TEMPO COMUM. DÉCIMO QUINTO DOMINGO. CICLO B

– Identidade e missão do sacerdote.

I. TODOS OS BATIZADOS podem aplicar a si próprios as palavras de São Paulo aos cristãos de Éfeso, recolhidas na segunda Leitura da Missa1: O Senhor escolheu‑nos antes da constituição do mundo para que fôssemos santos e imaculados na sua presença, pelo amor. Graças ao Batismo e à Confirmação, todos os fiéis cristãos são linhagem escolhida, sacerdócio real, nação santa, povo de conquista2, “destinados a oferecer vítimas que sejam agradáveis a Deus por Jesus Cristo”3.

Pela participação no sacerdócio de Cristo, os fiéis cristãos tomam parte ativa na celebração do Sacrifício do Altar e, através das suas tarefas seculares, santificam o mundo, participando dessa missão única da Igreja e realizando‑a por meio da peculiar vocação recebida de Deus: cada um nas suas atividades e nas suas circunstâncias, convertidas dia a dia numa oferenda gratíssima ao Senhor.

Por vontade divina, dentre os fiéis, que possuem o sacerdócio comum, alguns são chamados – mediante o sacramento da Ordem – a exercer o sacerdócio ministerial. Este pressupõe o sacerdócio comum dos fiéis, mas distingue‑se dele essencialmente: pela consagração recebida no sacramento da Ordem, o sacerdote converte‑se em instrumento de Jesus Cristo, a quem empresta todo o seu ser, para levar a todos a graça da Redenção. É um homem escolhido entre os homens, constituído em favor dos homens no que se refere a Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos pecados4. Qual é, pois, a identidade do sacerdote? “A de Cristo. Todos os cristãos podem e devem ser não já alter Christus, mas ipse Christus: outros Cristos, o próprio Cristo! Mas no sacerdote isto se dá imediatamente, de forma sacramental”5.

O Senhor, presente de muitas maneiras entre nós, mostra‑se muito próximo na figura do sacerdote. Cada sacerdote é um imenso dom de Deus ao mundo; é Cristo que passa fazendo o bem, curando doenças, dando paz e alegria às consciências; é “o instrumento vivo de Cristo” no mundo6, empresta a Nosso Senhor a sua voz, as mãos, todo o seu ser7. Na Santa Missa, renova – in persona Christi – o próprio Sacrifício redentor do Calvário. Torna presente e eficaz no tempo a Redenção levada a cabo por Cristo. “Jesus – recordava João Paulo II aos sacerdotes brasileiros – identifica‑nos de tal modo consigo no exercício dos poderes que nos conferiu, que a nossa personalidade como que desaparece diante da sua, já que é Ele quem atua por meio de nós”8.

Na Santa Missa, é Jesus Cristo quem muda a substância do pão e do vinho no seu Corpo e no seu Sangue. E “é o próprio Jesus quem, no sacramento da Penitência, pronuncia a palavra autorizada e paterna: Eu te absolvo dos teus pecados. E é Ele quem fala quando o sacerdote, exercendo o seu ministério em nome e no espírito da Igreja, anuncia a palavra de Deus. É o próprio Cristo quem cuida dos doentes, das crianças e dos pecadores, quando o amor e a solicitude pastoral dos ministros sagrados os envolvem”9.

Um sacerdote é mais valioso para a humanidade que todos os bens materiais e humanos juntos. Temos de rezar muito pela santidade dos sacerdotes, temos que ajudá‑los e ampará‑los com a nossa oração e a nossa estima. Devemos ver neles o próprio Cristo.

– Administrador dos tesouros divinos. Dignidade do sacerdote.

II. JESUS ESCOLHE os Apóstolos como seus representantes pessoais, e não apenas como seus mensageiros, profetas e testemunhas.

Esta nova identidade – atuar in persona Christi – deve manifestar‑se numa vida simples e austera, santa. O Evangelho da Missa10 relata‑nos que, quando Jesus enviou os Apóstolos para a primeira missão, recomendou‑lhes que levassem para a caminhada um bastão e nada mais: nem pão, nem alforje, nem dinheiro no cinto…

Deus toma posse daquele que chamou ao sacerdócio, consagra‑o para o serviço dos outros homens, seus irmãos, e confere‑lhe uma nova personalidade. E este homem, eleito e consagrado ao serviço de Deus e dos outros, não o é somente em algumas ocasiões determinadas, por exemplo, quando realiza uma função sagrada, mas “sempre, em todos os momentos, tanto quando exerce o mais alto e sublime ofício como no ato mais vulgar e humilde da vida quotidiana. Exatamente da mesma maneira que um cristão não pode deixar de lado o seu caráter de homem novo, recebido no Batismo, para comportar‑se «como se fosse» um simples homem, também o sacerdote não pode abstrair do seu caráter sacerdotal para se comportar «como se» não fosse sacerdote. Qualquer coisa que faça, qualquer atitude que tome, quer queira, quer não, será sempre a ação e a atitude de um sacerdote, porque ele o é sempre, em todas as horas e até à raiz do seu ser, faça o que fizer e pense o que pensar”11.

O sacerdote é um enviado de Deus ao mundo para que lhe fale da sua salvação, e é constituído administrador dos tesouros de Deus12: o Corpo e o Sangue de Cristo, bem como a graça de Deus por meio dos sacramentos, a palavra divina mediante a pregação, a catequese, os conselhos da Confissão. Está confiada ao sacerdote “a mais divina das obras divinas”, que é a salvação das almas; foi constituído embaixador e medianeiro entre Deus e os homens.

“Saboreio a dignidade da finura humana e sobrenatural destes meus irmãos, espalhados por toda a terra. É de justiça que se vejam rodeados já agora da amizade, da ajuda e do carinho de muitos cristãos. E quando chegar o momento de se apresentarem diante de Deus, Jesus Cristo ir‑lhes‑á ao encontro, para glorificar eternamente aqueles que, no tempo, atuaram em seu nome e na sua Pessoa, derramando com generosidade a graça da qual eram administradores”13.

Meditemos hoje junto do Senhor como é a nossa oração pelos sacerdotes, com que delicadeza os tratamos, como lhes agradecemos que tenham querido corresponder à chamada do Senhor, como os ajudamos a ser fiéis e santos. Peçamos hoje “a Deus Nosso Senhor que nos dê a todos nós, sacerdotes, a graça de realizarmos santamente as coisas santas, de refletirmos, também na nossa vida, as maravilhas das grandezas do Senhor”14.

– Ajudas que podemos prestar‑lhes. Oração. Veneração pelo estado sacerdotal.

III. TENDO PARTIDO, pregavam às gentes que se convertessem, expulsavam muitos demônios, ungiam com óleo muitos doentes e curavam‑nos… Os sacerdotes são também como que um prolongamento da Santíssima Humanidade de Cristo, pois através deles continuam a realizar‑se nas almas os mesmos milagres que o Senhor realizou ao passar pela terra: os cegos vêem, os que não podiam andar recuperam as forças, os que morreram pelo pecado mortal renascem para a vida da graça pelo sacramento da Confissão…

O sacerdote não procura compensações humanas, nem honra pessoal, nem prestígio humano, nem mede o seu trabalho pelos critérios humanos deste mundo… Não é árbitro na partilha de heranças15 entre os homens, nem veio libertá‑los das suas carências materiais – essa é uma tarefa de todos os homens de boa vontade –, mas veio trazer‑nos a vida eterna. Isto é que é especificamente seu; é também aquilo de que o mundo mais necessita.

Por isso temos que rezar tanto para que a Igreja conte sempre com os sacerdotes necessários, com sacerdotes que lutem por ser santos. Temos que rezar e fomentar essas vocações, se é possível, entre os membros da própria família, entre os filhos, entre os irmãos… Que imensa alegria para uma família se Deus a abençoa com este dom!

Todos os fiéis têm a gratíssima obrigação de ajudar os sacerdotes, especialmente com a oração: para que celebrem com dignidade a Santa Missa e dediquem muitas horas ao confessionário; para que tenham no coração a tarefa de administrar os sacramentos aos doentes e anciãos e cuidem com esmero da catequese; para que se preocupem com o decoro da Casa de Deus e sejam alegres, pacientes, generosos, amáveis, trabalhadores infatigáveis na missão de dilatar o Reino de Cristo. Ajudá‑los‑emos generosamente nas suas necessidades econômicas, procuraremos prestar‑lhes a nossa colaboração naquilo que estiver ao nosso alcance… E jamais falaremos mal deles. “Dos sacerdotes de Cristo não se deve falar senão para louvá‑los!”16

Se vez por outra vemos faltas e defeitos em alguns deles, procuraremos desculpá‑los, e fazer como aqueles bons filhos de Noé: cobri‑los com o manto da caridade17. Será mais um motivo para ajudá‑los com o nosso comportamento exemplar e com a nossa oração e, sempre que oportuno, com uma correção fraterna e filial ao mesmo tempo.

Para crescermos em amor e veneração pelos sacerdotes, podem ajudar‑nos estas palavras que Santa Catarina de Sena coloca na boca do Senhor: “Não quero que diminua a reverência que se deve professar pelos sacerdotes, porque a reverência e o respeito que se lhes manifesta não se dirige a eles, mas a Mim, em virtude do Sangue que eu lhes dei para que o administrem. Se não fosse por isso, deveríeis dedicar‑lhes a mesma reverência que aos leigos, e não mais […]. Não se deve ofendê‑los: ofendendo‑os, ofende‑se a Mim, e não a eles. Por isso proibi e disse que não admito que sejam tocados os meus Cristos”18.

(1) Ef 1, 3‑4; (2) 1 Pe 2, 9; (3) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 10; (4) cfr. Hebr 5, 1; (5) Josemaría Escrivá, Amar a Igreja, pág. 72; (6) cfr. Conc. Vat. II, Decr. Presbyterorum ordinis, 12; (7) cfr. Josemaría Escrivá, op. cit., pág. 71; (8) João Paulo II, Homilia, 2‑VII‑1980; (9) ib.; (10) Mc 6, 7‑13; (11) F. Suárez, El sacerdote y su ministério, Rialp, Madrid, 1969, pág. 21; (12) cfr. 1 Cor 4, 1; (13) Josemaría Escrivá, op. cit., pág. 83; (14) ib., pág. 72; (15) cfr. Lc 12, 13; (16) cfr. Josemaría Escrivá, Sulco, n. 904; (17) cfr. Josemaría Escrivá, Caminho, n. 75; (18) Santa Catarina de Sena, O diálogo, 16.

Fonte: livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal.