TEMPO COMUM. TERCEIRA SEMANA. QUARTA-FEIRA

– Parábola do semeador. Nós somos colaboradores do Senhor. Dar doutrina. As disposições das almas podem mudar.
– Otimismo no apostolado. O Senhor permite que em muitas ocasiões não vejamos os frutos. Paciência e constância. “As almas, como o bom vinho, melhoram com o tempo”.
– O fruto é sempre superior à semente que se perde. Muitos dos nossos amigos estão esperando que lhes falemos de Cristo.

I. SAIU O SEMEADOR a semear a sua semente, diz-nos o Senhor no Evangelho 1. O campo, o caminho, os espinhos e as pedras receberam a semente: o semeador semeia a mãos cheias e a semente cai em toda a parte.

Com esta parábola, Cristo quis declarar que Ele derrama a sua graça em todos com muita generosidade. Assim como o lavrador não escolhe a terra que pisa com os seus pés, lançando a sua semente de forma natural e indiscriminada, assim também o Senhor não distingue o pobre do rico, o sábio do ignorante, o tíbio do fervoroso, o valente do covarde 2. Deus semeia em todos; dá a cada homem as ajudas necessárias para a sua salvação.

No escritório, na empresa, na farmácia, no consultório, na oficina, na loja, nos hospitais, na lavoura, no teatro…, onde quer que nos encontremos, podemos dar a conhecer a mensagem do Senhor. É Ele próprio que espalha a semente nas almas. “Nós somos simples trabalhadores, porque é Deus quem semeia” 3. Somos colaboradores de Deus, e no seu campo: Jesus “por intermédio dos cristãos, prossegue a sua semeadura divina. Cristo aperta o trigo em suas mãos chagadas, embebe-o no seu sangue, limpa-o, purifica-o e lança-o no sulco que é o mundo” 4 com infinita generosidade.

Assim como não nos cabe senão preparar a terra e semeá-la em nome do Senhor, assim também não somos nós que fazemos crescer a semente; é tarefa do Senhor fazer com que a semente germine e chegue a dar os frutos desejados 5. Devemos recordar sempre que “os homens não são mais do que instrumentos, de quem Deus se serve para a salvação das almas; e deve-se procurar que esses instrumentos estejam em bom estado para que Deus possa utilizá-los” 6. A grande responsabilidade de quem se sabe instrumento é esta: manter-se em bom estado.

A semente caiu em toda a parte: no campo, no caminho, entre os espinhos, sobre pedras. “E qual a razão para semear entre os espinhos, sobre pedras, sobre o caminho? Tratando-se de semente e de terra, certamente não haveria razão para isso, pois não é possível que a pedra se converta em terra, nem que o caminho já não seja caminho ou os espinhos deixem de sê-lo; mas com as almas não é assim. Porque é possível que a pedra se transforme em terra boa e que o caminho já não seja pisado nem permaneça aberto a todos os que passam, antes se torne um campo fértil, e que os espinhos desapareçam e a semente frutifique nesse terreno” 7. Não há terrenos demasiado duros ou baldios para Deus. A nossa oração e a nossa mortificação, se formos humildes e pacientes, podem conseguir do Senhor a graça necessária para transformar as condições interiores das almas que queremos aproximar de Deus.

II. O TRABALHO COM AS ALMAS é sempre eficaz. Deus faz com que os nossos esforços dêem fruto, muitas vezes de uma forma insuspeitada. Os meus escolhidos não trabalharão em vão8, prometeu-nos o Senhor.

A missão apostólica ora é semeadura, sem frutos visíveis, ora é colheita daquilo que outros semearam com a sua palavra, com a sua dor no leito de um hospital ou com um trabalho escondido e monótono que passou desapercebido aos olhos humanos. Em ambos os casos, o Senhor quer que se alegrem juntos aquele que semeia e aquele que recolhe 9. O apostolado é tarefa alegre e ao mesmo tempo sacrificada: na semeadura e na colheita.

É também tarefa paciente e constante. Assim como o lavrador sabe esperar dias e dias até ver despontar a semente, e mais ainda até à colheita, assim também devemos nós saber esperar no nosso empenho por aproximar as almas de Deus. O Evangelho e a nossa própria experiência nos ensinam que a graça normalmente necessita de tempo para frutificar nas almas. Sabemos também da resistência que muitos corações oferecem à graça, tal como pode ter acontecido conosco noutros tempos. A nossa ajuda aos outros manifestar-se-á, pois, numa maior paciência – virtude muito relacionada com a da fortaleza – e numa constância sem desânimos. Não tentemos arrancar o fruto antes de estar maduro. “E é esta paciência a que nos leva também a ser compreensivos com os outros, persuadidos de que as almas, como o bom vinho, melhoram com o tempo” 10.

A espera não se confunde com o desleixo nem com a desistência. Pelo contrário, leva a empregar os meios mais adequados para a situação em que se encontra a pessoa que queremos ajudar: abundância de luz da doutrina, mais oração e alegria, espírito de sacrifício, amizade mais íntima…

E quando parece que a semente caiu em terreno pedregoso ou cheio de espinhos, e que o fruto desejado tarda a chegar, devemos afastar qualquer sombra de pessimismo. “É muito freqüente que nos enganemos quando dizemos: «Errei na educação dos meus filhos», ou «não soube fazer o bem à minha volta». O que acontece é que ainda não conseguimos o resultado que pretendíamos, ainda não vemos o fruto que desejaríamos, porque a messe não está madura. O que importa é que tenhamos semeado, que tenhamos dado Deus às almas. Quando Deus quiser, essas almas voltarão para Ele. Pode ser que não estejamos ali para vê-lo, mas haverá outros para recolher o que foi semeado”11. Sobretudo, ali estará Cristo, para quem nos esforçamos.

Trabalhar quando não se vêem os frutos é um bom sintoma de fé e de retidão de intenção, um bom sinal de que vamos realizando verdadeiramente uma tarefa que é só para a glória de Deus. “A fé é um requisito imprescindível no apostolado, que muitas vezes se manifesta na constância em falar de Deus, ainda que os frutos demorem a vir. Se perseverarmos, se insistirmos, bem convencidos de que o Senhor assim o quer, também à tua volta, por toda a parte, se irão notando sinais de uma revolução cristã: uns haverão de entregar-se, outros tomarão a sério a sua vida interior, e outros – os mais fracos – ficarão pelo menos alertados” 12.

III. OUTRA PARTE DA SEMENTE, no entanto, caiu em terra boa e deu fruto, uma cem, outra sessenta, outra trinta.

Ainda que uma parte se tenha perdido por ter caído em mau terreno, outra parte deu uma colheita excelente. A fertilidade da boa terra compensou de longe a semente que deixou de dar o fruto devido. Não devemos esquecer nunca o otimismo radical que impregna a mensagem cristã; o apostolado sempre dá um fruto infinitamente superior ao dos meios empregados. Se formos fiéis, o Senhor há de permitir-nos ver na outra vida todo o bem produzido pela nossa oração, pelas horas de trabalho que oferecemos pelos outros, pelas conversas que tivemos com os nossos amigos, pelas horas de doença oferecidas, por aquele encontro com alguém que nunca mais nos deu um ar da sua graça, por tudo aquilo que nos pareceu um fracasso; há de mostrar-nos para quem serviu aquele terço que rezamos quando voltávamos da Faculdade ou do escritório…

Nada ficou sem fruto: uma parte deu cem, outra sessenta, outra trinta. O grande erro do semeador seria não lançar a semente por medo de que uma parte caísse em terreno pouco propício para frutificar: deixar de falar de Cristo pelo receio de não saber semear bem a semente, ou de que alguém possa interpretar mal as suas palavras, ou lhe diga que não está interessado, ou…

Na ação apostólica, devemos ter presente que Deus já sabe que haverá pessoas que corresponderão à nossa chamada e outras que se recusarão. Ao fazer do homem uma criatura livre, Deus – na sua Sabedoria infinita – contou com o risco de que usasse mal da sua liberdade e aceitou que alguns homens não quisessem dar fruto: “Cada alma é dona do seu destino, para bem ou para mal […]. Sempre nos impressiona esta terrível capacidade – que possuímos tu e eu, que todos possuímos –, e que revela ao mesmo tempo o sinal da nossa nobreza” 13.

Deus poderia ter-nos criado sem liberdade, de modo que lhe déssemos glória tal como a dão os animais e as plantas, que se movem segundo as leis necessárias da sua natureza, dos seus instintos, submetidos à servidão de uns estímulos externos ou internos. Poderíamos ter sido uns animais mais aperfeiçoados, mas sem liberdade. Deus, porém, quis criar-nos livres, para que reconhecêssemos voluntariamente a nossa dependência dEle por amor. Digamos livremente como Maria: Eis aqui a escrava do Senhor14. Tornarmo-nos escravos de Deus por amor compensa todas as ofensas que os outros possam fazer-lhe por utilizarem mal a sua liberdade.

Vivamos a alegria da semeadura, “cada um conforme as suas possibilidades, faculdades, carismas e ministérios. Todos, por conseguinte, tanto os que semeiam como os que colhem, tanto os que plantam como os que regam, devem ser necessariamente um só, para que assim, «trabalhando livre e ordenadamente para o mesmo fim», empenhem unanimemente as suas forças na edificação da Igreja”15.

(1) Mc 4, 1-20; (2) cfr. São João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 44, 3; (3) Santo Agostinho, Sermão 73, 3; (4) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 157; (5) cfr. 1 Cor 3, 7; (6) São Pio X, Enc. Haerent animo; (7) São João Crisóstomo, op. cit., 44; (8) Is 65, 23; (9) cfr. Jo 4, 36; (10) São Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 78; (11) G. Chevrot, El pozo de Sicar, Rialp, Madrid, 1981, pág. 267; (12) São Josemaría Escrivá, Sulco, n. 207; (13) Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 33; (14) Lc 1, 38; (15) Conc. Vat. II, Decr. Ad gentes, 28.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal.