TEMPO COMUM. PRIMEIRA SEMANA. QUARTA-FEIRA

– O coração do homem foi feito para amar a Deus, e Deus deseja e procura o encontro pessoal com cada um.
– Não desperdiçar as ocasiões de apostolado. Manter firme a esperança apostólica.
– Oração e apostolado.

I. CERTO DIA, JESUS, depois de ter passado a tarde anterior curando doentes, pregando e atendendo as pessoas que vinham ter com Ele, muito antes do amanhecer, saiu da casa de Simão, foi a um lugar deserto e ali orava. Simão e os que estavam com ele saíram em sua busca e, achando-o, disseram-lhe: Todos estão à tua procura. É São Marcos quem o relata no Evangelho da Missa1.

Todos estão à tua procura. Também nos nossos dias as multidões têm “fome” de Deus. Continuam a ser atuais as palavras de Santo Agostinho no início das suas Confissões: “Criaste-nos, Senhor, para Ti e o nosso coração está inquieto enquanto não descansar em Ti”2.

O coração da pessoa humana foi feito para procurar e amar a Deus. E o Senhor facilita esse encontro, pois Ele também procura cada pessoa através de inúmeras graças, de atenções cheias de delicadeza e de amor.

Quando vemos alguém ao nosso lado, quando a imprensa, o rádio ou a televisão falam de alguém, podemos pensar, sem receio de nos enganarmos: Cristo chama essa pessoa, preparou para ela graças eficazes. “Repara bem: há muitos homens e mulheres no mundo, e nem a um só deles deixa o Mestre de chamar. – Chama-os a uma vida cristã, a uma vida de santidade, a uma vida de eleição, a uma vida eterna”3. É nisto que se baseia a nossa esperança apostólica: Cristo, de uma maneira ou de outra, está à procura de todos. A missão de que Deus nos encarrega é a de facilitarmos esses encontros com a graça.

A propósito da passagem do Evangelho que comentamos, escreve Santo Agostinho: “O gênero humano está enfermo, afetado não por uma doença corporal, mas pelos seus pecados. Está acamado em todo o orbe terrestre, do Oriente ao Ocidente, como um grande doente. Para curar este moribundo, o Médico onipotente desceu à terra. Humilhou-se até o extremo de tomar carne mortal, ou seja, até se aproximar do leito do enfermo”4.

Passaram poucas semanas desde que pudemos contemplar Jesus na gruta de Belém, pobre e indefeso, assumindo a natureza humana para estar muito perto dos homens e salvá-los. Meditamos depois a sua vida oculta em Nazaré, ocupado em trabalhar como outra pessoa qualquer, para nos ensinar a procurá-lo na vida normal, para estar acessível a todos e possibilitar-nos, através da sua Santa Humanidade, o acesso à Santíssima Trindade. Nós, como Pedro, vamos também ao seu encontro na oração – no nosso diálogo pessoal com Ele – e lhe dizemos: Todos estão à tua procura. Ajudai-nos, Senhor, a fazer com que os nossos parentes, os nossos amigos e colegas vos encontrem, bem como toda a alma que se cruze conosco no nosso caminho. No fundo, necessitam de Vós; ensinai-nos a dar-vos a conhecer com o exemplo de uma vida alegre, através do trabalho bem feito, com uma palavra que estimule os corações.

II. UMA POVOAÇÃO ALEMÃ que ficou praticamente destruída durante a segunda Guerra Mundial, possuía numa igreja um crucifixo muito antigo a que as pessoas do lugar tinham muita devoção. Quando iniciaram a reconstrução da igreja, os homens da aldeia encontraram entre os escombros a magnífica talha, mas sem braços. Não sabiam muito bem o que fazer: uns foram partidários de que se devolvesse ao culto restaurada, com uns braços novos; outros acharam que se devia fazer uma réplica da antiga. Por fim, depois de muitas deliberações, optaram pelo crucifixo que sempre havia presidido ao retábulo, tal como o haviam achado, mas com a seguinte inscrição: Vós sois os meus braços… E ainda hoje pode ser visto assim sobre o altar5.

Nós somos os braços de Deus no mundo, pois o Senhor quis ter necessidade dos homens. Ele nos envia para assim poder aproximar-se deste mundo doente, que muitas vezes não sabe encontrar o Médico que o poderia curar. Por isso não devemos deixar passar – por preguiça, cansaço ou respeitos humanos – uma única oportunidade; devemos aproveitar tanto os acontecimentos normais de todos os dias – o comentário sobre uma notícia do jornal, uma ajuda que prestamos ou que nos prestam… – como também os acontecimentos extraordinários: uma doença, a morte de um parente… Diz um documento do Concílio Vaticano II: “Os que viajam por força das suas tarefas internacionais, dos seus negócios ou para descansar, não esqueçam que são em toda a parte como testemunhas itinerantes de Cristo e que devem portar-se sinceramente como tais”6. O Papa João Paulo I, na sua primeira mensagem aos fiéis, exortava a que se estudassem todas as possibilidades para anunciar oportuna e importunamente 7 a salvação a todas as pessoas. “Se todos os filhos da Igreja – dizia o Sumo Pontífice – fossem missionários incansáveis do Evangelho, brotaria uma nova floração de santidade e de renovação neste mundo sedento de amor e de verdade”8.

