14 de Fevereiro

Quarta-Feira de Cinzas

CELEBRAÇÃO DA PALAVRA PRESIDIDA

PELO SANTO PADRE NA BASÍLICA VATICANA

HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO II

Quarta-feira de Cinzas, 25 de Fevereiro de 2004 

  1. “Teu Pai… que vê o oculto, há-de recompensar-te” (Mt 6, 4.6.18). Esta palavra de Jesus dirige-se a cada um de nós no início do caminho quaresmal. Empreendemo-lo com a imposição das cinzas, gesto penitencial austero, tão querido à tradição cristã. Ele realça a consciência do homem pecador perante a majestade e a santidade de Deus. Ao mesmo tempo, manifesta a sua disponibilidade para acolher e transpor para escolhas concretas a adesão ao Evangelho.

São muito eloquentes as fórmulas que o acompanham. A primeira, tirada do Livro do Génesis: “Tu és pó e ao pó voltarás” (cf. 3, 19), recorda a actual condição humana sob a marca da caducidade e dos limites. A segunda retoma as palavras evangélicas: “arrependei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1, 15), que constituem um premente apelo a mudar de vida. As duas fórmulas convidam-nos a entrar na Quaresma com uma atitude de escuta e de conversão sincera.

  1. O Evangelho realça que o Senhor “vê o oculto”,ou seja, perscruta o coração. Os gestos de penitência têm valor se forem a manifestação de uma atitude interior, se manifestam a vontade firme de se afastar do mal e de percorrer o caminho do bem. Eis o sentido profundo da ascese cristã. “Ascese”: a própria palavra evoca a imagem do subir para metas elevadas.Isto exige necessariamente sacrifícios e renúncias. De facto, convém levar só o equipamento essencial para que a viagem não se torne pesada; estar dispostos a enfrentar todas as dificuldades e superar qualquer obstáculo para alcançar o objectivo estabelecido. Para sermos autênticos discípulos de Cristo, é preciso renunciar a si mesmos, tomar a própria cruz todos os dias e segui-lo (cf. Lc 9, 23). É o caminho difícil da santidade que cada cristão está chamado a percorrer.
  2. Desde sempre a Igreja indica alguns meios úteis para seguir este caminho. Em primeiro lugar, é necessário a humilde e dócil adesão à vontade de Deusacompanhada pela oraçãoincessante; são as formas penitenciais típicas da tradição cristã, como a abstinência, o jejum, a mortificação e a renúncia mesmo aos bens que são legítimos; são os gestos concretos de acolhimento em relação ao próximo, que a página do Evangelho de hoje recorda com a palavra “esmola”. Tudo isto é reproposto com maior intensidade durante o período quaresmal, que representa, a este propósito, um “tempo forte” de treinamento espiritual e de generoso serviço aos irmãos.
  3. A este propósito, na Mensagem para a Quaresmaquis chamar a atenção, sobretudo, para as difíceis condições em que se encontram tantas crianças no mundo, recordando as palavras de Cristo:“Quem receber um menino como este, em meu nome, é a mim que recebe” (Mt 18, 5). Com efeito, quem tem maior necessidade de ser defendido e protegido do que a criança inerme e frágil?

São numerosas e complexas as problemáticas relacionadas com o mundo da infância. Faço ardentes votos por que a estes nossos irmãos mais pequeninos, muitas vezes desamparados, sejam destinados os cuidados que lhes são devidos, graças também à nossa solidariedade. Esta é uma forma concreta de traduzir o nosso esforço quaresmal.

Caríssimos Irmãos e Irmãs, é com estes sentimentos que damos início à Quaresma, caminho de oração, de penitência e de ascese cristã autêntica. Acompanhe-nos Maria, Mãe de Cristo. O seu exemplo e a sua intercessão nos levem a caminhar com alegria rumo à Páscoa.

Fonte: http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/homilies/2004/documents/hf_jp-ii_hom_20040225_ash-wednesday.html