TEMPO DO ADVENTO. PRIMEIRA SEMANA. SEGUNDA-FEIRA

– Alegria do Advento. Alegria ao receber o Senhor na Sagrada Comunhão.
– Senhor, eu não sou digno… Preparar-nos para receber o Senhor. Imitar as disposições do centurião de Cafarnaum.
– Outros pormenores relativos à preparação da alma e do corpo para receber com fruto este sacramento. A confissão freqüente.

I. O SALMO 121, que lemos na Missa de hoje, era um cântico dos peregrinos que iam a Jerusalém: Que alegria– recitavam os peregrinos ao aproximarem-se da cidade – quando me vieram dizer: “Vamos à casa do Senhor!” E os nossos passos se detêm agora diante das tuas portas, ó Jerusalém!1

Esta alegria é também imagem do Advento, em que cada dia que transcorre é um passo mais em direção à festa do nascimento do Redentor. É, além disso, imagem da alegria que o nosso coração experimenta quando nos abeiramos, bem preparados, da Sagrada Comunhão.

É inevitável que, juntamente com esta alegria, nos sintamos cada vez mais indignos, à medida que se aproxima o momento de receber o Senhor; e se decidimos fazê-lo, é porque Ele quis ficar sob as aparências do pão e do vinho precisamente para servir de alimento e, portanto, de fortaleza para os fracos e doentes. Não ficou como prêmio para os fortes, mas como remédio para os fracos. E todos somos fracos e estamos adoentados.

Toda a preparação deve parecer-nos pouca, e toda a delicadeza insuficiente para receber Jesus.

Assim exortava São João Crisóstomo os seus fiéis, a fim de que se preparassem condignamente para receber a Sagrada Comunhão: “Não é absurdo pores tanto cuidado nas coisas do corpo, a ponto de já desde muitos dias antes da festa preparares uma roupa belíssima, e te adornares e embelezares de todas as maneiras possíveis, e, no entanto, não tomares nenhum cuidado com a tua alma, abandonada, suja, esquálida, consumida de fome…?”2

Se alguma vez nos sentimos interiormente frios ou fisicamente pouco dispostos, nem por isso deixaremos de comungar. Procuraremos sair desse estado avivando a fé, a esperança e o amor. E se a causa for a tibieza ou a rotina, está nas nossas mãos mudar essa situação, pois contamos com a ajuda da graça. Mas não devemos confundir outros estados, como por exemplo o cansaço, com a situação de uma mediocridade espiritual consentida ou de uma rotina que cresce de dia para dia.

Cai na tibieza quem não se prepara, quem não faz o que está ao seu alcance para evitar as distrações quando Jesus vem ao seu coração. É tibieza aproximar-se da Comunhão mantendo a imaginação em outras coisas e pensamentos. Tibieza é não dar importância ao sacramento que se recebe.

A digna recepção do Corpo do Senhor será sempre uma oportunidade de nos inflamarmos no amor. “Haverá quem diga: é por isso, precisamente, que não comungo mais amiúde, porque me vejo frio no amor […]. E porque vês que estás frio, queres afastar-te do fogo? Quando sentes gelado o teu coração, deves receber mais amiúde este sacramento, desde que alimentes um sincero desejo de amor a Jesus Cristo. Comunga – diz São Boaventura –, ainda que te sintas tíbio, confiando inteiramente na misericórdia divina, porque quanto mais doentes nos sentimos, tanto maior necessidade temos do médico”3.

Ao pensar que o Senhor nos espera, podemos cantar cheios de alegria no mais íntimo da nossa alma: Que alegria quando me disseram: vamos à casa do Senhor! Mas também o Senhor se alegra quando vê o nosso esforço por estar bem preparados para recebê-lo. Meditemos sobre os meios de que nos servimos e sobre o interesse que pomos em assistir com devoção à Santa Missa, em evitar as distrações e afastar a rotina, em fazer com que a nossa ação de graças seja intensa e apaixonada, de forma que possamos estar unidos a Cristo ao longo de todo o dia.

II. O EVANGELHO DA MISSA4 traz-nos as palavras de um homem pagão, centurião do exército romano. São palavras que se introduziram na liturgia da Missa há muito tempo, e que têm servido de preparação imediata para a Comunhão aos cristãos de todos os tempos: Domine, non sum dignus – Senhor, eu não sou digno.

Os chefes dos judeus da cidade tinham pedido a Jesus que aliviasse a pena desse pagão, curando-lhe um servo a quem estimava muito e que estava à beira da morte5. Desejavam que lhe fosse feito esse favor porque lhes havia construído uma sinagoga.

Quando Jesus estava perto da casa, o centurião pronunciou as palavras que repetimos em todas as Missas (substituindo “servo” por “alma”): Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e o meu servo será salvo. Uma só palavra de Cristo cura, purifica, devolve o ânimo e enche de esperança.

O centurião é um homem de profunda humildade, generoso, compassivo e cheio de admiração por Jesus. Como é pagão, não se atreve a dirigir-se pessoalmente ao Senhor e serve-se de outros, que considera mais dignos, para que intercedam por ele. Foi a humildade, comenta Santo Agostinho, “a porta por onde o Senhor entrou, a fim de tomar posse do que já possuía”6.

Unem-se na alma deste homem a fé, a humildade e a delicadeza. Por isso a Igreja nos propõe o seu exemplo e as suas próprias palavras como preparação para recebermos Jesus quando vem a nós na Sagrada Comunhão: Senhor, eu não sou digno

A Igreja, porém, não nos convida apenas a repetir as palavras do centurião, mas a imitar as suas disposições. “Queremos dizer a Jesus que aceitamos a sua visita imerecida e singular, multiplicada sobre a terra até chegar a nós, a cada um de nós; e dizer-lhe também que nos sentimos atônitos e indignos perante tanta bondade, mas felizes, felizes de que no-la tenha concedido a nós e ao mundo; e também queremos dizer-lhe que um prodígio tão grande não nos deixa indiferentes e incrédulos, mas põe em nossos corações um entusiasmo gozoso, que nunca deveria faltar naqueles que verdadeiramente creem”7.

III. PREPARAR-SE PARA RECEBER o Senhor na Comunhão significa em primeiro lugar recebê-lo em graça. Cometeria uma gravíssima ofensa, um sacrilégio, quem fosse comungar em pecado mortal. Nunca devemos propor-nos receber o Senhor se há em nós uma dúvida fundamentada de termos cometido um pecado grave por pensamentos, palavras ou atos. Todo aquele que comer o pão e beber o cálice do Senhor indignamente será réu do Corpo e do Sangue do Senhor. Por isso, continua São Paulo: Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e então coma do pão e beba do cálice, pois aquele que o come e bebe sem discernir o Corpo do Senhor, come e bebe a sua própria condenação8.

“A quem livremente comunga, é preciso recordar-lhe o preceito: Examine-se cada um a si mesmo (1 Cor 11, 28). E a prática da Igreja declara que é necessário este exame para que ninguém que tenha consciência de estar em pecado mortal, por mais contrito que se julgue, se aproxime da Sagrada Eucaristia sem a prévia Confissão sacramental”9.

“A participação nos benefícios da Eucaristia depende, além disso, da qualidade das disposições interiores, pois os sacramentos da nova lei, ao mesmo tempo que atuam ex opere operato, produzem um efeito tanto maior quanto mais perfeitas forem as disposições com que se recebem”10. Por isso é conveniente uma preparação esmerada da alma e do corpo: desejos de purificação, de tratar com delicadeza este sacramento, de recebê-lo com a maior piedade possível.

Uma excelente preparação é a luta por viver na presença de Deus ao longo do dia e por cumprir com esmero os deveres cotidianos; sentindo, quando se comete um erro, a necessidade de desagravar o Senhor; enchendo o dia de ações de graças e de comunhões espirituais. Assim se terá pouco a pouco o coração no Senhor, tanto no trabalho como na vida familiar, nos momentos de lazer ou em qualquer ocupação.

Juntamente com estas disposições interiores, e como sua manifestação necessária, temos as do corpo: o jejum prescrito pela Igreja, as atitudes, o modo de vestir, etc., que são sinais de respeito e reverência.

Ao terminarmos a nossa oração, pensemos como Maria recebeu Jesus depois da anunciação do Anjo. Peçamos-lhe que nos ensine a comungar “com aquela pureza, humildade e devoção” com que Ela o recebeu no seu seio bendito, “com o espírito e fervor dos Santos”, ainda que nos sintamos indignos e insignificantes.

(1) Sl 121, 1-2; (2) São João Crisóstomo, Homilia 6; PG 48, 756; (3) Santo Afonso Maria de Ligório, Prática do amor a Jesus Cristo, 2; (4) Mt 8, 5-13; (5) cfr. Lc 7, 1-10; (6) Santo Agostinho, Sermão 6; (7) Paulo VI,Homilia, 25-V-67; (8) 1 Cor 11, 27-28; (9) Paulo VI, Instr. Eucharisticum Mysterium, 37; (10) São Pio X, Decreto Sacra Tridentina Synodus, 20-XII-1905.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal