Tempo do Advento – 18 de Dezembro

– Virgindade, celibato apostólico e matrimônio.

A VIRGINDADE DE MARIA é um privilégio intimamente unido ao da Maternidade divina e harmoniosamente relacionado com a Imaculada Conceição e a Assunção gloriosa. Maria é a Rainha das virgens: “A dignidade virginal começou com a Mãe de Deus”1. A Virgem Maria é o exemplo cabal de uma vida dedicada inteiramente a Deus.

A renúncia ao amor humano por amor a Deus é uma graça divina que impele a entregar o corpo e a alma ao Senhor, com todas as possibilidades que o coração encerra. Deus passa a ser então o único destinatário desse amor que não se compartilha. O coração encontra nEle a sua plenitude e perfeição, sem que se interponha nenhum amor terreno. E o Senhor concede aos que chama a esse caminho um coração maior para amarem nEle todas as criaturas.

A vocação para o celibato apostólico – por amor ao Reino dos céus2 – é uma graça especialíssima e um dos maiores dons de Deus à sua Igreja. “A virgindade – diz João Paulo II – mantém viva na Igreja a consciência do mistério do matrimônio e defende-o de toda a redução ou empobrecimento. Tornando especialmente livre o coração do homem (cfr. 1 Cor 7, 32) […], a virgindade dá testemunho de que o Reino de Deus e a sua justiça são a pérola preciosa que se deve preferir a qualquer outro valor, por maior que seja; mais ainda, que deve ser procurada como o único valor definitivo. Por isso a Igreja, ao longo de toda a sua história, sempre sustentou a superioridade deste carisma sobre o matrimônio, devido ao vínculo singular que o liga ao Reino de Deus. Mesmo tendo renunciado à fecundidade física, a pessoa virgem torna-se espiritualmente fecunda, pai e mãe de muitos, cooperando para a realização da família segundo o desígnio de Deus”3.

Deus pede-lhes todo o afeto do coração, e faz com que encontrem nEle a plenitude do amor e da vida afetiva.

Àqueles que são chamados, por uma vocação divina específica, a renunciar ao amor humano, Deus pede-lhes todo o afeto do coração, e faz com que encontrem nEle a plenitude do amor e da vida afetiva. Viver a virgindade e o celibato apostólico significa viver a perfeição do amor, pois “dão à alma, ao coração e à vida externa de quem os professa aquela liberdade de que o apóstolo tanto necessita para poder dedicar-se ao bem das outras almas. Esta virtude, que torna os homens espirituais e fortes, livres e ágeis, habitua-os ao mesmo tempo a ver à sua volta almas e não corpos, almas que esperam luz das suas palavras e da sua oração, bem como a caridade do seu tempo e do seu afeto. Devemos amar muito o celibato e a castidade perfeita, porque são provas concretas e tangíveis do nosso amor a Deus e, ao mesmo tempo, fontes que nos fazem crescer continuamente nesse amor”4. “A virgindade e o celibato apostólico não só não contradizem como pressupõem e confirmam a dignidade do matrimônio”5.

A Igreja necessita sempre de pessoas que entreguem o seu coração indiviso ao Senhor como hóstia viva, santa, agradável a Deus6. A Igreja necessita também de famílias santas, de lares cristãos que sejam verdadeiro fermento de Cristo e forjem no seu seio muitas vocações de entrega plena a Deus.

– A santa pureza na vida matrimonial e fora dela. Os frutos desta virtude. A pureza, necessária para amar.

TANTO PARA OS SOLTEIROS como para os casados, a virgindade de Maria é também um apelo à santa pureza, indispensável para que possamos contemplar a Deus e servir os nossos irmãos, os homens. Talvez esta virtude choque frontalmente com o ambiente e seja mal entendida ou mesmo combatida por muitas pessoas a quem o materialismo cegou. Mas é-nos absolutamente necessária até para sermos um pouco mais humanos e podermos olhar para Deus.

O Espírito Santo exerce uma ação especial na alma que vive a castidade com delicadeza. A santa pureza produz muitos frutos na alma: dilata o coração e facilita o desenvolvimento normal da afetividade; gera uma alegria íntima e profunda, mesmo no meio das contrariedades; possibilita a ação apostólica; fortalece o caráter diante das dificuldades; torna-nos mais humanos, aumentando a nossa capacidade de entender e compadecer-nos dos problemas alheios.

O Espírito Santo exerce uma ação especial na alma que vive a castidade

A impureza provoca insensibilidade no coração, aburguesamento e egoísmo, pois torna o homem incapaz de amar e cria nele um clima propício para que surjam na sua alma, como ervas ruins, todos os vícios e deslealdades. “Olhai que quem está podre, pela concupiscência da carne, espiritualmente não consegue andar, é incapaz de uma obra boa, é um aleijado que permanece jogado a um canto como um trapo. Não vistes esses pacientes atacados de paralisia progressiva, que não conseguem valer-se nem pôr-se de pé? Às vezes, nem sequer mexem a cabeça. É o que acontece no terreno sobrenatural com os que não são humildes e se entregaram covardemente à luxúria. Não vêem, nem ouvem, nem entendem nada. Estão paralíticos e como que enlouquecidos. Cada um de nós deve invocar o Senhor, a Mãe de Deus, e suplicar-lhes que nos concedam a humildade e a decisão de aproveitar com piedade o divino remédio da Confissão”7.

Na nossa oração de hoje, pedimos ao Senhor que tenha misericórdia de nós e nos ajude a ser mais delicados com Ele: “Jesus, guarda o nosso coração! Um coração grande, e forte, e terno, e afetuoso, e delicado, transbordante de caridade para contigo, a fim de servirmos a todas as almas”8.

– Meios para viver esta virtude.

PODEMOS OFERECER neste dia à Virgem Maria a entrega do nosso coração e uma luta mais delicada por viver a virtude da santa pureza, que lhe é tão especialmente grata e que cumula de tantos frutos a nossa vida interior e a nossa ação apostólica.

A Igreja sempre ensinou que, com a ajuda da graça e, especialmente neste caso, com a ajuda dos sacramentos da Eucaristia e da Penitência, é possível viver esta virtude em todos os momentos e circunstâncias da vida, se se empregam os meios adequados. “Que queres que façamos? Que subamos a um monte e nos tornemos monges?”, perguntavam a São João Crisóstomo. E ele respondia: “Isso que dizeis é o que me faz chorar: que penseis que a modéstia e a castidade são próprias só dos monges. Não. Cristo estabeleceu leis comuns para todos. E assim, quando falava daquele que olha uma mulher para desejá-la (Mt 5, 28), não se dirigia ao monge, mas ao homem da rua…”9

A santa pureza exige uma conquista diária, porque não se adquire de uma vez para sempre. E pode haver épocas em que a luta seja mais intensa e haja que recorrer com mais frequência à Santíssima Virgem e lançar mão de algum meio extraordinário.

Para alcançarmos esta virtude, é necessário em primeiro lugar que sejamos humildes, o que tem como manifestação clara e imediata a sinceridade nas nossas conversas com quem orienta a nossa alma. A própria sinceridade conduz à humildade. “Lembrai-vos daquele pobre endemoninhado que os discípulos não conseguiram libertar; só o Senhor lhe obteve a liberdade, com oração e jejum. Naquela ocasião, o Mestre fez três milagres: primeiro, que aquele homem ouvisse, porque, quando se está dominado pelo demônio mudo, a alma nega-se a ouvir; segundo, que falasse; e terceiro, que o diabo se retirasse”10.

Outro dos meios para cuidarmos desta virtude são as pequenas mortificações habituais, que facilitam o domínio do corpo. “Se queremos guardar a mais bela de todas as virtudes, que é a castidade, devemos saber que ela é uma rosa que somente floresce entre espinhos; e, portanto, só a encontraremos, como todas as outras virtudes, numa pessoa mortificada”11.

“Cuidai da castidade com esmero, e também dessas outras virtudes que formam o seu cortejo – a modéstia e o pudor –, que vêm a ser como que a sua salvaguarda. Não passeis levianamente por cima dessas normas que são tão eficazes para nos conservarmos dignos do olhar de Deus: a guarda atenta dos sentidos e do coração; a valentia – a valentia de ser covarde – para fugir das ocasiões; a freqüência dos sacramentos, de modo particular a Confissão sacramental; a sinceridade plena na direção espiritual pessoal; a dor, a contrição, a reparação depois das faltas. E tudo ungido com uma terna devoção a Nossa Senhora, para que Ela nos obtenha de Deus o dom de uma vida santa e limpa”12.

Trazemos este grande tesouro da pureza em vasos de barro, instáveis e quebradiços; mas temos todas as armas para vencer e para que, com o tempo, esta virtude vá ganhando maior delicadeza, isto é, maior ternura para com o Senhor. “Terminamos estes minutos de conversa, em que tu e eu fizemos a nossa oração ao nosso Pai, pedindo-lhe que nos conceda a graça de vivermos essa afirmação gozosa que é a virtude cristã da castidade. Pedimo-lo por intercessão de Santa Maria, que é a pureza imaculada. Recorremos a Ela – tota pulchra!, toda formosa – com um conselho que eu dava há muitos anos aos que se sentiam intranquilos na sua luta diária por ser humildes, limpos, sinceros, alegres, generosos: Todos os pecados da tua vida parecem ter-se posto de pé. – Não desanimes. – Pelo contrário, chama por tua Mãe, Santa Maria, com fé e abandono de criança. Ela trará o sossego à tua alma13.

(1) Santo Agostinho, Sermão 51; (2) Mt 19, 12; (3) João Paulo II, Exortação apostólica Familiaris consortio, 16; (4) Salvador Canals, Reflexões espirituais, págs. 70-71; (5) cfr. João Paulo II, Exortação apostólica Familiaris consortio, 16; (6) Rom 12, 2; (7) Bem-aventurado Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 181; (8) ibid., n. 177; (9) São João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 7, 7; (10) Bem-aventurado Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 188; (11) Santo Cura d’Ars, Sermão sobre a penitência; (12) Bem-aventurado Josemaría Escrivá, Amigos de Deus, n. 185; (13)ibid., n. 189.

 

Fonte: livro “Falar com Deus”, de Francisco Fernández Carvajal.