renunciou a todos os títulos de nobreza que possuía, bem como a todos os seus direitos de príncipe. Depois, foi viver uma vida de eremita, na solidão e na humildade, dedicando sua vida totalmente a Deus. Porém, Deus tinha outros planos para a sua vida.
Um doutor e padre chamado João da Mata, amigo de Félix, procurou-o com a intenção de viver como ele. Félix, sabendo do alto grau de instrução e espiritualidade do amigo, acolheu-o como companheiro. Ali, os dois viveram por três anos. Ambos aprenderam muito, juntando a santidade de Félix e a cultura e inteligência prática do padre João da Mata.
Naquela época, inúmeros grupos de piratas aterrorizavam a região do mar Mediterrâneo. Assaltavam navios e regiões da Europa. Invadiam cidades portuárias e causavam o terror. Tratavam-se de turcos muçulmanos, grandes inimigos da fé cristã. Por isso, matavam, roubavam, saqueavam e levavam cristãos que sobreviviam para servirem de escravos.
Certo dia, Félix e João caçavam nos bosques da região de Cerfroi, em áreas retiradas. Então, os dois tiveram a mesma e idêntica visão sobrenatural. Na visão, Deus os chamava para empreender uma luta para libertar dos cristãos que tinham sido escravizados pelos muçulmanos. Tal luta se daria através da criação de uma Ordem religiosa com esta finalidade. Sem medo dos riscos que tal missão comportaria, Félix e João obedeceram e começaram a Obra imediatamente.
Félix e João da Mata viajaram para a cidade de Roma com o fim de contar ao Papa Inocêncio III sobre a visão e pedir a autorização da Igreja para fundar a Ordem. Como sinal de Deus, o próprio Papa tinha tido a mesma visão. Por isso, reconheceu naqueles dois padres os mais indicados para iniciarem tal missão. Consequentemente, aprovou e deu todo suporte necessário para a fundação da Ordem da Santíssima Trindade para a Libertação dos Cristãos. Ela ficou conhecida também como Ordem dos Padres Trinitários.
O primeiro convento da Ordem foi construído em Cerfroi, no local exato da visão divina. Enquanto João da Mata cuidou da organização da Ordem e do estabelecimento de suas ações apostólicas, Félix trabalhou na formação de todos os membros, que aumentavam em número mais e mais, atraídos que eram pela santidade de São Félix.
A luta que a Ordem dos Trinitários enfrentou foi tenebrosa, porém, de maneira surpreendente e rápida, recuperaram a liberdade de muitos cristãos que tinham sido escravizados. Vários padres da Ordem chegavam a se oferecer como escravos para conseguirem libertar e resgatar irmãos escravizados. Dessa forma, cumpria-se outra profecia de Félix: a de que os padres dessa Ordem seriam submetidos a vexames, sofrimentos e perseguições para conseguirem a liberdade e a recuperação da dignidade de cada cristão escravizado.
São Felix de Valois faleceu no dia 1212, no primeiro convento que ele fundou em Cerfroi. Sua beatificação foi celebrada em 1666 e a canonização no fim do século XVII. Sua festa foi instituída para o dia de sua morte, 20 de novembro.
Fonte: https://cruzterrasanta.com.br