Mantenhamos com firmeza a esperança na eficácia da nossa ação apostólica, por mais difícil que seja o ambiente em que nos movemos. Os caminhos da graça são imperscrutáveis, mas Deus quis contar conosco para salvar as almas. Que pena se, por omissão da nossa parte, muitos homens continuassem a viver longe de Deus! Devemos sentir a responsabilidade pessoal de que nenhum amigo, colega ou vizinho possa queixar-se a Deus: Hominem non habeo9: Senhor, não encontrei quem me falasse de Vós, ninguém me ensinou o caminho.

“O cristianismo possui o grande dom de enxugar e curar a única ferida profunda da natureza humana, e isso vale mais para o seu êxito do que toda uma enciclopédia de conhecimentos científicos e toda uma biblioteca de controvérsias; por isso o cristianismo há de durar enquanto durar a natureza humana”, diz o Cardeal Newman10. Perguntemo-nos hoje: quantas pessoas ajudei a viver cristãmente o tempo de Natal que acabamos de celebrar?

III. O SENHOR QUER que sejamos seus instrumentos para tornar presente a sua obra redentora no meio das tarefas seculares, na vida normal. Mas como poderemos ser bons instrumentos de Deus se não cuidamos com esmero da vida de piedade, se não mantemos um trato verdadeiramente pessoal com Cristo na oração? Por acaso pode um cego guiar outro cego? Não cairão ambos no abismo?11

O apostolado é fruto do amor a Cristo. Ele é a luz com que iluminamos, a Verdade que devemos ensinar, a Vida que comunicamos. E isto só será possível se formos homens e mulheres unidos a Deus pela oração. Comove contemplar como o Senhor, no meio de tanta atividade apostólica, se levantava de madrugada, muito antes do amanhecer, para dialogar com seu Pai-Deus e confiar-lhe o novo dia que começava.

Devemos imitá-lo, pois é na oração, no trato de intimidade com Jesus, que aprendemos a prestar atenção, a compreender e a valorizar as pessoas que Deus põe no nosso caminho. Sem oração, o cristão seria como uma planta sem raízes; acabaria por secar, e não teria assim a menor possibilidade de dar fruto.

Podemos e devemos dirigir-nos ao Senhor muitas vezes ao longo do dia. Ele não está longe; está perto, ao nosso lado, e ouve-nos sempre, especialmente nesses momentos em que, tal como agora, nos dedicamos expressamente a falar-lhe sem anonimato, cara a cara. À medida que nos abrirmos às chamadas divinas, o nosso dia será divinamente eficaz. Na realidade, a nossa vida de apóstolos vale o que valer a nossa oração12.

A oração nunca deixa de dar os seus frutos. Dela tiraremos a coragem necessária para enfrentar as dificuldades com a dignidade dos filhos de Deus, bem como para perseverar no convívio com os amigos que desejamos levar a Deus. Por isso a nossa amizade com Cristo há de ser cada dia mais profunda e sincera. Por isso devemos esforçar-nos seriamente por evitar todo o pecado deliberado, guardar o coração para Deus, procurar afastar os pensamentos inúteis – que freqüentemente dão lugar a faltas e pecados –, purificar muitas vezes a intenção, depondo aos pés do Senhor o nosso ser e as nossas obras… E jamais abandonar estes minutos diários de diálogo interior com Deus, ainda que estejamos cansados e não possamos concentrar-nos inteiramente, ainda que não experimentemos nenhum afeto, ainda que nos assaltem involuntariamente muitas distrações. A oração é o suporte de toda a nossa vida e a condição de todo o apostolado.

Ao terminarmos este tempo de oração, recorremos à intercessão poderosa de São José, mestre de vida interior. Pedimos àquele que viveu tantos anos junto de Jesus, que nos ensine a dirigir-nos a Ele com confiança durante todos os dias da nossa vida, sobretudo naqueles em que o trabalho aperta mais e nos parece difícil poder dedicar-lhe este tempo costumeiro de oração, condição imprescindível para a eficácia do nosso apostolado pessoal. A nossa Mãe Santa Maria intercederá por nós, junto com o santo Patriarca.

(1) Mc 1, 29-39; (2) Santo Agostinho, Confissões, 1, 1, 1; (3) São Josemaría Escrivá, Forja, Quadrante, São Paulo, 1987, n. 13; (4) Santo Agostinho, Sermão 87, 13; (5) cfr. F. Fernández Carvajal, La tibieza, 6ª ed., Palabra, Madrid, 1986, pág. 149; (6) Conc. Vat. II, Decr. Apostolicam actuositatem, 14; (7) 2 Tim 4, 2; (8) João Paulo I, Alocução, 27-VIII-1978; (9) Jo 5, 7; (10) Card. J. H. Newman, O sentido religioso, pág. 417; (11) Lc 6, 39; (12) cfr. São Josemaría Escrivá, Caminho, 7ª ed., Quadrante, São Paulo, 1989, n. 108.

Fonte: Livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal